Há um projecto liderado por cientistas da Universidade de Harvard (EUA) e financiado em grande parte pelo fundador da Microsoft, o simpático Bill Gates, para testar a tecnologia de escurecimento do sol e assim arrefecer o planeta. Não se trata de algo planeado para um futuro distante mas sim dum projecto em pleno andamento que terá a fase prática a partir deste ano.
A agência Reuters informa que o projecto de Harvard “planeia testar uma controversa teoria de que o aquecimento global pode ser travado através da pulverização de partículas para a atmosfera que reflectiriam os raios solares”. Para isso será inicialmente lançado um balão sonda a partir da cidade árctica de Kiruna, na Suécia, já no próximo mês de Junho. Transportará 600 kg de equipamento científico até 20 km de altura. A sonda não libertará quaisquer partículas na atmosfera, mas será um passo em frente para uma primeira experiência, talvez no Outono de 2021 ou na Primavera de 2022: neste novo teste, a sonda transportará até 2 kg de pó de carbonato de cálcio não tóxico que será libertado para a atmosfera.
“Há muitas preocupações reais” sobre os riscos das alterações climáticas e da geoengenharia solar, afirma David Keith que está envolvido no projecto e é professor de Física aplicada na Escola de Engenharia e Ciências Aplicadas de Harvard: “Compreendê-los requer uma série de actividades, incluindo experiências”. A ideia é que o estudo dos efeitos dos material a alta altitude sobre a luz da nossa estrela poderia ajudar a compreender melhor como a geoengenharia solar poderia funcionar.
Mas nem todos concordam e os opositores vêem o balão como um passo perigoso em direcção à engenharia do clima, algo com riscos potencialmente grandes e difíceis de prever, tais como mudanças nos padrões globais de chuva.
“Não há nenhum mérito neste teste, excepto o de permitir o passo seguinte. Não se pode testar o gatilho de uma bomba e dizer ‘Isto não pode fazer mal nenhum'”, diz Nicklas Hällström, Director do think-tank ambientalista sueco WhatNext?. “A sociedade sueca exige cada vez mais soluções reais e imediatas para as alterações climáticas”, tais como uma rápida transformação dos combustíveis fósseis em direcção a uma sociedade sem carbono. E acrescenta que o projecto de Harvard “representa o oposto”, uma vez que pode criar a impressão de que é possível continuar a utilizar combustíveis fósseis.
Lili Fuhr, chefe da divisão internacional de política ambiental da Fundação Heinrich Böll (Alemanha) também afirma que o plano “atravessa uma importante linha política vermelha. […] Eles não querem parar com esta pequena experiência. A razão é conseguir experiências maiores”, fazendo também notar como o projecto viole a moratória global de 2010 sobre a geoengenharia no âmbito da Convenção das Nações Unidas sobre Biodiversidade.
Contudo, essa moratória não é vinculativa e permite excepções no caso de estudos de investigação científica em pequena escala. Os funcionários da SCoPEx, a empresa que coopera no lançamento, dizem não acreditar for necessária qualquer aprovação especial para o voo, dado que cerca de 300 balões estratosféricos semelhantes foram lançados em todo o mundo em 2019. E Anni Bolenius, porta-voz da Swedish Space Corporation, acrescenta que foram cumpridas “todas as legislações internacionais e nacionais aplicáveis”.
Mas não há apenas Bill Gates entre os financiadores do projecto. Janos Pasztor, Director executivo da Carnegie Climate Governance Initiative (“Iniciativa Carnegie de Governação Climática”), elogia a nova abordagem: “Não exageremos e nem reajamos em demasia do lado crítico negativo”, continuando que o teste sueco poderia ajudar a sociedade a debater e a compreender a urgência de abordar a questão das alterações climáticas.
O projecto da Carnegie diz ser imparcial quanto à potencial utilização de tecnologias que alteram o clima, mas quer assegurar uma boa governação do percurso. Os defensores da geoengenharia solar, também conhecida como modificação da radiação solar, dizem que a implantação da tecnologia poderia ser um atalho para abrandar um aumento da temperatura global que está a provocar mais ondas de calor, incêndios, secas e aumento do nível do mar (dizem eles) à medida que milhares de milhões de toneladas de gases com efeito de estufa se acumulam na atmosfera.
Como poderia este “chapéu de chuva solar” travar a acumulação de dióxido de carbono na atmosfera é um mistério. Sempre admitindo que a acumulação de CO2 seja um grave problema. Mas o mundo precisa de visionário, tal como explica David Keith:
Há uma longa história de pessoas a fazer investigação sobre coisas que na altura eram socialmente impopulares e que agora consideramos importantes.
Verdade. Assim como há uma longa história de falhanços, porque o limiar entre visão e delírio é muito subtil. Eis um resumo da página de Wikipedia (versão portuguesa) acerca da teoria em exame, a Injecção de Aerossol na Estratosfera:
A capacidade de criar um escurecimento global a partir de aerosóis de sulfatos estratosféricos fez-lhes um possível candidato para uso em projetos de engenharia de clima, e um possível candidato para limitar o efeito e o impacto de mudanças climáticas devido ao aumento dos níveis de gases de efeito estufa.
