Ucrânia: o vento muda?

Em primeiro lugar, uma sugestão: não apanhem a gripe. Sério, não tem jeito nenhum, é mesmo estúpido. Simplesmente recusem, digam “Não estou interessado”, “Lamento, sou ateu” ou algo do género. Porque depois, uma vez apanhada, é preciso ficar no sofá, com um cão que de vez em quando passa para ver como estamos e dá uma lambidela no nosso nariz (porque, segundo a visão canina, isso deveria ajudar) enquanto na televisão passam coisas como “Forjados no Fogo”, uma série na qual há um grupo de pessoas que, por alguma razão, forjam coisas no fogo e o expectador é suposto ficar entusiasmado com isso; ou “A Maldição de Oak Island”, onde um grupo de pessoas (que suponho serem parentes dos anteriores) há anos que cavam um poço no fundo do qual não há nada. Repito: recusem.

Até aqui as coisas sérias. Agora vamos ver as outras.

Zelensky, o Presidente que ainda não é

De repente, o exército de Kiev (formado por neonazistas com tanto de bandeiras das SS, mas “Bons” porque pró-ocidentais) intensificou o bombardeio no território da “República Popular de Donetsk”, a isolada área de língua russa. Acima de tudo, está a usar artilharia de grande calibre ou munição de morteiro, todas coisitas que em teoria deveriam ser proibidas pelos famosos “Acordos de Minsk”.

Obviamente nada disso foge dos olhos vigilantes da OSCE, a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa, a estrutura ocidental que promove a democracia e o liberalismo económico no velho Continente. E a resposta é imediata: quando uma bala de morteiro destruir uma casa, a OSCE vai até o local, analisa a casa e constata que sim, de facto, foi atingida. OSCE: dinheiro público bem gasto.

Mas por qual razão o exército de Kiev voltou aos bombardeamentos? Este é o problema: ninguém oficialmente tem uma resposta. A hipótese é que esta seja a resposta dos militares (mas não só deles) perante o resultado das últimas eleições presidenciais.

Os ucranianos acabam de votar com grande maioria Vladimir Zelensky: um autêntico tiro no escuro, tudo para livrar-se do infame Petro Poroshenko, da corrupção e da incapacidade do seu regime em resolver qualquer problema do País, a começar pela pobreza. Portanto, Zelensky foi eleito, no entanto não consegue estabelecer-se e governar. Como tem declarado:

Coisas estranhas acontecem: há uma vitória, mas nenhuma autoridade. A Comissão Eleitoral Central está a adiar o anúncio oficial dos resultados, para que a Verkhovna Rada [o Parlamento, ndt] atrase a data de inauguração.

O que não admira: a Comissão Eleitoral Central é um órgão cujos membros foram escolhidos um por um por Porosenko, esperando assim num o “ajuste” da votação. Ajuste que não aconteceu o que, se aconteceu, não foi suficiente. Mas agora a Comissão está a atrasar artificialmente a nomeação de Zelensky e, portanto, do novo Parlamento e do novo governo. Mas quem fica beneficiado com esse atraso e o vácuo de poder?

Poroshenko, que de certeza não espera voltar ao governo em Kiev. Mas ele e o seu grupo observam uma mudança na situação internacional, algo que não os favorece. Em Março passado, a candidata Yulia Timoshenko falou de processos criminais que seriam abertos nos EUA contra Poroshenko e associados, por causa de lavagem de dinheiro e peculato: em particular, dos bilhões emprestados sem condições pelo FMI ao seu governo, na altura em que o Subsecretário dos EUA, a hebraica Victoria Nuland (tanto para não esquecer: é a mesma Nuland que disse fuck the EU perante a hipótese da Europa colaborar para encontrar uma solução à crise ucraniana), já tinha gasto 5 bilhões de Dólares para favorecer a mudança de regime na Ucrânia.

