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TTIP, TTP e TISA

E falamos de tratados segredos.
Segredos por assim dizer.

Como o atento Leitor sabe, circulam pelo mundo fora dois tratados segredos, o TTIP e o TPP.
O primeiro (Transatlantic Trade and Investment Partnership, em bom português “Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento”) é apresentado pela sábia Wikipedia desta forma:

é uma proposta de acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Estados Unidos, em forma de tratado internacional. O tratado visa impedir a interferências dos Estados no comércio entre os países aderentes e está a ser negociado em paralelo com a Parceria Trans-Pacífico ou TPP […]. Estima-se que o acordo deva impulsionar a economia da UE em € 120 biliões, a economia dos EUA em € 90 biliões e a do restante do mundo em € 100 biliões.

Wow, 310 biliões de Euros de ganho! Esta sim que é vida.
Depois temos o TPP (Trans-Pacific Strategic Economic Partnership Agreement, o “Acordo de Parceria Económica Estratégica Trans-Pacífico”), acerca do qual a sábia Wikipedia é mais sintética:

A TPP tem como propósitos declarados incrementar o comércio e os investimentos entre os países parceiros, promovendo a inovação, o desenvolvimento económico e estimulando a criação e a retenção de empregos.

Aqui não há dados, mas o resumo é simples. 310 biliões de Euros dum lado, inovação, desenvolvimento e mais emprego do outro: estamos ricos.

Pensará nesta altura o sagaz Leitor: “Ó Max, desculpa lá: mas como podem ser segredos se já sabemos tudo deles? Batoteiro!”.

Bom, antes de mais é favor um mínimo de respeitinho, ok? E que maneiras são estas?
A seguir: na verdade, os dois tratados são “publicamente segredos”. Confusos? Não, é simples: levante a mão quem conhece os conteúdos destes dois acordos. Ninguém? Pois. O “publicamente segredo” parece um paradoxo, mas não é: sabemos da existência destes dois tratados, sabemos que estão no centro de negociações internacionais, mas ambos navegam na privacidade do vidro e do cimento de algumas instituições.

Por exemplo: no caso da União Europeia (o TTIP), nem os euro-deputados podem saber do que se discute. O pouco que aparece, que é mesmo pouco, encontra-se numa sala onde é possível entrar deixando de fora o telemóvel (nunca se sabe…). Nada de fotocópias de documentos, os relatórios são partilhados entre um grupo muito restrito de pessoas. E os órgãos de comunicação social nunca falam do assunto.

Destes tratados conhecemos os assuntos básicos, mas as modalidades são amplamente desconhecidas.

O TISA

Mas vamos em frente, porque além de TTIP e TTP há outro tratado segredo: o TISA (que na verdade deveria ser escrito “TiSA”: Trade in Services Agreement, “Acordo de Comercio dos Serviços”). Admitam: não conheciam, não é? Tranquilos: nem Wikipedia sabe algo disso.
Só a versão inglesa cita algumas notas:

O acordo visa a liberalização do comércio mundial de serviços, tais como os serviços bancários, a saúde e os transportes.

Muito bem: TTIP, TTP e TISA. O que significa tudo isso? Porque este secretismo todo? Porque as negociações não são públicas? Quais as consequências para nós?

Em algumas (não poucas) páginas da internet é afirmado que estes tratados têm como finalidade estender o poder económico dos Estados Unidos sobre o resto do mundo, ou boa parte dele (fora destes tratados ficaria um punhado de Países e não mais).

Não, não e ainda não. Tentamos não perder de vista os pontos importantes. Os EUA são um mero instrumento, tal como a União Europeia ou os BRICS. Não é a classe política de Washington que decide a criação e a implementação destes tratados: são as grandes corporações, a assim chamada “elite financeira”. Que, lembramos, é supranacional.

O que é tentado com estes tratados é a exportação do modelo norte-americano que, de facto, representa o modelo de maior sucesso do ponto de vista das grandes corporações. Esqueçam os Republicanos, os Democratas, Obama & companhia: estes são todos elementos descartáveis e substituíveis em qualquer altura. Os Estados Unidos são utilizados unicamente pela função de “polícia global” que lhes foi atribuída. O que interessa aqui é a criação dum mercado dominado pelas mesmas regras em todo o mundo. Um mercado onde o poder fique concentrado nas mãos de poucos actores (as grandes corporações) que gozariam assim dum estatuto de “intocáveis”.

Multinacionais, bancos, grande finança: estes são os actores e ao mesmo tempos os realizadores dos tratados. Trata-se de continuar a ofensiva que tem como prioridade acabar com a “Era dos Estados” e iniciar a época do controle incondicional. Ao ponto que falar de “tratados” até é um erro: na realidade, seria mais correcto falar de imposições que, durante os primeiros anos a partir da entrada em vigor deveriam ficar segredas.

O TISA, por exemplo, deverá permanecer em segredo pelo menos nos primeiros cinco anos desde a sua aprovação (viva a Democracia). O TISA abrange todos os aspectos das relações internacionais mais importantes e estratégicas: telecomunicações, comércio electrónico, serviços financeiros, seguros, transportes. São os centros nevrálgicos do controle. Ou seja, o TISA é o selo final da grande operação que visa roubar o que ainda sobra da antiga soberania dos Estados.

Com o TISA e os outros dois tratados, aos Estados vassalos será retirada qualquer possibilidade de controle sobre toda a gama de serviços financeiros, incluindo aqueles relacionados com os derivados CDS (os credit default swaps): a monstruosa dívida planetária poderá assim tornar-se “invisível” e continuas a aumentar sem que o comum cidadão tenha que preocupar-se com isso (pelo menos, até uma bolha explodir).

Os participantes

Quem será parte destes tratados? Como afirmado, os Países são muitos:

Portanto, ficam de fora os BRICS mais Argentina, Irão e Venezuela: o controle
destes Países será actuado através dos sistemas de espionagem mundial da NSA e, em qualquer caso, não podemos esquecer que:

  1. também estes Países operam numa óptica tipicamente capitalista (única excepção: em parte o Irão e a Venezuela)
  2. o principal dos BRICS (a China) está pesadamente ligado às corporações ocidentais, enquanto boa parte do capital privado russo fica nas mãos dum reduzido grupo de sionistas.

Não por acaso, a China desde 2013 tem demonstrado interesse no TTP, com sucessivas negociações entre Pequim e Washington: a futura zona de livre comércio de Shangai pode ser vista como projecto-piloto em vista de futuros acordos (mas o condicional é obrigatório). 

Como curiosidade: e o Dólar? Dito assim, parece que a moeda americana possa sair reforçada pela nova situação que será criada. Talvez. Ou talvez, esta possa ser considerada uma boa ocasião para pôr as bases duma nova moeda supranacional. Mas é óbvio que, neste caso, os tempos seriam bastante mais longos.

Ipse dixit.

Fontes: Wikipedia versão portuguesa: TTIP, TTP, Wikipedia versão inglesa: TISA, Megachip, European Commision, The Hill, The Huffington Post