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Insólito: The Philadelphia Experiment – Parte II

Uma vez entendido os alegados factos, vamos analisar tudo.

E comecemos desde o princípio: a base teórica sobre a qual todo o experimento está construído.

A teoria

Tudo apoia em vagas conexões entre a teoria dos campos unificados de Albert Einstein e os estudos de Nikola Tesla.

De acordo com esta hipótese, a instalação de cabos eléctricos no perímetro do casco dum navio teria criado um campo magnético rotante, parecido com o processo de degauss, desmagnetização. O experimento estaria assim baseado na “teoria dos campos unificados” de Einstein, que assume uma relação recíproca entre as forças da radiação electromagnética e da gravidade, usando para a geração do campo magnético as Bobinas de Tesla.

Ainda de acordo com os defensores desta tese, a invisibilidade é devida ao campo magnético, o que teria dobrado a luz reflectida a partir do objecto, tornando-o invisível.

E aqui encontramos o primeiro problema: Einstein nunca conseguiu uma teoria dos campos unificados. E nem hoje ela existe, permanecendo ainda como o Santo Graal da Ciência moderna.
O obstáculo maior é a força da gravidade, aquela mesma força que, segundo os apoiantes do Experimento de Filadelfia, deveria ter “dobrado a luz”.

Ainda não sabemos ao certo o que é a gravidade: aliás, nos últimos anos surgiram novas teorias, particularmente interessantes, que vêm a gravidade como a expressão secundárias de forças primarias. Ainda nem sabemos a forma como a gravidade actua: os gravitões? São ondas, são partículas ou quê mais?

Einstein não era capaz de responder à estas perguntas, tal como nós não podemos fazê-lo hoje. Falar duma “teoria dos campos unificados” de Einstein nem poderia fazer muito sentido, pois faltava ao génio alemão um dos instrumentos essenciais: a física quântica, para a qual Einstein tinha bem pouca simpatia (“Deus não joga aos dados com o Universo”, afirmou Einstein: e estava errando, pois pelo visto joga mesmo).

O primeiro experimento semelhante foi efectuado só em Outubro de 2006, na Universidade de Duke (EUA), numa escala muito pequena e apenas em relação a certos tipos de microondas electromagnéticas (que, lembramos, não são todas iguais…).

É interessante também realçar como o governo dos Estados Unidos não envolveu directamente Einstein no Projecto Manhattan (o da primeira bomba atómica), na mesma altura, julgando o cientista um risco para a confidencialidade do projecto. Einstein trabalhou ao serviços da Administração americana, mas no âmbito de pesquisas teóricas sobre as explosões.

As testemunhas

Toda a história (e as sucessivas versões) baseiam-se nas afirmações de Jussep e, portanto, nas confidências de Carlos Allende/Carl Allen. Não existem outras testemunhas: nem vale a pena considerar o testemunho de Alfred Bielek, de 1990, tão facilmente foi desmascarado como mitómano.

O porto de Filadélfia em 1947

E aqui encontramos um segundo problema. Se, como afirma a história, todos os intervenientes foram submetidos a lavagem cerebral, como é que apenas Allende/Allen tem nocção do Experimento?

Lembramos que Allende/Allen não era parte da tripulação do US Eldridge, mas dum navio aí perto, o SS Andrew Furuseth. Também a tripulação deste segundo navio foi “lavada” cerebralmente?

Deve ter sido, pois um navio de 135 metros de cumprimento, 7.000 toneladas de deslocamento e 80 membros de tripulação não passa despercebido tão facilmente.

Duas contas: 201 marinheiros e 15 oficiais do USS Eldridge, 80 tripulantes do cargo militar SS Andrew Furuseth, mas uns quantos cientistas (uma dezena? Ok, só uma dezena), total = 306 lavagens cerebrais. Devem ter feitos horas extras para lavar todos aqueles cérebros.

Mas provavelmente não foi suficiente, pois a seguir tiveram que correr até Norflok para lavar “cerebralmente” todos os que tinham visto aparecer e desaparecer o USS Eldridge. Ignoramos quantas pessoas, mas não devem ter sido poucas: é que um navio de 1.600 toneladas dá bastante nas vistas.

Mas, mesmo assim, só um entre as centenas de pessoas conseguiu lembrar-se de alguma coisa.
Esquisito, não é?

Única nota positiva: as lavagens funcionaram mesmo. Em 1999, os antigos tripulantes do USS Eldridge encontraram-se para reviver os bons tempos idos e nenhum deles lembrava-se do Experimento. Ainda bem, deve ter sido uma experiência terrificante… 

O navio

USS Eldridge em 1944

Todos os navios têm um diário de bordo e o USS Eldridge não era uma excepção.

Podemos pensar que os diários foram alterados para esconder o Experimento. Justo. Mas neste caso deveria ter sido alterado o diário de SS Andrew Furuseth também, porque nem um nem outro alguma vez estiveram em Filadelfia.

De facto, o USS Eldridge foi varado no dia 25 de Julho de 1943, enquanto entrou em serviço apenas um mês mais tarde. Lembramos quanto escrito na primeira parte do artigo:

No dia 22 de Julho, o Eldridge ficou quase completamente invisível, após
ter sido rodeado por um misterioso “nevoeiro esverdeado”.

