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Os Limites do Crescimento

Depois de quatro décadas após a sua publicação, as previsões de The Limits to Growth (“Os Limites do Crescimento”) são confirmadas por uma nova pesquisa australiana. Os primeiros sinais de colapso planetário podem aparecer muito em breve; ou talvez já tenham aparecido.

The Limits to Growth foi lançado em 1972 e previa o colapso da nossa civilização dentro deste século: uma conclusão que tem sido criticada como uma fantasia desde o dia da sua publicação. Em 2002, o especialista no meio ambiente Bjorn Lomborg entregou o livro para o “caixote do lixo da história”.

Mas os recentes estudos da Universidade de Melbourne relatam que as previsões do livro, 40 anos depois, estavam certas: continuar a seguir o modelo descrito no livro significa, como afirmado, o aparecimento dos primeiros sinais de colapso planetário muito em breve.

A ideia do livro foi do Clube de Roma, as pesquisas tinham sido efectuadas por Donella Meadows, Dennis L. Meadows, Jørgen Randers e William W. Behrens III. Foram consideradas uma série de variáveis (população mundial, industrialização, poluição, produção de alimentos e esgotamento dos recursos) e foi utilizado um novo programa computacional (World3) para simular as consequências da interacção entre o planeta Terra e a sociedade humana.

O livro (que desde Junho de 2013 está disponível sob Creative Commons Attribution mas apenas em língua inglesa) constituía um projecto muito ambicioso: prever nada menos do que o futuro. Mas em 1972 o trabalho estava feito e o resultado não era nada animador.

Em particular, duas as principais conclusões:

  1. se a actual taxa de crescimento da população, industrialização, poluição, produção de alimentos e exploração de recursos continuará sem alterações, os limites do crescimento neste planeta serão alcançados dentro dos próximos cem anos. O resultado mais provável será um declínio súbito e incontrolável da população e da capacidade industrial.
  2. é possível alterar as taxas de crescimento e alcançar uma condição de estabilidade económica e ecológica sustentável no futuro. O estado de equilíbrio global deve ser projectado de modo que as necessidades de cada pessoa na Terra estejam satisfeitas e todos tenham a mesma oportunidade de realizar o seu potencial.

O tempo-limite? Até o ano 2070, mais ou menos. Mas pode ser antes.
O núcleo central do livro, portanto, é que a Terra é um sistema finito, limitado, e um crescimento populacional infinito, um gasto de recursos infinitos, etc. teria inevitavelmente levado até um colapso generalizado  (e o livro nem considera uma eventual crise económica como a actual).

Faz sentido? Faz totalmente sentido. Mas o livro, como vimos, foi alvo de ferozes críticas.
A previsão de que, após o ano de 2000, a humanidade teria iniciado a chocar com o esgotamento dos recursos naturais foi essencialmente rejeitada pela cultura económica internacional, incluindo ilustres prémios Nobel como o economista Amartya Sen, absolutamente convencido de que o desenvolvimento tecnológico teria ultrapassado qualquer escassez.

Apenas poucos analistas continuaram nas décadas seguintes a ter em conta este trabalho de investigação (podemos lembrar Lester Brown).

Em 1992 foi publicada uma primeira actualização, Beyond the Limits (“Além dos limites”), no qual argumentava-se que já tinham sido ultrapassados ​​os limites do planeta.

A segunda actualização, Limits to Growth: The 30-Year Update (Os Limites do Crescimento: a Actualização dos 30 Anos) foi publicado em 2004 e estava focalizado mais na vertente da degradação ambiental; além disso, o sistema de análise era melhorado, tendo sido acrescentada uma maior quantidade de dados e ferramentas computacionais mais modernos.

Basicamente, as actualizações introduziram no estudo dois conceitos que foram estabelecidos somente após a edição de 1972: a necessidade dum desenvolvimento sustentável e a medição do impacto do Homem sobre a Terra através da “pegada ecológica”. Neste aspecto, os dados indicam que a nossa pegada ecológica começou por volta de 1980 a exceder a capacidade da Terra e agora já ultrapassa os limites em 20%.

No ano passado, como afirmado, a Universidade de Melbourne (Austrália) pegou nas conclusões do livro e começou a compara-las com dados de vária origem: ONU (e os seus departamentos de Assuntos Económicos e Sociais, a UNESCO, a Organização para a Alimentação e Agricultura, Estatísticas), Administração dos Estados Unidos sobre os dados oceânicos e atmosféricos, a avaliação estatística da BP e mais ainda.

O resultado é muito preocupante: o nosso mundo real é um lugar bem parecido com aquele descrito em Limits to Growth.

Os gráficos abaixo mostram:
linha subtil = dados reais até a saída do livro
linha espessa = dados reais depois da saída do livro
linha pontilhada = previsões do livro

Clicar para ampliar!

Como explicado em 1972, o crescimento da população e da demanda por bens materiais e riquezas levam necessariamente a um excesso de produção e de poluição. Os gráficos confirmam isto.
Os recursos do planeta estão a ser consumidos rapidamente, a poluição aumenta, a produção industrial e o consumo de alimentos também. O mesmo acontece com a população.

Até o momento, portanto, Limits to Growth corresponde à realidade. E agora?

De acordo com o livro, continuar a aumentar a produção industrial apenas pode aumentar o consumo dos recursos também. No entanto, os recursos vão ficar mais caros enquanto são consumidos; dado que mais capital é investido para extrair os minerais, a produção per capita começa a declinar.

Com aumento da poluição e o declínio do investimento industrial na agricultura, há uma queda na produção de alimentos per capita. Começam os cortes nos serviços como saúde e educação, e isso leva a um aumento da mortalidade. Em seguida, inicia uma diminuição da população (talvez com uma taxa de meio bilião por década). O padrão de vida vai cair para níveis comparáveis ​​aos de início do século XX.

No livro são principalmente os recursos cada vez mais limitados a causar o colapso global, mas também é levado em conta o prejuízo provocado pela poluição.

Paradigma desta situação é a extracção do petróleo: muitos estudiosos estão convencidos de que o petróleo “fácil” (o petróleo extraído de forma convencional) já ultrapassou o limite de produção máxima, e a recente queda dos preços não deve enganar, sendo esta uma manobra meramente política. Sabemos também que as novas técnicas de extracção são mais caras e ecologicamente desastrosas.

Então, um futuro já escrito? Depende.
Ninguém tem a bola de cristal e uma “simples” guerra mundial poderia deitar abaixo todas as previsões. Ninguém pode indicar com certeza absoluta a data dum colapso generalizado da economia ou duma irremediável crise ambiental.

Mas uma coisa é clara: as previsões de Limits to Growth até agora são o espelho da actualidade e isso algo deverá significar. Parece cada vez mais improvável que o crescimento económico possa continuar nos actuais moldes ainda ao longo de muito tempo sem provocar desastres.

Porque um dado não pode ser contestado: a Terra é um sistema finito.
Pelo que: não é possível viver num sistema de consumismo em constante aceleração num mundo que se renova de forma muito mais lenta. Mas não há nenhuma compreensão emocional e talvez seja tarde para convencer o mundo político e a aristocracia do dinheiro a mudar de rumo. Os únicos que podem mudar algo somos nós.

Ipse dixit.

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Fontes: Foreing Policy, ABC – What’s the limit to the planet’s growth?, Oxford Martin School: Are there limits to growth? (vídeo, inglês), The Oil Drum – Cassandra’s curse: how “The Limits to Growth” was demonized, The University of Melbourne – Is Global Collapse Imminent? (ficheiro Pdf, Inglês), The Guardian: Limits to Growth was right. New research shows we’re nearing collapse