Desde a homossexualidade das crianças até o fim da Democracia

Pessoal, hoje é um dia triste, aquele que costuma aparecer todos os anos com invariável precisão. Pelo que: nada de vacinas, nada de Covid. Só uns pensamentos soltos para depois ir chorar na cama, debaixo dos lençóis, longe deste mundo cruel. Assunto: LGBT? Bom, não é mesmo isso: aqui fala-se do ataque que está a ser levado a cabo contra a Democracia, ou melhor, contra o que sobrou dela. Argumento triste para um dia triste. Sigh…

Hungria: stop à homossexualidade para crianças

Eis a notícia: o Parlamento húngaro adoptou, na passada Terça-feira, um texto que proíbe a “promoção” da homossexualidade entre menores.

Durante a sessão, que foi transmitida em directo na televisão, os deputados do partido Fidesz de Viktor Orbán aprovaram um documento que visa “proteger os direitos das crianças”, proibindo os menores de 18 anos “de acederem a pornografia e conteúdos que retratam a sexualidade ou promovem a identidade de género, o desvio, a mudança de sexo e a homossexualidade”.

Esta futura lei marca outra ofensiva contra a ideologia LGBT na Hungria. Desde o regresso de Orbán ao poder em 2010, o seu governo tem abordado questões de género e orientação sexual. A pressão aumentou no último ano, com a aprovação de leis que proíbem as pessoas trans de mudarem o seu estado civil, quanto mais os menores, limitando a capacidade dos casais do mesmo sexo de adoptar uma criança.

Todas estas medidas resultam do desejo do Primeiro Ministro húngaro de estabelecer uma “nova era” cultural destinada à defesa dos valores cristãos e tradicionais. O projecto de lei aprovado pelo Parlamento está incluído num projecto legislativo mais amplo que pune a pedofilia, proíbe a literatura LGBT aos menores de 18 anos, bem como qualquer publicação que incita a homossexualidade e divulgue a educação LGBT.

Em oposição a esta proposta, as ONGs de “direitos humanos”, incluindo a Amnistia Internacional, denunciaram imediatamente esta lei salientando que se trata de restrições semelhantes às da Rússia de Vladimir Putin, onde a “propaganda gay” é proibida. Em particular, a BBC informou que Budapest Pride, uma aliança de grupos pelos direitos dos homossexuais na Hungria, está a tentar envolver o Presidente dos EUA, Joe Biden, para destacar o problema de Orban na Europa. A Hatter Society, outro grupo activista da LGBT, disse que a proposta da Fidesz iria “restringir seriamente a liberdade de expressão e os direitos das crianças”.

A ira da União Europeia: Polónia, Rússia…

De facto, as medidas tomadas pelo governo de Budapeste são muito semelhantes às tomadas por Moscovo em 2013, quando a Rússia aprovou uma lei impondo pesadas multas por espalhar a chamada “propaganda gay” entre crianças menores de 18 anos, proibindo a promoção do “comportamento homossexual entre menores”.

Esta medida do governo húngaro desencadeou uma onda de indignação entre os burocratas da Comissão Europeia que há muito lutam para que a ideologia LGBT seja endossada como “valor do Ocidente” que deveria ser adoptada por todos os Estados do Velho Continente.

De facto, tanto os governos de Budapeste como de Varsóvia (Polónia) estão em vias de ser sancionados pelas autoridades de Bruxelas por não respeitarem as directrizes ideológicas defendidas pela Comissão Europeia. São as organizações ONGs que têm vindo a ditar a linha à Comissão há algum tempo e que a Comissão, por sua vez, transfere como normas a serem adoptadas por todos os governos da UE. Estas organizações consideram as normas de Rússia, Hungria e Polónia como incompatíveis com as actuais tendências na Europa e no Ocidente, tendências que estabelecem uma educação LGBT livre e generalizada nas escolas, casamentos entre pessoas do mesmo sexo como um direito, liberalização das adopções de menores por casais homossexuais, educação sexual LGBT entre menores e mudanças de sexo permitidas.

O princípio democrático

Muito bem, vamos raciocinar. Antes de mais, acho a afirmação da Hatter Society, segundo a qual proibir a homossexualidade “restringir seriamente a liberdade de expressão e os direitos das crianças”, particularmente assustadora: não sei se estes indivíduos têm a mínima noção do que estão a dizer e das implicações, parece que não. Mas vamos além disso, pois a questão é outra.

