Palestina: a crise da OLP

Na Palestina há dois problemas. O primeiro, como é óbvio, é israel com a sua política colonialista (para não dizer pior). O segundo é a Organização de Libertação da Palestina, também conhecida como OLP.

Nos dias passados houve em Ramallah a primeira reunião (em quatro anos…) do Conselho Central da OLP, anunciada como “decisiva” e destinada a terminar com a simples entrada no comité executivo de um aliado do velho mas possessivo Presidente palestiniano e líder da OLP, Abu Mazen. “Hebron em chamas, a Olp extingue-se” é o amargo comentário do diário (comunista ortodoxo) Il Manifesto que explica como as forças de segurança da Autoridade Nacional Palestiniana estão a lutar para recuperar o controlo da cidade, cenário de uma rixa entre famílias. E como em Ramallah o tão esperado Conselho Central Palestiniano não consiga ir além da nomeação dos fiéis de Abu Mazen para a liderança da OLP. Clientela familiar dignas dum clã.

A noite de Domingo foi um inferno na zona H1 de Hebron, sob o controlo (pelo menos aparente), da Autoridade Nacional Palestiniana (ANP). A área de Bab Zawie e outros bairros transformaram-se em campos de batalha: carros, autocarros, lojas, casas, uma pequena fábrica e restaurantes foram incendiados enquanto membros das duas famílias (os Abu Eisha Awiwi e os Jabari) lutavam um contra o outro com armas nas mãos. Várias pessoas ficaram feridas, incluindo uma criança de sete anos e um homem idoso. Os dois lados rejeitam a trégua. Os Jabari insistem em vingar Basil, um jovem taxista morto sem razão aparente por membros dos Abu Eisha-Awiwi e não aceitam uma compensação como manda a tradição

Pano de fundo: a ANP, incapaz de impor o respeito da lei, aquela penal e não a tribal, e de manter sob controlo uma cidade dividida e parcialmente nas mãos de colonos israelitas, estes últimos apoiados pelo forte exército de ocupação israelita. Ao que parece, em todo o distrito de Hebron a polícia pode contar apenas com 200 agentes porque outros 500 foram transferidos de Hebron para Jenin, cidade onde as forças leais ao presidente Abbas estão a lutar para o controle e onde a popularidade das organizações islâmicas, a começar pelo Hamas, está em constante crescimento. Isso sem esquecer que a própria Governação de Hebron há anos que simpatiza com Hamas em detrimento da Fatah, o partido de Abbas.

Nesta espécie de Far Oeste do Médio Oriente, aquela de Ramallah deveria ser uma sessão de excepcional importância para os 124 membros do Conselho Central da OLP, que inclui as principais organizações palestinianas mas não o Hamas ou a Jihad. Que, gostemos ou não, é já agora uma componente partidária envolvida no processo todo.

O Presidente palestiniano tinha dito na reunião:

Levaremos muito a sério o processo de reforma e renovação

Tinham sido anunciadas “resoluções” para reavivar as aspirações palestinianas a uma solução de dois Estados com israel. Muitos não acreditaram nisto, conhecendo os intermináveis jogos do Presidente. E nada disso aconteceu, de facto.

No artigo de Il Manifesto a queixa dum militante:

Pedimos uma verdadeira mudança e a adopção de uma linha firme contra israel, que nega os nossos direitos, mas não será esse o caso. Pelo contrário, Abbas está a estreitar as relações com o governo Bennett e conta sempre com o papel dos Estados Unidos, o que se tem revelado prejudicial e, em qualquer caso, a favor de israel.

Vários partidos tinham defendido o adiamento da reunião, em particular a Frente Popular de Libertação da Palestina (a área mais esquerdista), que acusou Abbas de aproveitar a oportunidade para promover a ascensão de alguns dos seus aliados.

Suheil Khoury, membro do comité central da Frente Popular para a Libertação da Palestina, disse ao Arab News que o Concelho Nacional Palestiniano não estava a cumprir o objectivo de ser um organismo unificador:

Nas nossas reuniões anteriores em Beirute e na reunião dos secretários-gerais, assumimos o compromisso de que o Conselho Nacional Palestiniano deveria ser realizado para representar a unidade e não a divisão. […] Estão a ignorar os apelos do povo e não estão a fazer qualquer movimento em direcção às aspirações dos palestinianos.

Khoury continuou revelando que altos funcionários palestinianos ofereceram à liderança da Frente um financiamento regular e a continuação como porta-voz adjunto do Concelho a um dos seus representantes: “Recusamos a obter ganhos pessoais por conta do nosso povo”.

De divisão falou também Hilmi Al-Araj, um dos líderes da Frente Democrática para a Libertação da Palestina, cuja facção concordou em participar em Ramallah após uma dura luta interna:

Queremos ter eleições gerais em 2022 e um esforço genuíno para acabar com a divisão. Precisamos de reafirmar decisões anteriores e retirar o reconhecimento palestiniano aos ocupantes”.

Perguntado por que razão não foram tomadas decisões anteriores para pôr fim à coordenação, respondeu ele: “É necessária uma luta para implementar essas decisões”.

O antigo membro do comité central da Fatah, Naser Qidwa (agora chefe do Fórum Nacional Democrático), argumentou que a reunião controversa só iria piorar as coisas, acrescentando: “Insistem na realização de uma reunião ilegítima que irá fazer explodir os esforços de unidade”.

Em Ramallah não surpreendeu ninguém a nomeação de Hussein Al-Sheikh, um Ministro muito próximo do Presidente e que mantém relações com israel, para o comité executivo da OLP. Com esta nomeação, Al-Sheikh torna-se o favorito na corrida para suceder a Abbas.

Ou seja: na Palestina, para o futuro, parece estar a ser preparado mais do mesmo. Tel Avive agradece.

 

Ipse dixit.

Imagem: Hosny Salah

2 Replies to “Palestina: a crise da OLP”

  1. Pobres palestinos! Não é de hoje que padecem o assédio dos “nazi-sionistas” de israel. No mínimo de território que ainda lhes resta, sofrer a luta pelo poder entre famílias palestinas, é um pouco demais.
    Não sei a causa real mais profunda, que circunstâncias, cumplicidades e instigações levam a este estado das coisas.
    Abraços, Max, e cumprimentos pelas soluções internáuticas.

  2. Grande Max,

    Como se diz em Portugal, casa em que não há pão todos ralham e ninguém tem razão. Haverá sítio pior para nascer em 2022 do que na Palestina? Sem direitos de cidadania, numa espécie de prisão perpétua declarada à nascença em que a única fuga é o exílio.

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