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Netanyhau: fim da corrida?

Netanyahu no fim da linha? Talvez. Não falta muito para as eleições legislativas em israel e, de acordo com as mais recentes sondagens, o partido do primeiro ministro (o nacionalista Likud) poderia recolher 31 das 120 cadeiras do Parlamento, menos das 36 conseguidas pela aliança eleitoral entre a General Gantz e o jornalista Lapid (centro-direita moderados).

O partido de esquerda Meretz já anunciou que irá apoiar o Governo de Gantz e Lapid, pedindo também a ajuda dos eleitores árabes para afastar Netanyahu. Isso pode surpreender, mas há uma justificação: Netanyahu assinou um acordo eleitoral com o partido Otzmà Yehudit, criado por fiéis do rabino racista Kahane, centrado na ideia da supremacia hebraica. Kahane foi assassinado nos anos ’90, mas a sua ideologia ainda tem adeptos: Netanyahu tem dificuldade em justificar a sua decisão não só com os eleitores do Likud, mas também com os judeus americanos, que até agora o apoiaram e que agora criticam o primeiro ministro de forma aberta, apesar da aliança política com a Administração Trump.

De facto é confronto político aberto entre as associações judaicas dos Estados Unidos, Netanyahu e Otzma Yehudit. Na semana passada, o American Jewish Comitê e o AIPAC (que reúne muitas organizações judaicas americanas) atacaram a aliança eleitoral do primeiro ministro com o pequenos mas molesto Otzma Yehudit. Netanyahu está em apuros, a sua linha política falhou, portanto precisa de aliados: sabe que a batalha eleitoral será muito renhida e não hesitou em pedir ajuda ao partido de extrema direita.

Netanyahu ultrapassou uma fronteira ética e moral. Segundo o candidato Benny Gantz:

Estamos a prejudicar a credibilidade de israel, a moralidade do nosso país e as relações com a comunidade judaica americana.

O que não é verdade: a credibilidade e a moralidade de israel já foram perdidas há muito, neste aspecto o simpático Netanyahu continuou algo que não tinha sido começado por ele. Mais problemáticas, isso sim, a questão dos relacionamentos com a comunidade americana, que não costuma intervir de forma directa nas questões políticas de Tel Avive: se desta vez decidiu fazê-lo é porque a situação está a sair do controle.

Otzmà Yehudit é um partido declaradamente sionista, ultranacionalista e anti-árabe. Pede a anexação da Cisjordânia, o completo domínio israelita entre o rio Jordão e o Mar Mediterrâneo, é contrário à formação de um Estado palestiniano, defende o cancelamento dos acordos de Oslo bem como a imposição da soberania israelita sobre o Monte do Templo em Jerusalem. Otzmà Yehudit é contrário a bloquear a construção de novos assentamentos judaicos, libertar terroristas ou negociar com a Autoridade Palestiniana; também defende a deportação de “extremistas árabes” e a expulsão dos cidadãos árabes que, em israel, que não sejam leais ao Estado e aos princípio israelitas. Na prática, Otzmà Yehudit é um partido racista e fascista, politicamente marginalizado mas que seria útil para Nethanyau manter a maioria no Parlamento.

Não é difícil entender a intromissão da comunidade hebraica americana. Um Otzmà Yehudit no poder significaria novas revoltas palestinianas nas zonas de maior atrito, isso é, a abertura duma frente interna numa altura em que a frente síria continua activa e aquela iraniana ameaça aquecer nos próximos tempos. Também o partido de esquerda deve ter entendido isso, daí o seu apoio para sustentar um governo que não inclua a extrema direita.

Talvez tenha sido este o último erro de Netanyhau: desde Janeiro de 2017, o primeiro ministro está a ser investigado e pela polícia em dois casos, o “Caso 1000” e o “Caso 2000”. No primeiro caso, o “1000”, o primeiro ministro é suspeito de ter obtido benefícios inadequados em larga escala de empresários, incluindo o produtor de Hollywood Arnon Milchan (12 Years a Slave, JFK, Heat, Fight Club, Mr. and Mrs. Smith, Brazil, Pretty Woman, L.A. Confidential) e o bilionário australiano James Packer. O segundo caso envolve alegadas tentativas de fechar um acordo com o editor do jornal Yediot Ahronot, Arnon Mozes, para promover uma legislação que enfraqueça o principal concorrente de Yediot, o Israel Hayom, em troca de uma cobertura mais favorável de Netanyahu.

Em 3 de Agosto de 2017, a polícia israelita confirmou pela primeira vez que Netanyahu é suspeito de crimes envolvendo fraude, quebra de confiança e suborno nos casos “1000” e “2000”. No dia seguinte, o ex-chefe de gabinete do primeiro ministro, Ari Harow, havia assinado um acordo com os promotores públicos para tornar-se testemunha do Estado e testemunhar contra Netanyahu nesses casos.

Em 13 de Fevereiro de 2018, a polícia recomendou que Netanyahu fosse acusado de corrupção. De acordo com um comunicado da polícia, existem evidências suficientes para indiciar o primeiro ministro sob acusações de suborno, fraude e quebra de confiança nos dois casos separados, “1000” e “2000”. Netanyahu respondeu que as alegações eram infundadas e que ele continuaria como primeiro ministro. Em 25 de Novembro do mesmo ano, foi relatado que o director da Divisão de Crimes Económicos, Liat Ben-Ari, recomendou a acusação para ambos os casos. A recomendação precisará ser aprovada pelo Promotor Estadual Shai Nitzan e pelo Procurador Geral Avichai Mandelblit.

Agora é a vez do machado da comunidade hebraica americana: parece o pôr do sol dum político do qual ninguém terá saudade.

 

Ipse dixit.

Fontes: La Repubblica, Haaratz