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Fukushima: o muro de gelo. EUA: a explosão do WIIP.

O Leitor mais aficionado sabe que, de vez em quando, por aqui vamos espreitar o que se passa em Fukushima, no Japão, onde no ano de 2011 um terramoto e um consequente tsunami provocaram um desastre ambiental de enormes proporções, muito por causa da central nuclear envolvida.

Passa o tempo e cada vez mais parece que tratar de Fukushima seja um pouco como falar dum evento imaginário, algo que aconteceu num planeta distante ou, melhor ainda, numa novela televisiva. Os media ignoram totalmente os desenvolvimentos, o silêncio é sepulcral.

Tudo isso é inaceitável.
Não acreditem no que encontrarão escrito aqui, façam as vossas pesquisas, procurem as vossas fontes, mas vejam o que realmente é Fukushima hoje. Porque Fukushima existe e os seus problemas ainda estão aí, todos, e são problemas nossos, não apenas do Japão; porque pode parecer esquisito, mas a verdade é que a radioactividade não está minimamente interessada em conceitos como “águas territoriais” ou “fronteiras”.

É por isso que as águas radioactivas que deixaram a central agora lambem as costas do continente americano. E água contaminada continua a sair.

Pelo menos três elementos radioactivos extremamente voláteis foram limitados no interior da Unidade 4. O que é uma boa notícia. Depois há outra, um pouco menos boa: três anos depois do 11 de Março de 2011, ainda ninguém sabe exactamente para onde foram os núcleos fundidos das unidades 1, 2 e 3.

 O gelo e o câncer

Entretanto, a descontaminação de toda a área continua a ser muito arriscada, também por causa da infiltração do crime organizado: a libertação de radiação em grandes quantidades torna-se uma possibilidade real a qualquer momento.

É por isso que o crime recruta sem abrigos para as tarefas mais arriscadas em Fukushima: se alguém morrer não haverá famílias a queixar-se.

Além dos núcleos desaparecidos e da libertação de radiações, um dos problemas mais urgentes é a lavagem das águas subterrâneas radioactivas de todo o complexo (sim, as mesmas águas que chegam até América): a Tepco, empresa privada proprietária da central de Fukushima Daiichi, obteve a aprovação (controversa) para construir uma parede de gelo ao redor do reactor bloqueado. Nunca foi construído um muro gelado desta envergadura, e dois anos poderão não ser suficientes para completar a construção.

Há um certo cepticismo generalizado acerca do projecto por pelo menos duas razões:

Os críticos também desconfiam que esta parede possa não ser capaz de proteger eficazmente o local das inundações e estão preocupados também com os graves danos, o tempo perdido e os recursos gastos que poderiam resultar caso a ideia não funcionasse.

Enquanto isso, as crianças das proximidades morrem. A taxa de câncer da tiróide entre os 250.000 jovens da área é 40 vezes maior do que o normal. De acordo com a especialista em saúde Joe Mangano, mais de 46% dos jovens têm nódulos pré-cancerosos e quistos na tiróide e avisa que este é “apenas o começo” de uma trágica epidemia.

Juízes e nuclear

Há, no entanto, uma boa notícia. Quando o terremoto e o subsequente tsunami atingiram Fukushima,todos os reactores nucleares foram desligados.

Até o momento, nenhum deles foi reactivado. Os seis de Fukushima Daiichi nunca serão reactivados assim como, pelo menos, trinta dos reactores mais antigos do Japão que não respeitam as normas de segurança actualmente em vigor: uma realidade que poderia aplicar-se a 60 ou mais reactores que continuam a funcionar nos Estados Unidos.

Para dar impulso ao desejo de reabertura dos reactores, o primeiro-ministro Abe Shinzo tem reformulado a estrutura das agências de controle de todo o País, removendo pelo menos um dos adversários mais críticos, substituindo-o por um defensor da energia nuclear.

havia 54 reactores nucleares comerciais a operar no Japão, mais de 12% do total mundial.
Mas no mês passado, um tribunal japonês rejeitou o pedido para reactivar os dois reactores de Ooi, na prefeitura de Fukui (ambas estruturas modernas). Os juízes têm estabelecido que, com base na incerteza de quando, onde e quanto violento será um próximo (e inevitável) sismo, é impossível garantir que a reactivação dum qualquer reactor no Japão seja segura.

