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Alimentação: a água

É Sábado. E como é tradição no blog há 30 anos, no Sábado falamos de água.

Um dos cavalos de batalha dos movimentos ecologistas sempre foi “bebam a água da vossa torneira”. Que é um pouco como dizer “respirem o ar da vossa zona, que é o melhor”. Também se o Leitor viver ao lado duma fábrica de amianto?

Em boa verdade, a água da torneira é a melhor na maior parte dos casos, mas não sempre. E vamos ver quais as razões.

Directa ou indirecta?

Basicamente existem dois tipos de ligação à rede hídrica: uma na qual a nossa torneira está ligada directamente à rede de distribuição, outra na qual a água é antes despejada num tanque do qual a torneira retira o líquido.

No primeiro caso não existem problemas: a água, antes da distribuição, é recolhida em tanques municipais, tratada e submetida a análises periódicas. Bebam e fiquem felizes.

O segundo caso (comum nos prédios com muitos andares) é mais complexo.
O tanque é construído em materiais idóneos? Cimento, amianto e outros materiais ainda com o tempo têm a natural tendência para “desagregar-se”, libertando partículas que acabam na água.
O tanque é selado ou regularmente higienizado? A água é o natural meio de desenvolvimento para muitos microorganismos, razão pela qual tem que existir uma obra de prevenção.

Saturnismo

O estado das condutas? Os “tubos” não são todos iguais, podem ser constituídos por vários materiais. E os tubos são utilizados para ligar a rede hídrica ou o depósito à nossa torneira.

Um dos problemas mais comuns nesse sentido são os tubos de chumbo, antigamente muito utilizados (uma prática que remonta à antiga Roma). O facto é que o chumbo intoxica: uma exposição prolongada causa uma doença chamada “saturnismo”, cujas consequências são dores abdominais, úlceras orais, constipação, parestesias (tipo formigueiro) de mãos e pés, sensação de gosto metálico. Nos casos mais graves: anemia, disfunção renal, hepatite e encefalopatia, alterações de comportamento, redução no QI, o quociente de inteligência.
Sobretudo tendo em conta este último factor, é provável que tanto o autor como os Leitores deste blog tenham condutas de chumbo: melhor controlar.

Dura ou não dura?

A água não é toda igual. Nasce em lugares diferentes e tem características diferentes. Uma destas é a “dureza” da água, isso é, a propriedade relacionada com a concentração de íons de determinados minerais dissolvidos. A dureza da água é fundamentalmente causada pela presença de sais de Cálcio e Magnésio, eventualmente também Zinco, Estrôncio, Ferro ou Alumínio.

A presença destas componentes é perfeitamente natural, até benéfica: o problema são as proporções.
Para visualizar do que estamos a falar, podemos pensar na máquina lava roupa (ou loiça), da qual a água dura é o grande inimigo, pois com o tempo forma depósitos calcificados. No nosso organismo existe um filtro contra este problema, aliás, dois: os rins. Quanto mais dura for a água, quanto mais trabalho para os rins.
E mais: mais cálcio na nossa dieta, mais absorção a nível intestinal e hipercalciuria. Que depois significa demasiado cálcio em circulação e hiper-actividade dos rins, que nem sempre conseguem dar conta do recado.

Consequências? Imediatas não há. No médio e sobretudo longo prazo: cálculos renais. Que podem ser provocados por múltiplos factores, entre os quais, como vimos, um excesso de cálcio ou outros sais minerais na nossa dieta.

Então, se a nossa água for “dura”, temos que beber água de garrafa? Não necessariamente. Tal como existem remédios para a máquina lava roupa, também existem para nós: são os filtros que podem ser instalados à saída da torneira para retirar a maior parte das componentes minerais. Não custam um exagero e tornam a água dura em “doce”, sem necessidade de adquirir água engarrafada.

Mas como saber o grau de dureza da nossa água?
Existem mapas que podem ser facilmente encontrados na internet. Além disso, muitos municípios publicam os resultados das análises conduzidas na água potável. Em qualquer caso, a local unidade sanitária está preparada para desenvolver testes específicos acerca da dureza da água (são testes muito simples e imediatos, coisas de 60 segundos).

