Apophis, o fim do mundo

O Dia do Juízo se aproxima.

Já são visíveis entre nós as pragas, como aquela do papel higiénico transformado em lixa, enquanto no Céu ecoam as trompas de Eustáquio. Ainda temos alguns tempos, mas não muito: os Quatros Cavaleiros da Apocalipse, Athos, Porthos, Aramis e D’Artagnan, já ultrapassaram a portagem e agora estão em marcha na autoestrada.

A razão? Apophis, o asteroide que irá colidir com o nosso planeta (a Terra, caso haja dúvidas) provocando o fim do Homem e dos campeonatos de futebol. Paciência para o Homem, mas os campeonatos é bastante chato.

Quando? Cedo, muito cedo: o relógio irá parar exactamente no dia 13 de Abril de 2036. Não há como evitá-lo, a hora está indelevelmente marcada. A não ser que o impacto aconteça depois, no dia 12 de Abril de 2068. Ou antes, no dia 13 de Abril de 2029. Eu preferiria o 2068, porque em 2036 seria um Domingo e em 2029 uma Sexta: dois fins de semana estragados.

Mas já que temos de morrer, melhor conhecer o nosso carrasco.
Já disse o nome? Já: Apophis. Lê-se “Apófis”. E o nome diz tudo.

Apep e a Rã

O dia 19 de Junho de 2004 parecia um dia como qualquer outro: chovia, estava o sol, e fazia frio ou se calhar calor. Ok, a verdade é que não me lembro. Mas em Kitty Peak, na Arizona, três astrónomos trabalhavam no observatório nacional: eram os americanos Roy A. Tucker, David J. Tholen e o italiano Fabrizio Bernardi (tem que haver sempre um italiano no meio das desgraças).

Os três repararam num objecto, um asteroide definido provisoriamente como 2004 MN4. Que como nome não era grande coisa. Portanto, passado pouco tempo, os três descobridores escolheram o nome definitivo: 99942 Apophis.

Apophis é o nome grego do inimigo de Rá: Apep, o Descriador, uma serpente que costuma ficar escondida na escuridão eterna do Duat (no meio da Terra) e tenta engolir Rá durante a sua passagem noturna. Rá o Deus do Sol egípcio, não o bicho verde que salta.

Os três não podiam sabe-lo na altura, mas escolheram o nome certo. Bom, o nome mesmo certo teria sido “Morte” ou algo parecido, mas também Apophis não é mal: afinal representa o Mal.

Começaram as medições e as preocupações também.
Apophis não é uma asteroide enorme, mede uns 320 metros mais ou menos. Entre os asteroides que passam por aqui perto, por exemplo, 1036 Gamymende tem um diâmetro de 32 km, 10 vezes mais. Mas o que preocupou após os primeiros cálculos foram as probabilidades que Apophis pudesse colidir com a Terra.

Agora, Apophis não será grande coisa como asteroide, mas não deixa de ser sempre um objecto de 320 metros que impacta com uma velocidade de 45.324 km/h (12,59 quilómetros ao segundo). Não é simpático, sobretudo porque desenvolveria uma potência de 870 megatons (mais ou menos 65.500 vezes a bomba de Hiroshima).

O fim do mundo

O que significa isso? O fim do mundo?
Lamento mas não. Eu sei que o fim da vida do planeta, o regresso do Redentor, as almas culpadas precipitadas para as chamas do Inferno são todas ideias que atraem muitos, mas um Apophis qualquer não seria suficiente. É demasiado pequeno.

870 megatons, como vimos, não são poucos, mas para o fim do mundo seria preciso algo maior, algo mais… espectacular. Afinal merecemos, não é?

No círculo: Apophis!

No nosso planeta já houve explosões bem maiores daquela que poderia ser causada pelo simpático
Apophis. Por exemplo: há 27 milhões de anos atrás, durante a época do Oligoceno, houve a explosão do vulcão La Garita (Colorado, EUA), que libertou uma potência de 250.000 megatons, 287 vezes a potência que poderia desenvolver Apophis.

Foi a maior explosão vulcânica até hoje conhecida. Apesar disso, a Terra não desapareceu e a vida continuou. Se calhar os dinossauros passaram uns maus 15 minutos, mas tudo continuou alegremente (ou quase).

Se desejarmos observar um impacto de tipo espaço-Terra, tal como no caso do Apophis, então temos que espreitar o bólide que formou a Cratera de Chicxulub, na Península do Iucatã (México).

Este evento costuma estar associado à extinção dos dinossauros porque, de facto, aconteceu na mesma altura: 66,038 milhões anos atrás. Pelo que, os impactos com asteroides podem, de facto, provocar extinções em massa. O que é verdade: mas o bólide de Chicxulub tinha um diâmetro de 10 km (segundo outros, entre os quais os cientistas William F. Bottke, David Vokrouhlický e David Nesvorný, o corpo era ainda maior: 60 km).