Comecemos por deixar de lado qualquer opinião pessoal acerca do fenómeno LGBT. Favoráveis? Contrários? Não interessa. Aqui o foco fica no princípio democrático, o dogma absoluto de regula qualquer moderno País, sobretudo ocidental. O que afirma tal dogma? Algo simples: o poder pertence ao povo que exprime as suas opiniões através de livres eleições nas quais elege os seus representantes. Este é o ABC da moderna Democracia.

Vamos ver o que se passa na Hungria. Viktor Orbán ganhou as últimas eleições em 2018 ao liderar o partido nacionalista Fidesz (aliado ao Partido Popular Cristão Democrático) e conseguindo 49.59% dos votos com os sistema proporcional e 47.89% com o sistema maioritário. Um total de 263 lugares no Parlamento, o que significa maioria absoluta, e que confirma quanto acontecido nas eleições de 2010. Não só: mas os resultados foram até melhorados nas eleições Europeias de 2019, onde a coligação conseguiu ultrapassar a fasquia de 50% das preferências (para ser mais precisos: 52.56% dos votos). Isso significa uma coisa muito simples: os cidadãos hungaros estão satisfeitos com a governação de Orbán e, do ponto de vista democrático, governo dele está plenamente legitimado sendo o espelho da vontade do povo. Consequência: as decisões do Parlamento de Budapeste só podem e devem ser respeitadas porque expressão livre e democrática da maioria dos cidadãos húngaros.

E aqui temos um problema: o que acontece quando a vontade popular embate contra as ideologias defendidas por outros Países? É este o caso da ideologia LGBT mas poderia ser um outro assunto qualquer ligado à esfera dos direitos humanos (como a escravidão, por exemplo). É lícito que um País ignore os valores reconhecidos em outros Países? É lícito que um Estado recuse a adopção duma ideologia dominante em outras partes do mundo e continue num seu percurso particular?

Ideologia e Democracia: o caso Irão

A minha resposta é positiva: sim, é lícito. E é fundamental realçar como esta resposta não esteja baseada na minha opinião pessoal acerca da ideologia LGBT (repito: o assunto poderia ser o escravidão, por exemplo, ou as liberdades religiosas ou outro ainda) mas num simples raciocínio. Este raciocínio: ao reconhecer a primazia das ideologias, admitimos que o poder democrático dos cidadãos tem limites. Isso é: os cidadãos podem exprimir a opinião deles mas, se esta for contrária às ideologias dominantes, então a opinião dos cidadãos tem que ser ignorada.

Como é evidente, isso não tem cabimento: em qualquer regime democrático, a vontade popular é o único foco central do sistema eleitoral e legislativo (obviamente estamos a falar de teoria, pois na verdade, como bem sabemos, as coisas se processam de forma diferente e tristonha…). Não pode existir, num qualquer regime democrático, uma ideologia que possa sobrepor-se ao direito democrático dos cidadãos. Não acaso, quando uma tal ideologia existir, já não se fala de “democracia” mas de outro ordenamento estatal.

Por exemplo, no caso do Irão fala-se de “teocracia”, sendo que naquele País o poder democrático dos cidadãos é limitado pela ideologia religiosa. No topo da pirâmide do poder está o Guia Supremo (o Rahbar), a expressão máxima do Velāyat-e faqīh (“a tutela do jurista”), para o qual outras instituições da república islâmica operam em subordinação. O Guia Supremo nomeia os seis membros religiosos do Conselho dos Guardiões da Constituição, composto por doze membros, que têm a tarefa de aprovar candidatos à presidência da república (o seu julgamento é inquestionável). Os poderes do Guia Supremo, listados no artigo 110 da Constituição iraniana, incluem várias funções: além de supervisionar e dirigir o sistema político iraniano, o Guia é também Chefe das Forças Armadas, controla o aparelho de segurança e as principais fundações religiosas, atribui e revoga a nomeação do Chefe do sistema judicial, do Chefe do Estado-Maior do exército regular, do Comandante do Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica (os Pasdaran), do Chefe da Polícia, do Presidente das estações nacionais de rádio e televisão e dos juristas do Conselho dos Guardiães da Constituição.

