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Skills

O grupo de seguros Le Generali (terceiro no planeta) acaba de publicar um relatório acerca do mundo do trabalho, com um olhar especial dedicado ao futuro. Vamos ver quais as principais considerações.

O mundo já não está dividido em “colarinhos azuis” e “colarinhos brancos”, porque a tecnologia de ponta chegará em todos os lugares, desde a fábrica até o mega-banco. O novo termo é New Collar (literalmente “Novo Colarinho”).

O mundo está a digitalizar-se, e as empresas não assumem segundo o esquema tradicional “licenciatura – especialização – treino”. O termo que deve ser lembrado agora é skills. A palavra é inglesa e pode ser traduzida como “habilidades” ou “perícias”. Neste aspecto pouco importa se estes skills forem conseguidas dentro ou fora da universidade: o importante é tê-las e que estejam relacionadas com a Inteligência Artificial (A.I.), Robótica, Machine Learning (aprendizagem automática), Nanotecnologia, impressão 3D, Genética, Biotecnologia, liderança, criatividade.

Então, a licenciatura é completamente relativa, em particular se faltarem a ciência da computação e a matemática. Do ponto de vista das grandes empresas, as skills contam muito mais do que uma pedaço de papel com o carimbo da Faculdade. O estudo cita Ginni Rometty, CEO da IBM:

Para conseguir um emprego na IBM hoje, não precisam de um diploma, o que conta sono as skills do jovem. Nas áreas-chave da segurança cibernética, dados científicos, inteligência artificial e negócios cognitivos, a IBM assume com base nas skills.

Sean Bridges, rapaz de 25 anos, foi contratado pela IBM porque a sua skill era o poder substituir e modificar os componentes dos computadores de forma prodigiosa. Auto-aprendizagem, nada de escolas. E assim conseguiu ocupar o lugar procurado por doutorados.

A importância das skills, mesmo que não alcançada com uma licenciatura, também é confirmada pela Microsoft que investiu 25 milhões de Dólares no programa de descoberta de talentos chamado Skillful, onde propõe aos jovens que entendam que hoje estamos realmente enfrentando “uma mudança tão imensa quanto aquela que aconteceu entre as economias agrícola e industrial”.

A clássica fábrica está a tornar-se cada vez mais AI & Robótica. Uma pesquisa de topo do Fórum Económico Mundial de Davos, que analisou os maiores centros de emprego do mundo, assim reza:

Sem uma força de trabalho urgentemente apetrechada com as skills, os governos enfrentarão altos desempregos e desigualdades, enquanto as empresas perderão consumidores. […] O que os jovens aprendem hoje na universidade já não são suficiente para sobreviver no mercado de trabalho.

O estudo conclui listando as skills essenciais, mesmo que aprendidas fora da academia, e são as mesmas descritas acima.

A consultora global Accenture (a maior empresa de consultoria do mundo, com mais de 319 mil funcionários em 120 Países) diz que as skills realmente são precisas para contrariar “pelo menos em parte” a perda de emprego derivado da alta tecnologia e A.I. Mas não é simples: segundo a Accenture é necessário pelo menos duplicar o ensino de skills entre os jovens para reduzir para metade o risco de despedimento por automação. Segundo o Grupo Manpower, um gigante de recursos humanos, a taxa de reemprego de trabalhadores re-treinados com skills dobrou no último ano.

Então? Então o futuro dum jovem passa inevitavelmente pelo mundo da matemática e da informática. A Universidade de Harvard publicou um estudo do Prof. David Deming, que analisa dados desde 1980, demonstrando que, desde então, os melhores (e mais remunerados) empregos são aqueles nos quais a base fica na Matemática. E não apenas nos EUA mas também na Europa: entre 2000 e 2011, a oferta de emprego cresceu especialmente nos sectores chamados S.T.E.M., com skills relacionadas nos campos da Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática. Estes empregos cresceram na UE em 34%, enquanto todos os outros apenas 8%.

Estamos à beira duma mudança de era: o digital já mudou os nossos hábitos (veja-se o impacto de internet, só como exemplo banal), mas o futuro promete alterações mais profundas. A especialização já tinha enterrado definitivamente a figura do cientista “total” do Renascimento, mas o amanhã vai ainda mais longe; porque também a especialização terá que dobrar-se perante as exigências dum particular tipo de mercado, aquele da alta tecnologia, do digital, da informatização do trabalho, da A.I..

Podemos encolher os ombros e pensar “Tá bom, é sempre trabalho”. Não, não é: há mais em jogo aqui. É uma forma de pensar, é escolher um rumo bem preciso (o científico-matemático) em detrimento de todos os outros. É algo que a escola deverá ter em conta, recalibrando a sua oferta; é algo para o qual as empresas terão que adaptar-se, pena a perda da competitividade; é algo que incide  no futuro de qualquer jovem, independentemente da sua vocação natural. Ninguém estará proibido de tirar um dos poucos cursos de Letras do futuro, o importante será não queixar-se uma vez entrado na lista do desemprego.

É claro que tudo isso incide na sociedade, porque não é “só trabalho”, é uma forma mental. Já agora temos que avaliar com atenção o que a Ciência oficial estabelece (pensamos na Monsanto e nas suas “inócuas” sementes geneticamente modificadas): mas o que acontecerá quando a maior parte da população terá sido formatada segundo um espírito científico acrítico? Quando a vida de biliões de pessoas dependerá directamente das decisões das grandes empresas (corporações) votadas ao hi-tech e dos algoritmos delas?

Resposta: Tech-Gleba.

Ipse dixit.

Fonte: Paolo Barnard