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IVA e o Crédito Público

Apenas duas linhas muito simples de economia.
A primeira é uma pergunta, que até parece absurda.
O Crédito Público

Como sabemos, nos últimos anos temos assistido à demonização da Dívida Pública. Não há possibilidades: a Dívida é má, ponto final, e tem que ser reduzida ao mínimo, até desaparecer ou quase.

Então eis a pergunta: mas por qual razão nenhum Estado tem um crédito público?

O contrário da Dívida Pública é o Crédito Público. Por exemplo, pegamos num País virtuoso como a Alemanha. Porque em vez que dever dinheiro (esta é a Dívida) não tem créditos?
Porque não tem que receber dinheiro de alguém (e esta seria o Crédito Público)?
Porque em vez de pagar juros sobre a Dívida, não recebe juros sobre o seu crédito?

Pois é simples contar a história de quem alegadamente “viveu acima das suas possibilidades” e criou assim muita Dívida: um pouco mais complicado é explicar porque todos tenham dívida. E ainda menos são os que perguntam como é que um País tão virtuoso como a Alemanha apresenta a Dívida Pública mais elevada de Europa (83.2% já em 2010), oportunamente reduzida só com o auxílio de artifícios orçamentais (não contando as despesas para reformas e obras públicas).

Então como é que ninguém tem Crédito Público? Como é que todos têm Dívida?
Mas esperem um pouco: se for verdade que até os primeiros da classe têm Dívida, não será por acaso que esta Dívida é algo inevitável?

Não é que por acaso o funcionamento do Estado, um Estado qualquer, por sua natureza cria Dívida? Como explicar que ao longo dos séculos todos os Estados têm criado Dívidas Públicas?

Como se farta de repetir o economista Charles Goodhart:

São 300 anos que dizem que a dívida pública é um problema, mas são 300 anos que não é um problema.

Não é que se um País qualquer deseja que haja dinheiro em excesso para os seus cidadãos e empresas deve, necessariamente, dar-lhes mais dinheiro daquele que retira com taxas e impostos? Dito de outra forma: terá que endividar-se e não há outra solução.
E não é que com esta última frase resulta óbvio que a dívida existe em todos os Estados porque é a única maneira de fazer crescer cidadãos, famílias e empresas?

Eis a razão pela qual não existe um País com Crédito Público mas apenas Países com Dívida Pública. Já agora, vamos ver o que acontece num País que pode orgulhar-se de ter um Crédito Público em vez que a odiosa Dívida.

O caso Tretalândia

No País de Tretalândia, o Primeiro Ministro está feliz, porque as contas não mentem: Tretalândia tem um Crédito Público.

Como foi conseguido este sucesso?

Tretalândia: o Concelho dos Ministros

Na verdade, a receita é simples: o Banco de Tretalândia imprimiu 100 Tretadólares, que logo foram distribuídos aos cidadãos com salários e reformas. A seguir, o governo aprovou um regime de taxação segundo o qual o total dos impostos teria de alcançar 120 Tretadoláres: 20 Tretadólares mais de quanto anteriormente distribuído.

E o governo conseguiu: de facto arrecadou 120 Tretadólares com taxas e impostos. Como foi possível? Foi possível porque cidadãos e empresas tiveram que recorrer às poupanças para pagar, contraíram dívidas com os bancos, reduziram os investimentos e as compras: de alguma forma tinham que pagar.

É verdade que agora passam fome, tendo ficado sem um tostão, mas o País tem um Crédito Público! Não apenas isso: mas as caixas do Estado estão cheias e os bancos ganham com os juros: um Paraíso. Ok, se calhar não para os cidadãos, que fazem uma vida negra, mas isso importa até um certo ponto: até a União Idiótica (da qual Tretalândia é Estado Membro) enviou uma mensagem de felicitações.

Assim funcionaria um Estado com Crédito Público. Esta é a razão pela qual a Dívida Pública tem que existir: para que cidadãos, famílias e empresas possam viver decentemente.

Nota final: Charles Goodhart é o economista que desenvolveu a Lei de Goodhart.
Esta assim reza: “Quando uma medida torna-se um objectivo, deixa de ser uma boa medida”.

Nada estúpido o bom Charles.

Os dados misteriosos

A segunda linha de economia também é simples. Até deveria ser considerada retórica, mas dadas as afirmações de alguns políticos, assim não é.

Pergunta: será que aumentar os impostos faz diminuir os consumos?
Por exemplo: num País em coma profundo como Portugal, introduzir novas taxas ou aumentar as que já existem, favorece as receitas do Estado e a economia?

Pessoalmente acho que se esta pergunta fosse feita numa turma do primeiro ciclo, a maioria dos alunos responderia de forma correcta: “Zezinho, se eu te tiro a nota que tens no bolso, vais poder comprar mais ou menos?”.
Isso no primeiro ciclo. Num Ministério das Finanças as coisas funcionam de forma diferente (parece que o governo português prepara-se para adoptar mais medidas duras neste sentido), por isso eis uma tabela bastante explícita.

Os dados apresentados são relativos às receitas do Estado italiano e os valores são em milhões de Euro:

Ohhhhhh…então é assim: ao que parece, tirar dinheiro aos cidadãos significa fazer que os cidadãos gastem menos; isso tem reflexo na economia, que abranda, e nas receitas do Estado, que descem.
Esquematicamente:

  1. aumenta a taxa ou imposto
  2. os consumos diminuem
  3. a procura interna diminui
  4. as receitas fiscais diminuem.

Realmente, esta vida nunca para de surpreender…

Ipse dixit.

Fontes: Paolo Barnard, Vincitori e Vinti