Portanto, o cidadão iraniano vota mas o seu poder é limitado, sendo que as escolhas deles são antes “filtradas” pelos crivos da religião: é isso que acontece quando uma ideologia fala mais forte da democracia. Isso acontece no Irão com a ideologia religiosa, mas acontece também em outras partes do mundo, por exemplo com ideologias de matriz política.

O que diz a Carta

A União Europeia, da qual a Hungria faz parte, tem conhecimento do problema e decidiu basear-se (sempre em teoria…) na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia: a União admite explicitamente reconhecer-se “nos princípios da democracia e do Estado de direito”, além de respeitar “a diversidade das culturas e tradições dos povos da Europa, bem como as identidades nacionais dos Estados-Membros e a organização dos seus poderes públicos a nível nacional, regional e local”.

Respeito de “culturas e tradições dos povos”. Muito claro. Pelo que, o ponto central da questão é o seguinte: os cidadãos da Hungria elegeram livremente os seus representantes num processo democrático; tais representantes, no respeito da Constituição e da cultura daquele País, adoptaram umas medidas que, do ponto de vista democrático, são o espelho da vontade dos cidadãos húngaros. Tais medidas não contariam a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e, portanto, só podem ser reconhecidas.

É possível critica-las e tentar combate-las? Com certeza. Aliás, o espírito democrático prevê claramente esta possibilidade: qualquer decisão pode ser criticada, discutida e combatida com os instrumentos democráticos. Trata-se de falar aos cidadãos húngaros para eventualmente convence-los de que a ideologia LGBT é boa e faz bem às crianças também. Nas próximas eleições, o actual governos será derrotado e a oposição poderá reverter as decisões por este tomadas. Mas, até lá, as decisões devem ser reconhecidas e respeitadas, sendo proibida qualquer ingerência estrangeira na condução da política nacional húngara através de medidas de punição quais sanções. Caso a União Europeia decida avançar com tais medidas, reconhecerá a primazia da ideologia sobre o direito democrático. Que é o que se passa no Irão, por exemplo.

Mas neste último caso já não será possível falar de “Democracia” mas sim de “democracia condicionada”, sendo que as decisões dos cidadãos serão subordinadas à ideologia escolhida.

O grande limite da Democracia (e o regresso da ideologia)

Dúvida: o princípio democrático pode ter limites? Isso é: por aqui fala-se de direito LGBT, mas o que aconteceria no caso de questões ainda mais delicadas como a citada escravidão? Aqui encontramos um dos grandes limites da Democracia. Vamos ver.

Pessoalmente reconheço o direito de qualquer povo a viver segundo as suas próprias leis. Não importa aos meus olhos quais leis: se estas forem partilhadas pela maioria da população, então é justo que assim seja. Um País decide democraticamente que todas as Terça-feira os cidadãos têm que sair de casa com um chapéu vermelho na cabeça? Se a maioria dos cidadãos concordar, tudo bem, pois é a vida deles e têm que vive-la segundo os ditames deles. Um País decide democraticamente que é permitida a escravidão? Custa, mas afinal quem sou eu para impor a minha vontade? Quais direitos tenho? O que legitima a minha voz até torna-la mais importante da vontade dos cidadão dum País do qual nem faço parte? A verdade é que, segundo o princípio democrático, sou obrigado a respeitar a vontade do próximo: e se a maioria dos cidadãos daquele País concordar com esta medida, aos meus olhos cruel, então assim tem que ser porque Democracia significa também o respeito das escolhas dos outros.

É neste ponto que aparece um enorme problema: porque se num País a maioria dos cidadãos escolheu votar em favor da escravidão, não podemos esquecer que os escravos não votam. Pelo que são obrigados a sofrer um regime de escravidão sem terem os instrumentos democráticos para poder altera-lo. Portanto, falamos aqui das minorias ou daqueles que não gozam dos instrumentos democráticos (nota: não é o caso dos LGBT que têm os instrumentos democráticos, na Hungria também). Este é um enorme limite da Democracia a qual, justamente, é conhecida também como “a ditadura da maioria”: dum lado somos obrigados a reconhecer a primazia do direito democrático, do outro temos que admitir que este regime é imperfeito e pode não salvaguardar devidamente as minorias ou os mais fracos.