Obviamente, Wikipedia assume que as mudanças climatéricas sejam de origem humana.
Tem sido sugerido que a entrega direta dos precursores poderia ser alcançado usando sulfeto de gases como o dimetil sulfeto, dióxido de enxofre (SO2), sulfeto de carbonila, ou sulfeto de hidrogênio (H2S). Estes compostos poderiam ser entregues usando artilharia, aviões (tais como F-15C) ou balões, e resultar na formação de compostos com o sulfato de ânions.
Sempre da Wikipedia:
- Dimetil sulfeto (Wikipedia versão inglesa): O dimetil sulfeto é altamente inflamável e irritante para os olhos e a pele. É prejudicial se engolido. Tem um odor desagradável, mesmo em concentrações extremamente baixas.
- Ácido sulfúrico: O ácido sulfúrico é capaz de causar queimaduras graves, especialmente quando em altas concentrações. Em comum com outros ácidos corrosivos e álcalis, ele rapidamente decompõe proteínas e lipídios por meio de hidrólise e hidrólise éster a partir do contato com tecidos vivos, como a pele e músculos. Complementarmente, ele apresenta uma forte reação de desidratação em carboidratos, liberando calor adicional e causando queimaduras de segundo grau. Da mesma forma, ele ataca rapidamente a córnea e pode levar à deficiência visual permanente se em contato com os olhos. Se ingerido, danifica os órgãos internos de forma irreversível e pode ser fatal
- Sulfeto de hidrogénio: é um gás altamente tóxico e inflamável (faixa de inflamabilidade: 4.3 % – 46 %). Sendo mais pesado que o ar, tende a acumular-se no fundo de espaços pobremente ventilados. Embora de odor muito pungente ao início, rapidamente enfraquece o sentido do olfato, assim as vítimas potenciais podem não estar cientes da sua presença, até que seja tarde demais.
- Dióxido de enxofre: O dióxido de enxofre é prejudicial à nossa saúde enquanto gás livre no ambiente.
- Sulfeto de carbonila (Wikipedia versão inglesa): Até 1994 existia informação limitada sobre a toxicidade aguda do sulfureto de carbonilo no homem e nos animais. Concentrações elevadas (>1000 ppm) podem causar colapso súbito, convulsões, e morte por paralisia respiratória. Foram relatadas mortes ocasionais, praticamente sem irritação local ou aviso olfactivo.
Verdade, todos estes componentes seriam utilizados em baixa concentrações, sendo dispersados na atmosfera. Por exemplo:
De acordo com as estimativas, “se um quilo de enxofre for bem colocado na estratosfera, poderia compensar o efeito de aquecimento de várias centenas de milhares de quilos de dióxido de carbono.”
Tudo bem, no entanto não é que representem o máximo do ponto de vista da saúde, sobretudo porque sabemos que os acidentes acontecem.
E agora a secção dedicada aos possíveis efeitos colaterais desta técnica:
Destruição da camada de ozônio: é um potencial efeito colateral de aerossóis de enxofre; e a estas preocupações têm sido suportadas pelo modelo. No entanto, isso só pode ocorrer se altas quantidades de aerossóis forem depositadas em nuvens estratosféricas polares, antes de os níveis de CFCs e outros gases destruidores da camada de ozônio cairem naturalmente para níveis seguros. Aerossóis na estratosfera, juntamente com gases que impactam a camada de ozônio, são responsáveis pela destruição da camada de ozônio.
Clareamento do céu: Aerossóis estratosféricos têm o potencial para clarear o céu e a causar pôr do sóis mais coloridos, dependendo da quantidade que está sendo pulverizada. De acordo com um estudo sobre a limpeza do ar, branqueamento solar tem sido responsável por um aumento na produção de milho nos últimos 30 anos.
Aquecimento da Tropopausa: a também umidificação da estratosfera.
Regional de aquecimento: com base nos resultados do Modelo de Geoengenharia de Intercomparação em 2014-2015, um modelo com cenário padrão de injeção de aerossol estratosférico indica que as temperaturas nos trópicos poderiam reduzir, e nas latitudes mais elevadas esquentar, porém a redução dos glaciares ainda continuaria, embora a uma taxa reduzida. Anomalias extremas de temperatura também continuariam a aumentar, mas em menor grau.
Mudança de temperatura estratosférica: os aerossóis podem também absorver parte da radiação do sol, da Terra e da atmosfera circundante. Isto altera a temperatura do ar circunlante e poderia potencialmente impactar na circulação da estratosfera, o que por sua vez pode afetar a circulação na superfície.
Respostas hidrológicas regionais: com base nos resultados do Modelo de Geo-engenharia de Intercomparação, haveria uma redução na média global de precipitação em todo o mundo, particularmente nas regiões de monção durante o verão.
Efeitos na saúde: Enquanto o sulfato de partículas são naturais, eles ainda têm potenciais efeitos na saúde. Minimização desses efeitos é principalmente alcançado, garantindo que as partículas permaneçam no ar o máximo de tempo possível, reduzindo, assim, as quantidades que possam retornar para a atmosfera inferior.
Como é? Ah, sim: é sempre para o nosso bem. E não esquecemos de que é só culpa nossa.
Ipse dixit.