Fake e não fake…

Obviamente, esta notícia foi marcada como um fake ditado por Putin (é sempre Putin o culpado, qualquer coisa aconteça no planeta); mas é notável que Donald Trump, recentemente, tenha atirado para o ar a história duns “agentes ucranianos” que manipularam a votação americana em 2016 para que ganhasse a simpática Hillary Clinton (padrinha da Nuland). Algo que não é apenas credível, mas que se encaixa na estrutura do RussiaGate, o processo alimentado por parte de FBI, agências de inteligência americanas, britânicas e anti-russas do leste para provar que Trump é um agente de Putin. O RussiaGate fracassou de forma espetacular e, evidentemente, agora chegou o tempo de fazer um pouco de limpeza.

Poroshenko e a junta do golpe de Kiev são agora consideradas como criaturas de Obama e da Clinton. Deve-se acrescentar que cinco anos após o massacre da Casa do Sindicato, cometido em Odessa pelos neonazistas ucranianos em 2 de Maio de 2014, a ONU, através da sua Missão de Monitorização dos Direitos Humanos na Ucrânia, acusou o regime de Kiev de não ter feito nada para identificar e condenar os autores dos assassinatos: e se até a ONU agora tem a coragem de levantar acusações, evidentemente a direcção do vento mudou na Ucrânia.

Lembramos: segundo os dados oficiais, 48 ​​pessoas morreram no incêndio provocado na Casa do Sindicato. Na realidade, não apenas os mortos ultrapassaram a centena, mas pelo menos em seis casos (oficialmente), antes do assassinato, as mulheres foram também estupradas. Um conjunto de atrocidades impunes, que só agora a ONU consegue lembrar, cinco anos depois.

Como afirmado, tudo isto indica uma mudança de vento, que agora é bem frio para a antiga junta de Kiev, cuja legitimidade residia apenas no apoio ocidental, nos bilhões atirados pelo FMI (e pela Alemanha) e na esperança de entrar na Nato e na União Europeia.

Fim da guerra em vista?

No Outono passado, Poroshenko decidiu, repentina e unilateralmente, acabar com o Tratado de Amizade e Cooperação com Moscovo. Mossa imprudente, porque com este Tratado (originariamente assinado em 1997) sancionava a inviolabilidade das fronteiras entre os dois Países. Assim, repudiando o Tratado, Kiev privou-se da arma de pressão legal sobre a questão da Crimeia, segundo eles “ocupada” pelos russos em violação das fronteiras sagradas: tese, lembre-se, mantida com obtusidade mesmo pelo burocratas-esteiras da União Europeia. Alguém aconselhou mal o simpático Poroshenko?

Há poucos dias, o Presidente Putin surpreendeu todos ao anunciar que os habitantes da Ucrânia oriental (os separatistas) poderiam obter de imediato a cidadania russa, acrescentando que teria simplificado a questão dos passaportes russos para todos os ucranianos que o querem. Curiosamente, nem Washington e nem Bruxelas levantaram a voz contra essa “provocação” de Vladimir: e isso significará algo.

A possibilidade é que Washington, após ter gasto inutilmente bilhões para separar a Ucrânia da Federação Russa e recebe-la como membro da Nato, agora possa aceitar a divisão do País. E isso explicaria a reacção dos milicianos, os tais neonazistas fieis de Poroshenko: a desesperada tentativa de ganhar terreno antes que seja tarde demais.

 

Ipse dixit.

One Reply to “Ucrânia: o vento muda?”

  1. Isso também pode significar que os interesses beligerantes dos EUA tenham mudado de continente. Afinal a economia não suporta a manutenção da guerra no mundo inteiro. Conveniente se faz eleger prioridades momentâneas. Eu estou apostando na Venezuela para deixar as coisas como devem ser, além naturalmente de Gaza e Líbano porque sempre será necessário fazer um israel expandido, conforme os interesses dos amigos íntimos. Me refiro à guerra com sangue visível, com sangue escorrendo, já que a guerra comercial continuará fazendo e desfazendo alianças pelo mundo afora, mas esta produz aos sancionados e perdedores um sangue invisível, aquele da miséria dos povos.

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