Como sair deste impasse? A solução escolhida pelas democracias ocidentais é reconhecer a primazia da ideologia. Os assim chamados “direitos humanos” são isso: ideologia. Não há nenhuma lei “natural” que afirme que todos os seres humanos nascem iguais, com os mesmos direitos e que os mais fracos devem ser protegidos. A bem ver, a Natureza diz o exacto contrário: o mais forte ganha, o mais fraco sucumbe. Pelo que, os direitos humanos são uma ideologia, isso é, um conjunto de valores nos quais se reconhecem muitas comunidades do planeta. Muitas mas não todas: há um certo número de Países que não respeitam os direitos humanos (a Arábia Saudita, por exemplo; e será bom lembrar que este é um fiel aliado do Ocidente).

Mas vimos antes como, quando uma ideologia conseguir sobrepor-se ao direito democrático (caso do Irão), já não é possível falar de Democracia. É outra coisa. Então? Admitimos a primazia da Democracia mas com uma excepção, aquela dos direitos humanos? Ou mantemos intacto o poder democrático ate o fim, seja qual for o custo?

A primazia da Democracia, sempre.

Não existe uma resposta unívoca, cabe ao Leitor responder: cada um tem a sua própria sensibilidade neste aspecto, a sua visão. Do meu lado vou dar uma resposta que pode parecer “crua” mas que tem um fundamento racional: escolho manter intacto o poder democrático, sem limita-lo. A razão?

Os perigos do futuro

Sem esquecer que a Democracia é amplamente imperfeita (e que, portanto, está longe de ser o meu ideal), temos também de admitir que abrir a porta à excepções significa entrar num percurso com consequências que não são previsíveis. Até hoje foram os direitos humanos a limitar o poder democrático dos cidadãos; amanhã pode ser outra coisa, como uma nova ameaça ou uma mudança de valores. Permitir excepções significa viabilizar um sem número de variáveis, presentes e sobretudo futuras, que podem limitar ainda mais a capacidade de escolha por parte dos cidadãos. Já vivemos em regimes “democráticos” que são, na realidade, oligarquias disfarçadas: falta só permitir que isso possa piorar em nome de novas ideologias para que do poder democrático dos cidadãos nem a sombra consiga sobreviver. Este é o primeiro elemento.

O problema não é o sistema (temos o que merecemos)

Depois há outro. “Democracia” significa também assumir as nossas responsabilidades. Se a nossa democracia for disfuncional, mal gerida ou corrupta e deixamos que isso aconteça, então, meus senhores, é preciso admitir: temos o que merecemos. Significa que o nosso País é feito por uma maioria que não tem uma suficiente capacidade de discernimento. Então é inútil alterar o sistema com excepções esperando que isso resolva a situação: o problema não está no sistema mas nos cidadãos.

Enquanto escrevo, penso no caso dos povos indígenas da Amazónia: estão a ser-lhes retiradas terras, o habitat deles é destruído. Se a situação nos for invertida, mais cedo ou mais tarde aquelas culturas irão desaparecer. Quem irá perder com isso? Os povos indígenas? Não: estes continuarão a viver seguindo as tradições deles até puderem, depois desaparecerão. Quem sofrerá uma perda imensa será o Brasil pois todos os cidadãos brasileiros ficarão mais pobres. E isso significa o quê? Significa que não terá existido uma maioria de cidadãos com uma capacidade de discernimento suficiente para impedir aquele desaparecimento. Ou seja: os brasileiros terão o que semearam. (Nota: este foi apenas o primeiro exemplo no qual pensei, mas seria possível falar de qualquer outra “democracia”. Ficando em Portugal: está a ser perdida a cultura do interior, aquela ligada ao campo, à Natureza, às tradições mais antigas deste País e ninguém parece preocupado com isso).

Podemos pensar: mas é mesmo por isso que são precisas ONGs e associações que defendam as minorias e os mais fracos! Justo? Sim e não. É claro que são precisas, mas a obra delas não pode ser “drogada” com a imposição duma ideologia que fale mais forte do poder democrático (que é exactamente o que se está a passar com a minoria LGBT). Se a maioria dos cidadãos não mudar de ideia, ou é porque não está interessada ou é porque não tem capacidade para isso. Mais uma vez: não podemos alterar o sistema para ultrapassar a vontade da maioria cada vez uma minoria “iluminada” assim pretender. Ou as mudanças nascem de forma espontânea a partir da base (do eleitorado), ou então são imposições que por definição são antidemocráticas porque não partilhadas pela maioria dos cidadãos.

