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O voto “ponderado”

O seu nome é Dambisa Moyo, é um economista de renome internacional: trabalha na direção do banco Barclays Bank, da Seagate Technology, da Chevron Corporation e da empresa de mineração Barrick Gold, colabora com o Wall Street Journal e o Financial Times. Já trabalhou dois anos no Banco Mundial e oito anos na Goldman Sachs. E não faltam os prémios: do World Economic Forum, da revista Time, até de Oprah Winfrey.

Resumindo: Dambisa é um autêntico génio. Ou pessoa do establishment. É o Leitor que escolhe. Em qualquer caso: ela tem ideias geniais. Por exemplo: o “voto ponderado”. Que significa o seguinte: os votos dos eleitores não são todos iguais, alguns devem valer mais do que os outros. A revista de inutilidades Vanity Fair (versão italiana) não podia ter deixado escapar a ocasião e foi logo entrevistar o génio, tanto para entender melhor a maravilhosa ideia.

Na prática: o voto daqueles que estão interessados na política, ficam informados, seguem os debates, vale mais do voto daqueles que não seguem a política. Remata a revista das inutilidades:

E se isso, em vez de uma provocação com um sabor vagamente snob, fosse um projecto sério para tornar o voto mais difundido, efetivo e informado e, portanto, as nossas democracias mais vitais e robustas?

Com certeza: é sabido que limitar a democracia é a melhor forma para melhora-la. Vamos ler “o projecto sério”.

Por que a democracia está quebrada, o que acha?
Porque ela já não capaz de impulsionar o crescimento económico de forma eficaz. Há países sem democracia, como a China, onde a economia prospera, e outros, profundamente democráticos, como a União Europeia, em que a economia cambaleia.

Pelo que aprendemos o seguinte: a democracia serve apenas para impulsionar o crescimento económico. Nada de crescimento? Então a democracia não funciona. Começamos bem…

Entre as suas propostas, fez muito discutir aquela sobre o “voto ponderado”.
A ideia é que os eleitores sejam chamados a mostrar o seu compromisso com a política e as eleições. Se eles provarem estar informados, então o voto vale na totalidade. Se eles mostrarem que não estão informados, então irá valer um pouco menos.

Você não teme que a sua ideia de voto ponderado pareça vagamente classista? Até prova em contrário somos todos iguais…
Claro que somos todos iguais. E a ideia do voto ponderado, na verdade, não tem nada a ver com género, cultura, educação ou classe social, ou mesmo com posições políticas. Tem a ver com o quanto você se importar com o que está a fazer. Se você estiver interessado em política, se você gastar tempo e paixão, é justo que a sua voz pese mais no debate.

Traduzindo: em democracia somos todos iguais, mas alguns são mais iguais do que outros.

E se ao longo dos anos você mostrou pouco interesse no assunto?
Você é bem-vindo na eleição, mas o seu voto valeria um pouco menos daquele de quem se empenha de corpo e alma.

E como determinar quem estiver interessado e quem não estiver?
Por exemplo, com um teste periódico, semelhante ao que já é exigido por aqueles que solicitam a cidadania na Europa ou nos EUA; ou penalizando aqueles que não costumam votar. Mas a questão não é a maneira pela qual se decide como avaliar os votos: o ponto é o resultado que seria obtido em poucos meses.

O que seria?
Ninguém queria sentir que o seu voto vale menos e haveria um maior compromisso de mais pessoas. E isso seria bom para todos.

Um teste para poder votar! Este é espírito profundamente democrático, sem dúvida. E o que significa “estar informado”? Seguir os debates na televisão? Assistir ao telejornal? Comprar determinados diários? Será que ler Informação Incorrecta pode valer como informação? Vou já candidatar o blog…

Entre as receitas que você indica para ajustar a democracia, há também aquela de votar muito mais raramente do que está a acontecer hoje: eleitores selecionados para eleições mais raras? Não acha que é um paradoxo?
A minha ideia de votar menos frequentemente está ligada ao que eu chamo de “miopia dos políticos” que não conseguem implementar políticas de longo prazo porque são prisioneiros de uma espécie de campanha eleitoral permanente, mais comprometida a sobreviver e ser reeleitos do que governar com eficácia. Um ciclo económico tem quase dez anos; as eleições são a cada quatro ou cinco.

Sigam o raciocínio, s.f.f.: os políticos são míopes porque estão mais concentrados no poder do que no bem estar do País. Solução: limitar a participação democrática dos eleitores.

Entre as suas propostas também está aquela de elevar os honorários dos políticos. No entanto, na Itália, segundo muitos, o problema é exatamente o oposto.
O problema não é quanto os políticos ganham, mas o facto de ganharem dinheiro de qualquer maneira. A ideia é prender as suas compensações aos seus resultados económicos de longo prazo, como acontece em muitas empresas privadas e como acontece em Singapura, onde a remuneração dos ministros é em 40% constituída por bónus ligados aos resultados da economia do País.

Os políticos são míopes? Que ganhem mais. O problema da remuneração dos políticos não é simples e não pode ser resolvido medidas extemporâneas como estas: a ideia de ligar a remuneração aos resultados económicos é simplesmente absurda e subentende que o única tarefa da classe dirigente seja assegurar o crescimento económico. Se esta fosse a principal medida a ter em conta, quem aceitaria governar durante um ciclo económico negativo?

Dambisa Moyo não é parva e sabe isso muito bem. Doutro lado, o seu trabalho não é oferecer soluções mas começar a espalhar determinadas ideias, possivelmente através duma “inócua” revista de inutilidade. Mas há algo que irrita. Dambisa Moyo é uma economista negra, originária da Zâmbia e que migrou para os Estados Unidos. É uma herdeira das vítimas do colonialismo branco, da escravidão, mantidas na ignorância pelos regimes de ocupação. Agora a simpática Dambisa propõe um modelo segregacionista moderno, já não baseado na etnia ou na religião, provando não ter memória e, ao mesmo tempo, que o pior racismo é aquele de classe: não importa se você for negro, gay, islâmico ou vegan, o que interessa é quanto dinheiro está na conta bancária ou quanto estamos dispostos a rastejar ao pé da elite.

 

Ipse dixit.

Fonte: Vanity Fair (edição italiana)