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Apenas matéria

Já aconteceu ao Leitor não conseguir dormir?

Pois, é mesmo isso. Não sofro de insónia, mas hoje mesmo não há maneira de fechar os olhos.
Portanto agarrei numa revista e comecei a ler.
E fiquei ainda mais enervado.

A revista é Superinteressante nº 158, de Junho. É a mesma revista vendida no Brasil também, só que muitos dos artigos são diferentes.
Quase todos.
Aliás, não há um que seja igual.
Mas porque raio têm o mesmo nome?
Boh, não interessa.

O que interessa é que na página 72 da edição portuguesa está um artigo cujo título promete muito e oferece nada: “Vítimas da magia”, de M.A.S., que suponho serem as iniciais de Miguel Angel Sabadell.

Tudo junto, com descontração

No artigo de “mágico” não há absolutamente nada. Pelo contrário, é um conjunto de superstição, ufologia, cartomancia, tarot, Paulo Coelho, Rhonda Byrne, tudo enfeitado com citações de escritores do passado.

Pergunta: porquê? Que têm em comum as imagens duma reunião wicca, um jogador de totoloto, uma velhota que livra do mau olhado e da aldeia francesa de Bugarach?

Porque ligar tudo isso à palavra “magia” quando depois o artigo fala apenas de superstição?
A intenção é transmitir a ideia de que “magia” é sinonimo de superstição? E que as religiões neo-pagãs pertencem à mesma família (caso contrário não se percebe a fotografia wicca ou aquela da cerimonia de religiosa de Glanstonbury, Inglaterra)?

E nem falamos dos Ufo.


Acho o artigo muito, muito triste.
Eu conheço pouco, praticamente nada de magia. Mas fico espantado com estes “jornalistas científicos” que a partir das paginas patinadas duma revista cospem contra aquela que foi uma das bases da humanidade até bem poucos séculos.

É só abrir um livro de biografias para descobrir que muitos dos pensadores hoje venerados, na altura eram também envolvidos com a alquimia, por exemplo. Só que os “cientistas” de hoje não gostam de lembrar estes pormenores.

Pronunciem o nome de Isaac Newton e qualquer pesquisador moderno terá dificuldades em encontrar palavras que consigam expressar toda a admiração para esta figura.
Mas Newton era um alquimista, um dos maiores do seu tempo. E a alquimia combina elementos de Química, Antropologia, Astrologia, Magia, Filosofia, Metalurgia, Matemática, Misticismo e Religião.

Newton teria ficado bem no artigo de Superinteressante, mas incluí-lo teria sido uma espécie de “heresia”. Porque Newton é sempre Newton, caramba.

Platão, Rogério Bacon, San Tomas de Aquino, Tycho Brahe, Thomas Browne, Giordano Bruno, Cagliostro, Paracelso, o Papa Silvestre II, Papa João XXII, Alberto Magno, Robert Boyle, Sir Walter Raleigh: foram todos alquimistas também.

Todos supersticiosos? Nada mais do que isso? Ou eram apenas mentes simples?

A Nova Religião

Infelizmente, Superinteressante é outro tijolo na parede do absolutismo científico.

É paradoxal, mas Ciência tornou-se a nova religião.
E, como todas as religiões, não admite contraditório e tem dogmas, o principal dos quais é: se um fenómeno não pode ser provado cientificamente, então não existe.

Como todas as religiões, é extremamente conservadora: enquanto reza para “novos percursos”,  fecha-se perante todas as possibilidades que não estejam nos moldes do “cientificamente correcto”.
Quem pensa o contrário é, obviamente, um herético.

A Ciência, a partir do fim do século XIX, abraçou definitivamente a “matéria” qual centro das próprias atenções. Tudo é matéria. Quando os cientistas tentam explicar algo de não material, recorrem igualmente a conceitos materialistas porque incapazes de conceber algo de diferente.

E a Ciência pode explicar tudo. Se a explicação não estiver pronta, é só manter a Fé, pois cedo ou tarde chegará.

O Amor? É culpa das hormonas.
Ódio? Também, mais uma qualquer disfunção psiquiátrica.
A alma? Não existe, é apenas uma sinopse que não funciona bem.
Vida além da morte? É outra reacção bio-química ou um pesadelo.

Como uma boa religião, também a Ciência tem as próprias hóstias, só que são chamadas de “medicamentos”.

Até uma pessoas como eu, que não acredita na magia, na astrologia, nos tarot e não aceita as superstições, fica pasmada perante tamanha cegueira.

Ipse dixit.

Fonte: Superinteressante Edição Portugal nº 158