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Hitler, Stalin, Trotskij, Tito, Freud e Lenin

Imaginem uma cidade do passado, na qual vivem ao mesmo tempo as seguintes pessoas:

Teria sido impressionante, não é?
A parte curiosa é que não é um romance: é História. A cidade é Viena e o ano é o 1913.

Adolf Hitler tinha sido rejeitado já duas vezes pela Academia de Belas Artes: era pintor, mas sem grandes dotes.

Josip Broz, o futuro Marechal Tito, ganhava uns trocos na fábrica da Daimler e as meninas bonitas eram o seu passatempo.

Sigmund Freud era um médico já de sucesso.

Stalin chegou da Rússia, fugindo da Okhrana (a polícia
secreta czarista) com um comboio via Cracóvia (Polónia) e um passaporte falso (Stavros Papadopoulos era o nome utilizado); aí encontrou Trotskij, nascido Joseph Vissarionovich
Zhugashvili.

Todos eles viviam não muito longe (no máximo um par de quilómetros) do castelo do Imperador, Francisco José I de Áustria, onde morava também o Arquiduque Francisco Fernando da Áustria-Hungria (que irá morrer no ano seguinte em Saraievo, dando assim início à Primeira Guerra Mundial).

A capital do império multi-étnico Austro-Húngaro era um dos refúgios favoritos dos exilados revolucionários, intelectuais e jovens ambiciosos mas com pouca sorte. Todos participavam frequentavam os cafés do centro, lugares de encontros e de diálogos incansáveis sobre cultura ou política. Freud tinha aberto o escritório em Berggasse e gostava do Café Landtmann; Trotskij e Hitler escolhiam o Café Central. Encontraram-se? Falaram? Sentaram juntos à mesa para saborear um chocolate quente? Nunca será possível responder.

Trotskij encontrou Stalin na estação Norte da cidade. Não sabia quem fosse, só entendeu que o nome grego bem pouco condizia com o aspecto dele:

Estava sentado à mesa quando a porta se abriu e um homem desconhecido entrou. Era pequeno, magro, com a pele marrom-acinzentada coberta de marcas de varíola. Não vi nada nos seus olhos que se assemelha à simpatia.

A guerra estava a uma distância de apenas dois anos de distância, mas no ar ainda havia a esperança que pudesse ser evitada, apesar dos atritos internacionais. Era o fim da Belle Époque, onde tudo parecia possível.

Mas agora deixamos a História e viajamos até a ….Quase História.

Hitler, Lenin e o xadez

Que tal um jogo de xadrez entre Hitler e Lenin? Em Viena, obviamente, na casa duma abastada família hebraica.

Há poucos anos, a família em questão decidiu vender o retrato de autoria de Emma Lowenstramm, no qual é possível observar os dois sentados em volta dum tabuleiro. O ano? 1909.

Um falso? Calma, não é tão simples assim.
O actual dono da imagem tem gasto 30 anos para demonstrar a sua autenticidade. Técnicas forenses, análises da caligrafia, pesquisas históricas, tudo condensado num volume de 300 páginas.

A existência de Emma Lowenstramm está fora de discussão: foi ela que retraiu os dois indivíduos da imagem. Hitler na altura tinha 20 anos, sabemos que se encontrava na capital austríaca e há mais um pormenor: ao eclodir a Segunda Guerra Mundial, o ditador protegeu a família hebraica que o tinha acolhido.

Mais problemático o reconhecimento de Lenin. O russo na altura se encontrava em exílio, vagueava pela Europa, muitas vezes disfarçado: como no caso de Stalin, a polícia
secreta czarista tinha-o debaixo dos olhos por óbvias razões políticas. Lenin viajou muito no Velho Continente, mas não temos prova de que em 1909 se encontrasse em Viena.

O facto de Lenin aparecer com cabelos enquanto desde muito jovem era careca não é um grande problema: tal como Stalin viajava sob nome falso, Lenin (que era bem mais conhecido pelas autoridades russas) também utilizava disfarces para não ser encontrado pela Okhrana.

Mas há um “pormenor” de extremo interesse: na parte de trás da gravura estão presentes as assinaturas de Hitler e de Lenin. E os peritos afirmam que, com 85% de probabilidade, estas são autênticas. Existem cinco gravuras que retraem Hitler e Lenin, mas só uma tem as duas assinaturas.

A historiadora inglesa Helen Rappaport afirma ser esta imagem um “glorioso pedaço de fantasia”: segundo ela, em 1909 Lenin visitou a França, Liège e Bruxelas (Bélgica), não Viena; a capital austriaca teria sido visitada só no ano anterior ou no seguinte. Todavia não comenta as análises da assinatura, o que é curioso.

Fica a dúvida. Todavia, a imagem de Hitler e Lenin que jogam juntos na casa duma importante família hebráica de Viena é muito, muito tentadora…

Ipse dixit. 

Fontes: BBC, The Telegraph