Em outras palavras, nenhum reactor pode ser reaberto sem pôr em perigo o Japão e os tribunais não podem ignorar esta simples realidade: o Japão é uma área com forte risco de sismicidade. Todavia estamos longe de ter alcançado uma segurança qualquer: estas derrotas da industria nuclear japonesa são extremamente raras e não é possível excluir que a decisão seja reavaliada mais tarde.

O segredo e as barras pelo ar

Após o acidente de Fukushima, a população japonesa tornou-se muito mais anti-nuclear, como era fácil prever.

Uma profunda raiva espalhou-se dadas as atitudes grosseiro de Tepco, especialistas e governo; também as modestas compensações pagas às vítimas desiludiram e depois há a elevada preocupação acerca das crianças, forçadas a voltar para áreas altamente contaminadas nas redondezas da central.

Como se tudo isso não fosse suficiente, o Primeiro Ministro decidiu pôr o segredo de Estado em volta do que se passa em Fukushima, limitando grandemente o fluxo de informações, sobretudo aquelas de tipo técnico. E o País tem sido abalado pela revelação de que cerca de 700 trabalhadores fugiram do local de Fukushima Daiichi no auge do incidente, deixando apenas um punhado de funcionários para lidar com a crise, incluindo o director da central, que logo depois morreu de câncer.

Os grandes meios de comunicação ocidentais ignoram o que se passa: Fukushima já parece pertencer ao passado. Mas a quantidade de radioactividade atirada para o ambiente desde Março de 2011 já ultrapassou (em muito) o acidente de Chernobyl e as bombas atómicas de Hiroshima e Nagasaki. E ainda não parou: além das águas contaminadas, há o problemas das barras radioactivas, que não foram recuperadas na totalidade.

As piscinas de refrigeração nas quais as barras encontravam-se alojadas foram varridas pelo tsunami no dia do acidente. Milhares de barras atiradas para o ar. Até Novembro de 2013, a Tokyo Electric Power tinha recuperado apenas a metade delas: há muito trabalho pela frente.

No meio de tudo isso, pelo menos 300 toneladas de água contaminada diariamente derramam no Oceano Pacífico. Centenas de toneladas são descontaminadas no local, mas a TEPCO não consegue dar conta do recado (há enormes dificuldades técnicas), o que explica as 300 toneladas que acabam no mar.

EUA: a explosão do WIPP

Fukushima ensinou alguma coisa?
Acreditam nisso?

Novos estudos da Comissão Reguladora Nuclear dos Estados Unidos salientam os significativos riscos sísmicos que existem para algumas das instalações nucleares comerciais americanas.

Os locais de maior risco são os dois reactores em Indian Point, a norte de New York, que está localizado perto da falha sísmica de Ramapo; e os dois reactores de Diablo Canyon, entre Los Angeles e San Francisco, em contacto directo com Central Valley da Califórnia (onde há a Falha de San Joaquin, paralela à mais conhecida Falha de San Andrea).

E no passado mês de Maio houve o incidente do New Mexico. Uma explosão no Waste Isolation Pilot Project de Carlsbad, condado de Eddy, onde estão armazenadas 70.000 toneladas de material radioactivo, maioritariamente resíduos da industria nuclear. A explosão libertou radiação, que contaminou os moradores locais.

A indústria do nuclear continua a chupar biliões de Dólares, todo dinheiro público. Uma autêntica mina, tanto no Japão quanto nos Estados Unidos, à custa dos contribuintes (que depois ficam também com as radiações se algo correr mal). Se lembrarmos isso, o segredo de Estado de Abe Shinzo e o silêncio dos media começam a fazer todo o sentido.

Ipse dixit.

Fontes: Reuters (1, 2), BBC News (1, 2), Natural Society, RSN, Elizabeth Warren, The Verge, Common Dreams, The Asahi Shimbum, Al Jazeera America,