A minoria “iluminada”

E há também uma terceira razão. Uma minoria que consegue impor a sua vontade à maioria subentende a presença dum grupo de “iluminados”, indivíduos mais inteligentes, mais cultos, mais preparados do que o cidadão médio. Nesta óptica, e voltando ao caso dos indígenas da Amazónia, podemos achar que uma minoria de pessoas mais sensíveis esteja justamente a lutar para defender os direitos duma minoria em perigo. Em boa verdade eu concordo com isso mas…

Mas quem decide qual minoria merece prevalecer e qual não? Como distinguir uma minoria “iluminada” duma “não iluminada”? E por qual razão, num sistema democrático, uma minoria “iluminada” deveria poder ignorar as regras democráticas? É justiça esta? Não, não é, seja qual for o assunto em causa.

Lembro que nesta mesma altura há uma minoria que se acha “iluminada” que está a implementar algo cujo nome é Great Reset. São pessoas com muito poder, com uma cultura cima da média, com conhecimentos científicos… o que acham: vamos abraçar esta minoria também? Não? E por qual razão “não”? Afinal é uma minoria e é “iluminada” também, o que pode dar para o torto?

Solução?

É claro que a ideologia LGBT está a ser utilizada apenas como um instrumento (um dos muitos) por parte dum movimento que tem como objectivo reduzir cada vez mais o poder democrático nas mãos dos cidadãos, até a sua aniquilação, e para eliminar aqueles valores contrários à agenda da elite (como, por exemplo, o nacionalismo do qual Orbán é representante).

Mas, abandonado o particular para retomar o discurso geral, vimos como a Democracia apresente uma série de questões que põe em risco a primazia do poder do cidadão. Como resolver isso? Também vimos que abrir excepções acarreta sérios riscos para o futuro, o problema não é o sistema em si quanto as pessoas, não existem minorias “iluminadas” sem perigos para a Democracia. Então, e voltando mais uma vez às questões apresentadas (indígenas do Brasil e despovoamento de Portugal), qual possível solução?

Resposta: o voto. Trata-se disso: perguntar aos cidadãos não apenas uma vez de quatro em quatro anos, mas deixar que estes possam exprimir-se mais vezes. A salvaguarda da Democracia passa obrigatoriamente por fazer funcionar a mesma Democracia ao máximo das rotações permitidas. Por exemplo: no Brasil um partido que decida questionar directamente os cidadãos acerca do problema dos indígenas, fazendo que possam também escolher entre um leque de possíveis soluções. Em Portugal: um partido que chame a atenção dos eleitores para a questão do despovoamento do interior e que, novamente, permita escolher entre um leque de possíveis soluções.

Trata-se duma solução perfeita? Claro que não: um sistema imperfeito não pode oferecer soluções perfeitas e a Democracia está longe de ser perfeita. Neste caso, ficaria sempre o problema da “ditadura da maioria”. Mas é a melhor solução na óptica democrática: afinal, trata-se de permitir que a participação dos cidadãos seja aumentada o que, entre as outras coisas, teria o condão de envolver o cidadão médio em questões que normalmente ignora. E é exactamente por causa disso que esta prática não é permitida: o cidadão ignorante é o cidadão que pode ser mais facilmente manipulado, esqueçam as alegadas “dificuldades técnicas para implementar a democracia directa”.

Existe uma solução mais rápida? Existe e tem um nome: “Kalashnikov”. Não é muito democrática, mas acho que chega uma altura em que o cidadão tem o direito-dever de recuperar a soberania, seja de que maneira. Mas é claro que esta solução só pode ser considerada de forma séria apenas quando todas as outras tiverem fracassado. E, na minha óptica, ainda não chegámos a este ponto (apesar de estarmos muito perto dele).

Até aqui as razões pelas quais defendo a inviolabilidade do poder democrático dos cidadãos. Como afirmado, é apenas o meu ponto de vista, pelo que o Leitor pode tranquilamente ter outro. Que, no entanto, estará errado. É a lei.

 

Ipse dixit.

