Nos Poços Negros, cada vez mais profundos

Dark Pools, lembram-se da expressão? Não? Pouco mal: ABC da Economia: Dark Pools e HFT, artigo de 2010 (!), e Dark Pools de 2012 podem ajudar. Para resumir: as Dark Pools (que podemos traduzir livremente como “Poço Negro”) são plataformas electrónicas para a negociação de títulos, derivados e outros instrumentos financeiros, geralmente utilizadas por instituições financeiras de modo que as transacções permaneçam confidenciais e fora da vista do público.

As Dark Pools não são uma coisa simpática: os pequenos investidores, que operam na Bolsa de Valores normal, não podem observar o verdadeiro fluxo das transacções e nem sabem a qual preços são negociadas as acções, pelo que o mercado dos títulos não é transparente.

As Dark Pools são legais e têm vindo a crescer de importância, em detrimento da Bolsa de Valores “em claro”. Além das vantagens oferecidas pela falta de transparência, nos “Poços Negros” poupa-se pois estes permitem evitar o pagamento das comissões aos operadores do mercado secundário, onde normalmente acontecem as transacções.

Quem frequenta as Dark Pools? Já em 2016, a investigação publicada pela Bloomberg Intelligence revelou que os “Poços Negros” mais utilizados pertenciam ao banco Ubs, Credit Suisse, IEX (empresa de investimento norte-americana), Deutsche Bank, Morgan Stanley, Jp Morgan Chase, Merril Lynch e Barclays. Em suma, quase todos os grandes bancos, em paralelo com as suas actividades oficiais, gerem Dark Pools com as quais evitam a concorrência e o “livre” mercado. A propósito: também Bloomberg tem a sua Dark Pool.

Em 2016, Barclays e Credit Suisse foram multados respectivamente em 70 e 85 milhões de Dólares pelas autoridades norte-americanas por irregularidades nas suas Dark Pools: de acordo com as autoridades, os bancos tinham favorecido alguns investidores de alta frequência, armados de algoritmos e supercomputadores, em detrimento dos tradicionais investidores institucionais; não realizaram os controlos internos exigidos pelos regulamentos; e forneceram informações falsas aos clientes.

As transacções “negras” em tempos de pandemia aumentaram ainda mais: o valor deste tipo de comércio no primeiro trimestre de 2020, em plena “pandemia”, atingiu 199.73 mil milhões de Dólares. Isso é: +65% do que no mesmo período de 2019. Se considerarmos apenas o mês de Março, o aumento foi de +118%. Estes números são portanto de importância absoluta e existe o risco real de desestabilizar o mercado “normal” das acções, tornando o valor dos títulos menos preciso e os mercados reguladores menos eficientes.

As últimas estimativas sugerem que 40% de todas as transacções nos Estados Unidos e 20% na Europa são realizadas em Dark Pools. Traduzindo: quando os noticiários falam do “andamento da Bolsa”, na verdade citam os dados de pouco mais de metade de todas as transacções.

Solução? No passado mês de Agosto, a Nasdaq (o mercado de ações automatizado norte-americano) adquiriu uma participação minoritária mas significativa na plataforma de negociação Level AST. Que é uma Dark Pool. E na Austrália, dois “Poços Negros” (ASX Center Point e Chi-X Hidden Liquidity) foram integradas na Bolsa: em conjunto, são responsáveis por cerca de 12% das transacções na Austrália. Pelo que, o lema parece ser “se não podes derrota-las, junta-te a elas”.

O facto é que as Dark Pools significam um duro golpe à transparência dos mercados: oferece infinitas possibilidades àqueles que querem não apenas especular, mas também e acima de tudo perseguir objectivos pouco ortodoxos.

Para além de tudo isto, há o facto das mesmas Dark Pools, com os seus misteriosos preços, conseguirem confundir e por vezes até distorcer os valores das acções. O que pensar, por exemplo, dum título que perde valor na Bolsa normal e que, pelo contrário, é objecto de grandes aquisições numa Dark Pool? Estas plataformas podem até contribuir para o caos em momentos de grande tensão nos mercados.

Os mercados financeiros, portanto, desafiando o pensamento de Adam Smith e acólitos, são cada vez mais firmemente controlados por um punhado incrivelmente pequeno de instituições, que actuam à porta fechada e sem regras adequadas.

“Problema de quem joga nas Bolsas”? Não, problema de todos, porque quem faz política e faz guerra é sempre o banqueiro.

 

Ipse dixit.

2 Replies to “Nos Poços Negros, cada vez mais profundos”

  1. Olá Max e todos: tinha que ser assim!! Imagina as farmacêuticas e laboratórios nestes tempos, os banqueiros, os maiores acionistas devem estar mergulhando fundo nesta piscina e colhendo fortunas inimagináveis.
    O mundo pertence aos verdadeiramente poderosos e planificadores daquilo que nós deveremos crer.
    É engraçado ver o povo se sentir financista porque investiu 1000 reais nas ações que as propagandas da TV indicam.

  2. Olá todos: todo mundo migrou para o telegram? Cadê os comentaristas de II? É aqui que continua sendo o melhor da produção do Max. Pelo menos eu constato assim.
    O telegran serve para colher mais comentaristas, tipo copia e cola, em geral, entre aqueles que mais ou menos concordam com as linhas gerais do que é produzido pelo Max e pelos comentaristas de II.

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