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Entre balas, sofá e gasolina

Como estão as coisas nos Estados Unidos?
Bem, não há dúvida. Alguns problemas, mas nada de realmente grave.

A cidade de Detroit, por exemplo, está perto da falência.
Mas os EUA são assim: há quem siga Chicago e as ideias dos economistas dela, há quem tente sobreviver apesar de ficar numa cidade falida. Pode não ser má uma ideia ver na capital da automóvel a directa consequência da capital do Illinois.

Alguns acreditam que o que se passa em Detroit seja uma antevisão dos tempos vindouros. Esperamos que não, porque esta cidade é em muitos aspectos um pesadelo. E não pode não assustar uma consideração: Detroit está bem perto da falência, mesmo sendo a sede das Big Three: Ford, General Motors e Chrysler.
Num ano em que tais companhias conseguem aumentar as vendas, a cidade afunda, o desemprego dispara, a criminalidade atinge o nível máximo.

“É o mercado”. Lucros privados, perdas socializadas? Não é o mercado, é este mercado.

Detroit está prestes a passar sob o controle do Estado do Michigan. O que também é um desastre do ponto de vista político, bem como um prelúdio para uma vaga de maior violência: enquanto Detroit tem uma população predominantemente de cor (82.7% dos habitantes) e com orientação democrática, o Estado é gerido pela elite branca e republicana.
Não são perspectivas simpáticas.

A população passou de 1 milhão e 800.000 para 750.000 em apenas alguns anos, quase metade dos cidadãos fugiu para procurar melhores oportunidades em outros lugares; a geografia da cidade é agora completamente esquizofrénica, com grandes áreas abandonadas e o centro reduzido a um buraco negro: as bandas de criminais (micro e macro, tanto faz) parecem ditar a lei enquanto a autarquia e a polícia não têm dinheiro nem meios.

Assim os cadáveres são atirados para as ruas.
NBC News:

Da rua, os dois corpos em decomposição eram quase invisíveis, escondidos num aterro sanitário com crescentes pneus usados ​​e um sofá velho. Os adolescentes tinham sido atingidos por uma pistola, despojados de tudo e deixados num terreno baldio.

Estas são apenas as últimas vítimas de um jogo louco cujos restos foram ignorados por dias, escondidos dentro da selva urbana da grande Detroit, uma área deserta raramente visitada por pessoas de fora e não controlada pela polícia.

A notícia é de Agosto, mas as coisas não parecem ter mudado. Aliás, no Verão a ideia da falência ainda ficava um pouco mais afastada.

Houve algumas tentativas desesperadas de criar empregos, mas a situação da dívida é tão grave que impedir qualquer ressurgimento.
Situação da dívida que, naturalmente, é considerada muito mais importante do que uma metrópole que morre, dos cidadãos em perigo constante, duma comunidade dilacerada e abandonada.

Em num clima onde balas perdidas matam os filhos, onde os filhos disparam contra os pais, onde os ladrões de carro matam pessoas de idade, tornou-se impossível até mesmo ir nas bombas e gasolina. O preço do combustível é tão alto que os roubos são contínuos, e contínuas são as agressões contra quem acabou de reabastecer o carro.

As vitimas não são socorridas, ficam feridas a pedir ajuda no meio da estrada.

O Presidente da Câmara, irritado, decidiu emitir um decreto segundo o qual cada estação de serviço é obrigado a ter um vigilante, de dia e de noite.

Facto esquisito: estas são notícias que não aparecem nos telejornais por aqui.
Boa sorte Detroit.

Ipse dixit. 

Fontes: NBCNews, CBS Detroit,Crisis