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A carteira de Netanyahu

Benyamin Netanyahu ficou zangado.
Coitadinho.

A razão é a decisão da União europeia de rastrear os produtos israelitas oriundos dos territórios ocupados, quais a Cisjordânia e o Golã: na prática, os territórios fora das fronteiras de 1967. São os territórios ocupados ilegalmente, subtraídos com a força aos Palestinos.

Mas israel vai além disso: não apenas ocupa e envia colonos, como também afasta os donos originários e a seguir explora os recursos. Os produtos assim obtidos são vendidos como made in israel. É o famoso “direito à defesa” tanto proclamado por Tel Avive.

A decisão da União tenciona informar os consumidores europeus com uma rotulagem que identifica toda a cadeia de abastecimento dos produtos assim obtidos, desde o fabricante até o importador e o vendedor ao varejo. Tais produtos ficam excluídos dos benefícios aduaneiros.

É uma boa ideia (até desconfio que não tenha nascido em Bruxelas: é demasiado inteligente) porque atinge os interesses económicos do País ocupante e revela uma prática ilegal: aquela dos bens made in israel obtidos nas terra palestinianas. Mas Netanyahu não apreciou: provavelmente não tem sentido de humor.

Quando a proposta foi aprovada, há algumas semanas, o líder israelita tinha afirmado o seguinte:

A União Europeia deveria ter vergonha: a iniciativa europeia mostra um duplo padrão e apenas contra Israel, em vez que contra as 200 outras disputas ao redor do mundo.

Que podemos traduzir assim: “dado que o mundo está cheio de problemas, nós temos o direito de continuar a fazer o que nos apetece”. Um ponto de vista interessante, por acaso parecido com aquele da Alemanha de 1939. A única diferença é que os nazis pelo menos não utilizavam os problemas do mundo como álibi.

Mas Netanyahu não está interessado nos recursos históricos e continua:

A UE tomou uma decisão em nome do partido que faz ataques terroristas.

Tanto para não confundir as coisas: com a expressão “partido que faz ataques terroristas” Netanyahu fala aqui de Hamas, não do seu próprio partido. Mas o líder de israel aparentemente nem liga a certas coisas:

A economia israelita é forte e pode lidar com isso, aqueles que serão afectados serão os palestinos que trabalham em fábricas israelitas.

Bingo! A medida da União afinal é um boomerang: quem paga são os escravos que trabalham nas empresas dos colonizadores. Pelo menos em teoria. Porque a prática diz que não, dado que ontem Netanyhau voltou à carga: o Ministério israelita da Educação não recomendou as viagens dos estudantes na Europa, excepto para a Polónia, onde vão continuar as visitas de estudo nos campos de concentração nazistas (no Holocausto não se mexe!).

Admitimos: como medida de retaliação não é particularmente assustadora. Também Netanyahu deve ter percebido isso. Pelo que, o líder anunciou também quer pretende “rever” a cooperação com a União: israel continuará a manter “contactos diplomáticos com Países europeus como Alemanha, França e Grã-Bretanha, mas não com as instituições europeias”. A medida interessará sobretudo o papel da Europa no processo de paz entre israel e a Palestina.

Isso sim que é aterrador. Netanyahu ameaça continuar a fazer o que sempre faz: ignorar as contribuições num processo de paz que não existe. Após esta notícia é difícil que os cidadãos europeus consigam dormir à noite.

Como referido, até hoje os produtos dos colonatos em territórios ocupados eram rotulados como sendo made in israel: mas estas trocas comerciais, que em 2014 representaram 154 milhões de Euros, são todas ilegais segundo o direito internacional. O montante envolvido é reduzido, mas o que importa aqui é o sinal. É isso que preocupa israel.

Sabemos que o simpático Netanyahu não é um especialista em direito internacional, sobretudo quando o direito é aquele dos outros: mas a União Europeia limita-se a aplicar medidas em linha com o tal direito. Alguns Países europeus já tinham introduzido autonomamente leis no mesmo sentido (Grã Bretanha, Dinamarca e Bélgica): agora esta regra irá abranger todos os Países da União.

Aos Estados é deixada a escolha se publicar ou menos todo o percurso dos bens (fabricante-importador-varejista), mas a indicação do local de produção (os territórios ocupados) é obrigatória desde hoje.

Uma boa medida, que pode ser incompleta, mas não deixa de ser boa: se queres enerva-los, mexes-lhes na carteira.

Ipse dixit.

Fonte: Il Correire della Sera, La Repubblica