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Haiti após o terremoto – Parte I

Às 16:53 do dia 12 de Janeiro de 2012, um terremoto de magnitude 7 investiu Haiti, um dos Países mais pobre do Mundo, provocando, no mínimo, 230.000 mortos.

Particularmente atingida foi a capital, Port-au-Prince: todos os hospitais foram destruídos, a sede do Parlamento, vários Ministérios, escolas, o aeroporto. Uma situação catastrófica.

Após 5 anos, a situação em Haiti ainda não está normalizada. E isso apesar de todas as ajudas internacionais. Aliás: Haiti é a melhor demonstração de como, em muitos casos, as ajudas sejam uma burla. Para onde foram os fundos?

Como qualquer bom neoliberal, também Bill Clinton sabe que não se deve desperdiçar uma crise: então o terremoto de Haiti representou uma boa ocasião. Nos quatro meses seguintes ao terremoto, formou a Comissão Interina para a Reconstrução do Haiti (CIRH), um grupo de empresários e funcionários dos Países da MINUSTAH (a Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti, uma missão de criada pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas em 2004 para restaurar a ordem na ilha, após um período de instabilidade e a deposição do presidente Jean-Bertrand Aristide), que concordaram em fornecer tropas e/ou dinheiro.

Depois de um pouco de “pressão” e “convencimento”, o Parlamento haitiano foi obrigado a declarar o
estado de emergência ao longo de 18 meses, durante os quais Clinton e o seu grupo da CIRH puderam abordar a reconstrução quase sem limites.

Um ano e meio mais tarde, quando o Senado do Haiti constatou que muito pouco tinha sido feito, acusou o CIRH de ser fraudulento e do estado de emergência não foi renovado.

A verdade é que o terremoto de Haiti foi uma oportunidade de negócio e muitas empresas têm aproveitado o desastre. As doações favoreceram as empresas dos Países doadores mais do que os habitantes locais: vários projectos tinham custos excessivos e outros provaram ser desnecessários por causa da crítica falta de infra-estruturas.

Tudo isso não deve surpreender: é bem conhecida e documentada nos círculos dos media independentes que a ajuda internacional é apenas um negócio rentável disfarçado de caridade. Cerca de 80% dos programas de financiamento internacionais dedicados aos Países em desenvolvimento acaba nos cofres das empresas e das organizações não-governamentais (ONGs) dos Países doadores.

Longe de ajudar, essa dinâmica cria uma relação de dependência dificultando ou mesmo impedindo nos Países “beneficiados” o desenvolvimento daquelas estruturas que poderiam livrá-los desses relacionamentos “coloniais”.

Enquanto a maioria das pessoas que trabalham nas organizações humanitárias ocidentais têm boas intenções (e devem ser louvadas), a política ocidental “humanitária” para Países como Haiti muitas vezes é desastrosa: veja-se os infames programas de “ajuste estrutural” do Fundo Monetário Internacional, com foco na privatização maciça e no comércio “livre” que destruíram as economias locais, agricultura e soberania alimentar dos Países onde foram implementadas. Isto é o que aconteceu no Haiti:

Enquanto algumas agências do governo dos EUA afirmam que os seus programas são projectados para reduzir a fome e promover a produção agrícola, outros programas forçaram a abertura do mercado no Haiti, criando milhões de novos consumidores para os produtos agrícolas dos EUA, como arroz, aves, carne de porco e outros, minando assim a produção agrícola local e transformando os hábitos alimentares de Haiti.

Haiti agora importa, pelo menos, 50% da sua comida, especialmente dos Estados Unidos, e tornou-se o segundo maior importador de arroz norte-americano do planeta.

As ONG’s estão a implementar as políticas dos EUA no Haiti em troca de “financiamentos de caridade”, no sentido de que reciclam o dinheiro dos contribuintes americanos e dos doadores para colocá-lo nos cofres delas.

As políticas dos Estados Unidos têm como objectivo destruir a produção e a economia local de Haiti, expropriando os recursos naturais do País, criando um mercado de monopólio subsidiado por Wall Street.

De acordo com o governo dos Estados Unidos, os cinco principais empresários que beneficiaram dos fundos para o Haiti ao longo dos últimos cinco anos foram dos Estados Unidos (dados em Dólares):

  1. Chemonics International Inc., (empresa de desenvolvimento, EUA): 118.961.374 $
  2. Development Alternatives Inc. (empresa de consultoria, EUA): 67.703.366 $
  3. Cce / DFS Inc. (empresa de consultoria, EUA): 20.551.722 $
  4. Tetra Tech Inc. (empresas de consultoria, engenheiros, etc., EUA): 16.294.596 $
  5. Pathfinder International (ONGs, EUA): 16.036.859 $

Os cinco principais beneficiários dos fundos federais para Haiti no mesmo período foram:

  1. Ministério da Saúde (Haiti): 137.751.752 $
  2. Missão de Estabilização das Nações Unidas no Haiti (MINUSTAH): 117.111.216 $
  3. Departamento de gestão das emergências, New York (EUA): 36.912.020 $
  4. Cidade de Miami (EUA): 35.270.000 $
  5. Departamento dos Bombeiros de Miami (EUA): 34.070.000 $

Neste último exemplo, num total de 327.894.170 Dólares de fundos para Haiti, pouco mais de que um terço foi para a ilha, um terço para a missão MINUSTAH e outro terço voltou para os Estados Unidos.

Ipse dixit.

Fontes: na segunda e última parte.