5 Replies to “Desde a homossexualidade das crianças até o fim da Democracia”

  1. Olá Max: os marxistas afirmam o que Max dizia, ou seja: as relações sociais são determinadas pela riqueza e pelo território. Seja lá, concordo, não por ser marxista mas simplesmente que nisso o sujeito tinha razão. Os pós marxistas acrescentaram outra invenção a partir de Althusser: existe uma sobre determinação que é a ideologia. Me parece plausível.
    A ideologia dominante em Rússia, Hungria e Polônia é a religião católica que condena esses excessos para o povo (os dominados), sejamos bem claros. Todo tipo de promiscuidade permeia os chefes da igreja, tanto quanto os mandantes do governo global, como os chefes de democracias cambaleantes, como os altos níveis das instituições de justiça, militares, policiais, de saúde, educação e mais.
    A ideologia dominante para os demais países, no ocidente, é aquela bonita do governo global, que no momento presente quer caos, confusão ,e eliminação da democracia (como afirma o Max) travestida de respeito a diversidade.
    Eu acho que é mais para controle absoluto (classificação de grupos e indivíduos ) do que propriamente eliminação da democracia
    Para mim a democracia já é defunta porque se baseia em instituições que sempre estiveram a serviço dos dominantes, como exemplo mais claro a justiça e suas leis que prejudicam os pobres e garantem os ricos.
    Em pesquisa anterior o Max me convenceu que o governo global com a consequente sociedade de controle está posta. Esta ideologia permeia pobres e ricos. E é aí que eu tranco: como que a sociedade assim constituída pode estabelecer uma democracia direta, quando a grande maioria tem interiorizada a ideologia da classe dominante?
    Alguns de nós poderíamos, grupos ora dispersos e muito pequenos.
    O Brazil, por exemplo abraça a ideologia dominante pela disseminação da doutrina de segurança das forças armadas daqui e do império em decadência.
    As forças armadas e policiais têm armas, nós não temos. Sugiro uma certa igualdade neste pormenor.
    Eu quero deixar os índios viverem em paz nas suas terras. Quero os sem terra dispor de terras para viver (o que nem é comunismo, é uma reforma liberal democrática). Quero os homossexuais vivendo como preferirem. Quero toda gente comendo comida para o corpo e comida para mente (estudando o que se estuda nos núcleos dos sem terra). Quero mais gente pensando assim por 2 ou 3 décadas. Aí quero as nossas armas para darmos conta do resto.
    Quando eu tiver 100anos , meio esqueleto de titaneo, vou lutar. Mas prefiro mudar de planeta/ dimensão bem antes. Não vou fazer falta. Milhares estarão em luta.

  2. Max. , mais um grande texto. Parabéns.
    Apenas gostaria de fazer um comentário sobre as terras indígenas da Amazônia, sei que foi apenas um exemplo mas acho que vale um dado estatístico.
    12.5% do território brasileiro corresponde a reservas indígenas onde vivem cerca de 500 mil índios. Essa imensidão de terras corresponde a cerca de 1 milhão de km², o Brasil tem cerca de 8,5 milhões de km². A maior reserva brasileira se chama raposa Serra do Sol no estado de Roraima, tem 1,7 milhões (isso mesmo, milhões) de hectares com 1000 km de perímetro e vivem nela cerca de 12 mil índios.
    Portanto, há muita terra.
    Abraço

  3. Saudações Max.
    É muito bom saber que estás melhor do teu problema de saúde.
    Parabéns pelo grande texto que relaciona temas sérios e diferentes (mas na verdade talvez menos importantes..) e concluindo com um conceito simplificado com o qual concordo bastante (muito mais importante).

    O mais importante.
    A ideia de democracia bastante mais participativa e muito menos representativa,
    (apesar do risco de em Portugal ficarmos a ser todos governados pelas notícias de qualidade duvidosa do Correio da Manhã).
    Mesmo assim talvez valesse seriamente o risco da experiência.
    Se bem que os desafios de implementação seriam enormes e se houvesse sucesso, durante pelo menos uma década ou duas, Portugal estaria condenado a uma crise provocada tanto interiormente como pelo exterior..
    Onde é que eu me inscrevo? Eheh

    Os menos importantes.
    Quanto aos assuntos LGBT,, ou índios brasileiros,
    ou desertificação do interior de Portugal, não retirando a importância mas em comparação ao panorama global (tipo de sistema) é de pequena expressão que deveria e tem mesmo que ser tratado nacionalmente, se possível.

    Com os melhores cumprimentos.
    De um regular leitor/seguidor mas praticamente nunca comentador.

    DSF.

  4. Errata: no meu comentário, primeiro parágrafo escrevi território no lugar de propriedade. Lamento que ninguém tenha me corrigido.

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