Deve ter sido um navio com poderes sobrenaturais, disso não há dúvida: conseguiu participar num experimento em Filadelfia enquanto em Newark, no New Jersey, acabavam de construi-lo.
Quanto ao SS Andrew Furuseth: nesta página de Wikipedia (que reporta os dados da Marinha Militar) pode ser encontrada a lista das partidas e das chegadas ao longo da vida militar da unidade. No dia 28 de Outubro, dia do Experimento, o SS Andrew Furuseth encontrava-se em navegação com a expedição militar UGS-22, destino Casablanca (Marrocos).
Tudo isso segundo os registos oficiais, óbvio.
Seria possível continuar, pois as incongruências no caso do Experimento de Filadelfia são mais do que muitas. Mas vamos falar dum aspecto mais interessante, não suficientemente realçado pelos adeptos das teorias da conspiração.
A morte de Jessup e o papel da Marinha
A morte de Jessup é misteriosa? Não muito.
Jessup, após o primeiro livro, ficou com a ideia de que teria sido possível viver como escritor, dedicado aos assuntos misteriosos como os UFO e o Experimento de Filadelfia. Infelizmente, os livros seguintes não venderam bem como o primeiro, pelo que os editores recusaram publicar outra sobras.
Abandonado pela esposa, envolvido num acidente de viação do qual recuperou de forma lenta, segundo a versão oficial Jessup ligou um tubo ao escape da própria viatura e enfiou a outra extremidade no interior do habitáculo, morrendo por intoxicação. Doutro lado, os amigos referiram que Jessup estava deprimido, tendo inclusive já falado de suicídio.
A tese do suicídio é também apoiada por uma razão muito simples: eliminar Jessup não teria feito sentido nenhum. Pelo contrário: deveria ter sido premiado pelo serviço prestado. Premiado pela Marinha, entendo.
Reflexão:
  • quem entrou em contacto com Jessup para que visitasse o escritório da Marinha?
  • quem fez que Jessup encontrasse uma cópia do seu livro com as notações?
  • quem deixou que Jessup voltasse tranquilamente para casa com o livro anotado (a cópia em questão não era dele: Jessup era o autor)?

Resposta: a Marinha.

  • o facto de que uma cópia do livro com as anotações de Allende/Allen estivesse num escritório da Marinha não sugere nada? 
Na verdade, Jessup foi um peão utilizado para desqualificar o trabalho dele (lembramos: o primeiro dos seus livros tratava de ufologia, não do Experimento de Filadelfia) e, ao mesmo tempo, de todos os que tratavam deste tipo de assuntos numa época delicada. Qual melhor armadilha dum notícia “espantosa” mas falsa, entregue a um escritor duma certa notoriedade que trata dum assunto incómodo e em plena fase de expansão (a ufologia)?
Jessup publicou o seu primeiro livro (The Case for the UFO) em 1955.
No mesmo período temos:
  • os avistamento de Kenneth Arnold (1947) que deu início à moderna ufologia
  • o Incidente de Roswell (1947)
  • o caso das Bolas De Fogo Verdes (1948)
  • a morte do Capitão Thomas Mantell (1948)
  • as fotografias de McMinnville (1950)
  • as Luzes de Lubbock (1951: um dos casos mais publicitados da ufologia dos EUA)
  • o aparecimento de Ufo nos céus de Washington (1952)
  • o avistamento de Ellsworth, com dezenas de testemunhas (1953)
  • o desaparecimento de Felix Moncla e Robert Wilson (1953)
  • o Encontro de (o melhor: a Batalha de) de Hopkinsville (1955)
Todos casos que fizeram a história da ufogologia nos primeiros anos: a verdade é que as forças armadas americanas não tinham mãos a medir com a situação.

Toda a história do Experimento de Filadélfia é uma exclusiva criação do fantomático Carlos Allende/Carl Allen (pseudónimo atrás do qual escondia-se uma pessoa real que operou de forma obscura ao longo das décadas): não há outros testemunhos, não há uma só evidência.

Jussep apareceu com o seu The Case for the UFO no meio daquela que pode ser considerada como a primeira vaga ufológica dos Estados Unidos. E teve um discreto sucesso.
Provavelmente foi o seu “golpe de azar”.
Notas finais

Ao Experimento de Philadelphia, um dos melhores ufólogos mundiais, Jacques Vallée, dedicou um longo artigo do título significativo: Anatomy Of A Hoax: The Philadelphia Experiment 50 Years Later (“Anatomia duma Burla: o Experimento de Filadélfia 50 anos depois”).

Nele é avançada uma hipótese interessante: a “burla” poderia ter tido como base alguns experimentos que a Marinha Militar de facto conduzia nos anos ’40, nomeadamente o processo de degauss efectuado nos navios. Este processo, inventado por um cientista canadiano na década dos anos ’30, tinha como objectivo tornar “invisível” os navios aos olhos das minas e dos torpedos magnéticos.

O processo de degauss, utiliza as bobinas electromagnéticas e produz descargas eléctricas em forma de coroa. Que, todavia, não matam nem enlouquecem ninguém.

Trata-se dum processo que, melhorado, existe ainda hoje.

Ipse dixit.

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