Proposta: dinheiro para os cidadãos – Parte III

E acabamos também a proposta acerca do dinheiro para os cidadãos. E só a escrever isso uma pessoa começa a rir: dinheiro para os cidadãos?

A ideia em si nem seria mal. Aliás, pessoalmente acho ser uma óptima ideia: haveria vantagens para a economia (mais vendas, mais produção), para o cidadão (melhores condições de vida), para o Estado (mais receitas fiscais, por exemplo). Mas há um senão. Melhor: dois. E não são apenas pormenores.

Directamente para as carteiras

Os Quantitative Easing (QE) dos Bancos Centrais passam inexoravelmente pelos bancos privados. Isso é: o Banco Central imprime o dinheiro, logo este é entregue aos bancos privados. Os bancos privados, com o sistema da reserva fracionária, “multiplicam” o dinheiro. Todavia, é possível constatar como na economia real ocidental haja falta de dinheiro. Para onde foi o fruto de todos os QE da Federal Reserve, do BCE, etc.?

Sabemos a resposta: foi para o mundo da Finança, onde rende mais, muito mais do que com os empréstimos aos cidadãos. Mas quem é a Finança? É a área onde operam os mesmos sujeitos que controlam, de facto, os Banco Centrais.

Portanto: inútil esperar um QE para “o povo”. Seria uma contradição.
Para voltar ao paradoxo de Milton Friedman, o dinheiro atirado pelos helicópteros deveria cair directamente nas carteiras de cidadãos e empresas, sem passar pelos bancos privados.

Injectar dinheiro na economia não seria uma “política fiscal desregulamentada”, como afirma o Governador do Banco de Inglaterra, Mark Carney. mas é uma operação fundamental para que a economia possa retomar o funcionamento, tal como afirmou Keynes há 80 anos: a realização das actividades normais duma economia exige uma certa quantidade de dinheiro. Se esta quantidade não estiver presente, a economia entra em sofrimento (como aconteceu na Grande Depressão).

A importância da quantidade certa do dinheiro na economia é fundamental ao ponto que, como também já lembrado, nem a criação de novos postos de trabalho pode resolver o problema. Todavia, qualquer campanha eleitoral vê o problema da ocupação como factor central, enquanto que a falta de dinheiro para empresas e cidadãos ou é omitida ou é explicada com um indefinido “estado de sofrimento” do sector bancário.

É óbvio que ninguém pensa seriamente em atirar dinheiro dum helicóptero. O QE para cidadãos e empresas seria efectuado de forma diferente. Por exemplo, com maciços investimentos em infraestruturas, transportes, educação, saúde, energia, habitações, informatização dos serviços. E cortando taxas e impostos.

Mas permaneceria um outro senão, o segundo.
Qual?

Sempre eles: os juros

A maioria da “oferta de dinheiro” entra em circulação sob-forma de empréstimos bancários. Problemas: os bancos criam o capital, mas não os juros necessários para pagar os empréstimos que concedem, deixando assim um “excesso de dívida” que, por sua vez, requer a criação de mais e mais dívida para preencher a lacuna.

Os juros “drenam” dinheiro da economia real. Quando um cidadão pedir um empréstimo, tem que devolver o capital (criado pelo banco) mas também os juros: estes “saem” do ordenado dele, tal como, no caso das empresas, “saem” dos lucros.

Este círculo pode ser interrompido de forma sustentável apenas com a criação de dinheiro sem juros. Que não é um sonho, mas uma realidade (por exemplo, no sistema bancário do mundo árabe). Todavia, aqui o discurso é complexo: o sistema da usura legalizada é algo intrínseco à nossa economia, ao ponto de ser considerado “facto normal”. Pelo que, nos nosso dias, a questão pode ser não resolvida mas contornada.

Como? Mais uma vez: com o investimento por parte do Estado, recebendo o QE directamente do Banco Central e investindo-o sem intermediários. Não é a solução ideal (o problema dos juros na sociedade permanece) mas, como afirmado, ajudaria a ultrapassar o problema.

Este feito até agora é um discurso viável? Isso é: poderia ser implementado desde já?
Teoricamente sim, na prática não. Na Zona Euro a só ideia provocaria o nascimento duma debate com duração de anos e, em qualquer caso, acabaria com um nada de facto (na Alemanha nem querem ouvir uma coisa destas).

O único País da Zona Euro que poderia avançar com um plano assim seria o Reino Unido, pelo simples facto de não utilizar o Euro e manter o “seu” próprio Banco Central a emitir Libras. Mas também aqui não seria simples: além dos problemas relacionados com o Banco de Inglaterra (sabem de quem é, não sabem?), uma medida como esta entraria em rota de colisão com o resto da Eurozona.  
O diário Telegraph:

Algumas partes-chave do plano concebido pela liderança do Partido Trabalhista poderia cair perante as leis da UE, destinadas a prevenir a inflação. Poderiam atirar o Reino Unido para uma batalha legal de vários anos com o Tribunal de Justiça europeu. […] As propostas do senhor deputado Corbyn podem estar em conflito com o artigo 123 do Tratado de Lisboa, que proíbe os bancos centrais de imprimir dinheiro para financiar os gastos do governo.

Verdade.
A jornalista Ellen Brown, em Counterpounch, escreve:

Mas o BCE já iniciou um programa de QE para a compra de Títulos dos governos. O que são os Títulos dos governos se não Dívida Pública para financiar os gastos dos mesmos governos? Essa regra, portanto, já foi ultrapassada. Porque, então, não ultrapassa-la para que a economia,
as pessoas e as infra-estruturas duma nação possam obter benefícios? A proposta de Corbyn é necessária, vai funcionar… finalmente chegou o tempo para implementá-la!

Coitada, até faz ternura.
Que fique claro: tem toda a razão. Só que não vai pegar, lamento.
Então? Então vamos ver: Jeremy Corbyn ganhou as eleições. Agora é tempo que lute para implementar o que tinha apresentado no programa.
QE para cidadãos incluído.

Ipse dixit.

Relacionados:
Proposta: dinheiro para os cidadãos – Parte I
Proposta: dinheiro para os cidadãos – Parte II

Fontes: Counterpounch, Financial Times, Positive Money, The Telegraph, The Express Tribune, Bank of England (ficheiro Pdf, inglês), Gilad Atzmon

7 Replies to “Proposta: dinheiro para os cidadãos – Parte III”

  1. A questão não é demonizar simplesmente os bancos, mas perceber o quanto existe de simbiose entre eles e os próprios Estados nacionais. São aliados incondicionais de uma lógica de dominação. Eis a origem da impossibilidade de reversão.

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