Site icon

Os EUA suportam 73% das ditaduras mundiais

Rich Whitney é um advogado, escritor e político dos Estados Unidos que decidiu fazer uma pesquisa curiosa: pegou no sistema de classificação dos direitos políticos utilizado por Freedom House em 2015 e comparou-o com o fornecimento de assistência militar do governo dos EUA (treino militar, venda de armas, etc.) a nações estrangeiras naquele mesmo ano.

O objectivo declarado de Whitney era determinar se o governo dos EUA realmente luta contra as ditaduras e defende a democracia, como é frequentemente alegado.

A análise descobriu que os EUA fazem exactamente o oposto de quanto afirmado, ao fornecer assistência militar a 36 das 49 ditaduras do mundo. Em outras palavras, mais de 73% das ditaduras mundiais recebem assistência militar dos Estados Unidos. Para a sua análise, Whitney usou uma definição normalmente aceite de ditadura:

Um sistema de governo no qual uma pessoa ou um pequeno grupo possui o poder estatal absoluto, gerindo todas as políticas nacionais e os principais actos, deixando o povo impotente para alterar essas decisões ou substituir aqueles que estão no poder por qualquer método que não seja uma revolução ou um golpe.

O que, de facto, é uma boa descrição dum regime ditatorial.

Whitney escolheu os relatórios anuais da Freedom House, citando-os como a melhor fonte para uma lista abrangente de ditaduras e sociedades “livres”.

A opção de utilizar os dados de Freedom House torna os resultados da análise ainda mais contundentes porque a organização (supostamente independente) é financiada por uma combinação de fontes governamentais ocidentais e de organizações não-governamentais, incluindo a fundação Open Society financiadas por George Soros; pelo que, a categorização dos Países como ditaduras ou como sociedades livres é análoga à forma como o Departamento de Estado dos EUA classifica tais Países. O que significa que o apoio monetário americano a tais ditaduras é um repúdio deliberado e consciente da promoção da democracia no exterior.

Além disso, muitos dos Países rotulados como “ditaduras” pela Freedom House são rivais dos Estados Unidos e, portanto, tendem a ser categorizadas como ditaduras mesmo que não sejam. Por exemplo, tanto o Irão quanto a Síria foram rotuladas de ditaduras, embora o Irão tenha realizado eleições democráticas no início deste ano e o Presidente sírio, Bashar al-Assad, tenha sido reeleito em 2014 com a grande maioria dos votos. A Rússia, o eterno rival dos Estados Unidos, também é considerada uma ditadura de acordo com Freedom House, apesar do facto das eleições decorrerem com regularidade.

Portanto: se esses três Países fossem (justamente) removidos da lista, os EUA apoiariam mais de 78% das ditaduras mundiais.

Além disso, outros Países decididamente antidemocráticas que recebem grandes quantidades de ajuda militar dos EUA não são vistos como ditaduras no relatório da Freedom House e, consequentemente, nem na análise de Whitney. Por exemplo: israel recebe mais de 10 milhões de Dólares em ajuda militar norte-americana todos os dias, apesar do facto de todos os palestinianos que vivem dentro das suas fronteiras serem privados dos direitos e submetidos a condições típicas dum regime militar imposto.

Embora essa análise dos dados tenha revelado o amplo apoio dos EUA a ditaduras em todo o mundo, nada irá mudar no modus operandi de Washington. É claro que o apoio americano aos ditadores não constitui uma novidade: muitos ditadores da época da Guerra Fria, particularmente na América Latina e na Ásia, foram instalados e apoiados pelo governo dos EUA apesar do despotismo, para permitir que os EUA “contivessem” o Comunismo e a influência soviética.

Mas se no tempo da Guerra Fria o lema era “Será mau mas é sempre melhor do que
os comunistas”, agora parece ser “Será mau mas paciência”. E isso apesar
de Washington continuar a defender as suas intervenções como interesse
das Nações Unidas.

Voltando a falar de democracia: no ano passado, Foreign Policy publicou um artigo intitulado “Porque a América é tão má na promoção da democracia nos outros países?”, onde o professor de Harvard Stephen M. Walt observava que a maioria dos esforços na promoção da democracia no estrangeiro termina regularmente num fracasso, com quase um quarto das democracias mundiais que degradaram-se nos últimos 30 anos. O professor Walt culpa a história das confusas intervenções militares dos EUA para justificar o fracasso, mas a suspeita (e este é um eufemismo) é que a razão para essa preocupante tendência não é que a democracia não foi promovida da forma “certa”, mas que não foi promovida de todo.

E a suspeita é reforçada pela análises das notáveis ​​intervenções militares durante as últimas décadas, em particular no Afeganistão, no Iraque e na Líbia: estas foram vendidas ao
público ocidental como nascidas da necessidade de “restaurar” a
democracia, mas os resultados estão à vista.

Resumindo: os Estados Unidos suportam três em cada quatro ditadores do planeta. Um resultado “estranho” este quando alcançado por um País que justifica consistentemente as suas intervenções no estrangeiro para “promover a democracia” e impedir “as ditaduras do mal”.

Ipse dixit.

Fontes: Freedom House, Foreing Policy, MPN News, Medium, If Americans Knew, Congressional Research Service: U.S. Foreign Aid to Israel (ficheiro Pdf, inglês).