Tanto para ter uma ideia, eis o mapa da dureza da água em Portugal (não encontrei um mapa deste tipo para o Brasil):

E o cloro?

Para desinfectar as águas, e também como forma de profilaxia, é utilizado o cloro, um elemento químico.
O cloro é responsável pelo sabor ligeiramente “químico” da água da torneira. Mas, é dito, é toda saúde, pois previne tudo e mais alguma coisa.
Talvez. Ou talvez não.

Segundo uma recente pesquisa do American College of Allergy, Asthma and Immunology, conduzida tendo em conta milhares de cidadãos, o cloro contido na água aumenta o desenvolvimento das alergias ambientais e alimentares. Os resultados mostrariam (o condicional é obrigatório) que as pessoas com mais diclorofenolo (derivado do cloro) têm 80% mais de possibilidade de desenvolver uma alergia, não apenas de tipo alimentar.

Mesmo assim, as autoridades confirmam: o cloro não faz mal, as quantidades utilizadas são mínimas e, apesar do cloro ser um elemento químico tóxico, as baixas percentagens aportam apenas vantagens.
Por acaso, é o mesmo que sempre foi dito acerca do flúor…

Garrafa???

Muito bem, admitimos que:

  • a água do Leitor seja guardada em tanques cheios de algas e peixes;
  • o chumbo é tanto que o líquido sai directamente preto;
  • a água é tão dura que ao abrir a torneira saem cubos metálicos.

Que fazer nestes casos? Óbvio: beber água engarrafada.
Mas também aqui: a água não é toda igual.

Em primeiro lugar: escolham água produzida perto da vossa casa. É inútil comprar água produzida nas montanhas do Nepal, a água feita no vosso País é igualmente boa ou até melhor. As autoestradas estão cheias de camiões que transportam água para cima e para baixo, tentamos não contribuir.

Segundo: prefiram as garrafas de vidro. Hoje quase desapareceram, mas ainda há.
É afirmado que as garrafas em plástico não constituem um problema para a saúde humana, que o pvc é óptimo para conservar os alimentos. Digam que sim, que efectivamente é assim, que não têm a mínima dúvida acerca disso, e depois comprem uma garrafa de vidro.
Custa um pouco mais? Certeza. Mas aqui falamos de saúde, são alguns cêntimos bem empregues.

Terceiro: escolham água boa.
Como reconhecê-la?

Baixo resíduo fixo
Uma água boa tem que ter um resíduo fixo baixo, menor do que 50 miligramas por litro (mg/l). O resíduo fixo é a quantidade de sais que ficam após ter feito evaporar um litro de água: vêem aquelas coisitas no fundo da panela? É o resíduo fixo, um conjunto de sais minerais. As águas com um baixo resíduo fixo são classificadas como “pouco mineralizadas” e são as melhores.

Baixo valor de sódio.
O sódio é um sal. Uma boa água tem um valor de sódio inferior a 20 mg/l.

Baixo valor de nitratos
Inferior a 25 mg/l.

Baixo nível de sulfatos
Inferior a 50 mg/l.

Acidez
O Ph (que mede a acidez da água) deve estar entre 6,5 e 7,5.

Água bacteriologicamente pura.
Parece uma coisa óbvia.

Algumas excepções:
O Leitor sofre de hipertensão? Beba água com um teor de sódio particularmente baixo.
O Leitor sofre de calcolose renal? Escolha uma água com o mais baixo teor de minerais.
O Leitor tem problemas de digestão? Escolha uma água com mais bicarbonato e/ou fosfato, pois ajudam.
O Leitor tem osteoporose? Mas estão todos doentes os Leitores deste blog? Ok, neste caso é bem alternar uma água pouco mineralizada com uma rica em cálcio.

E a água gaseificada? Evitem, a não ser uma efervescência natural, pois existem águas que são gaseificadas naturalmente, sem adição de dióxido de carbono industrial: mas são águas raras e costumam ser mais caras.

Pensará o Leitor: “Mas isso significa ler as indicações presentes nas etiquetas, aquelas letras pequenas todas?”.
Esperto o Leitor. Doente mas esperto.

Ipse dixit.