E o que significa isso? significa que a potência de impacto de Chicxulub foi de 96 teratoneladas. Em comparação, os 870 megatons de Apophis são uma brincadeira de crianças, assim como os 250.000 megatons de La Garita. E, mesmo assim, a Terra não acabou, nem a vida, inclusive os mamíferos (a classe à qual pertencemos e que já existia na altura). Os únicos que não gostaram foram os dinossauros, que não acharam graça nenhuma. Mas sabemos que o sentido de humor nunca foi um ponto forte daqueles bichos.

Quando? Onde? Quem?

Então, tudo está perdido? Não vai haver Dia do Juízo Final? Nem um pequenino?

Calma, pessoal, calma: Apophis não irá destruir a Terra e nem acabar com os humanos, isso é verdade. Mas podemos sempre nos consolar com as dezenas de milhões de mortos e o desastre espalhado numa área de milhares de quilómetros quadrados. Melhor do que nada.

Muito depende do lugar onde o simpático asteroide poderia decidir cair.
Hoje sabemos que existe um “corredor” ao longo do qual Apophis poderia escolher espalhar-se.
O corredor é este (sigam os pontinhos vermelhos!):

Pelo que: sul da Rússia, norte do Pacífico, Nicarágua, Costa Rica, Colômbia e Venezuela. Depois outra vez no Oceano, desta vez o Atlântico, e depois a África do norte; mas aqui já ninguém estaria interessado porque são pobres.

É claro a queda numa zona habitada poderia provocar o morte de dezenas de milhões de pessoas. Mas também a queda num oceano não seria mal, porque os tsunamis levantados arrasariam milhares de quilómetros de costas.

Sobra só uma dúvida: quando? Já falámos de 2029, 2036 e 2068. É tempo de escolher, não é?

Ora bem: numa primeira fase, os cálculos mostravam que existia a probabilidade de 2,7% de Apophis colidir com a Terra em 2029. Mais tarde, os cientistas excluíram esse perigo e também ficou de fora a colisão de 2036.

Pelo que, a nossa última esperança é 2068, sempre que o homem não consiga auto-destruir-se antes. No qual caso, Apophis já não encontraria ninguém e ficaria muito mal.

NEO e Lucros das Desgraças

Para acabar: o mundo da informação alternativa é um lugar bem curioso. De vez em quando toma um assunto assustador (ou alegadamente tal) e começam os delírios. Lembram-se de Nibiru? De Elenin? Apophis faz parte da mesma categoria.

O engraçado é que o nosso planeta está rodeado de objectos maciços que poderiam cair em qualquer altura (mais ou menos). O nome da família é Near Earth Object (NEO) e são muitos: 9644 aqueles descobertos até 2013 e 1.000 são aqueles com dimensões significativas que atingem até 32 quilómetros. Entre os NEO há os PHO (Potentially Hazardous Object), asteroides ou cometas cujas órbitas e dimensões (no mínimo 100/150 metros) representam o perigo para uma potencial colisão com o nosso planeta. Os PHO até agora descobertos são 1629: 1544 asteroides e 85 cometas.
Nada mal.

Outros objectos poderiam cair sem avisar, como no caso de asteroides vindos de grande distâncias e dificilmente observáveis: geralmente reflectem muita pouca luz e ficam visíveis quando já estão muito perto.

Então, por qual razão a informação alternativa não aterroriza todos lembrando diariamente estas espadas de Dâmocles que estão constantemente por cima das nossas cabecinhas? O problema deve estar no nome. Quem ficaria seriamente preocupado com o asteroide Khufu? É um nome demasiado estúpido.

Já Apophis ou Nibiru têm algo de assustador.
E, sobretudo, dão lucros.

Type O Negative: The Profits of Doom



R.I.P. John Silver, uma das poucas pessoas cuja morte realmente chorei.

Ipse dixit.

Fontes: Sputnik (1, 2), Nasa, AstroPt, DeepAstronomy, Phys, Science, Wikipedia (várias páginas em idioma inglês e italiano).

5 Replies to “Apophis, o fim do mundo”

    1. Escrevi John Silver…escrevi John Silver…sinto-me um verme 🙁

      Sério. O que raio me passou pela cabeça?!? John Silver foi o segundo baterista dos Genesis, 1968/1969…há dois grupos que adoro: Genesis e Type O Negative. Fiz 2 erros em um!!!!!

      Agora entendo o haraquiri como forma de defender a honra… 🙁

  1. Com este enredo sem magos negros, dragões e apenas o apophis este filme está fadado ao fracasso.

  2. E vamos nós… Casa grande e senzala. Hipnose e controle mental remoto. Um atoleiro de corpos e almas, tão bem montado e administrado, que a(s) Igreja(s) mandam direto para o infernal labirinto do nada os revoltosos. A católica até aboliu o já desnecessário purgatório… Não está dando lucro. Enquanto isso… O controlador econômico financeiro "CPF" (aqui no Brasil) e todos os outros números de controle, muito em breve em um só chip/cartão. O banco de dados ao "portador". A arma cabal é propriedade do proprietário controlador de todos os chips. O aprimoramento total do controle. Tipo aqueles números que os nazistas tatuavam nos braços dos outros infelizes prisioneiros. Resumindo: "Apophis é o nome grego do inimigo de Rá" – Ninguém desconfia de nada?

    Aquele abraçooooo! Sou grato, sinto muito.

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