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Os Mayas, nós, o tempo

Pronto, após a mudança do fornecedor internet, eis o regresso.
E em que dia é o regresso? No Dia dos Dias, o 21.12.2012!
A propósito: não sei se repararam, mas o mundo não acabou.

Vamos gozar com todos aqueles que esperavam o Armageddon? Nada disso. Já ultrapassamos a impacto de Elenin com Nibiru escondido na cauda, os atentados e a aparição alienígena em Londres, vamos ultrapassar a profecia Maya também.

Aliás, talvez seja uma boa ocasião para falar do que realmente quis transmitir o povo do centro-América.

Imaginemos que os Mayas não estivessem totalmente errados na profecia. Imaginemos que um ciclo termine de facto. Só que o fim dum ciclo pode não ser um episódio repentino e traumático. Pode ser algo lento, com os tempos naturais, algo que não podemos observar por causa da nossa necessidade de espectacularizar: tudo, já e com efeitos especiais.

Dada a avançadíssima idade (a minha bengala, onde fica a minha bengala?), vivi os últimos anos da Guerra Fria, coisa que os mais jovens não conheceram. O ambiente era diferente. Quando tinha nascido, a Guerra Fria já existia, portanto era normal que no mundo houvessem dois blocos, com Americanos dum lado e soviéticos do outro. Isso permitia fazer previsões de curto e médio prazo com a razoável certeza de que o pano de fundo não teria mudado. E não mudava.

Depois, desde a queda do Muro de Berlim, a História começou a acelerar: 9/11, a Zona Neuro, a crise de 2007-2008, até hoje, cada vez mais depressa e, sobretudo, com surpresas. Quem teria imaginado a Primavera Árabe até dois anos atrás? Hoje fazer previsões é complicado: não sabemos o que pode acontecer não nos próximos 10 anos, mas nos próximos 12 meses.

Sabemos que haverá uma guerra, que israel, Irão, China e Estados Unidos estarão envolvidos (os EUA estão sempre envolvidos); mas não sabemos quando. Sabemos também que o nosso sistema económico atingiu os limites: pode não acabar hoje ou amanhã (e não acabará tão depressa), mas o destino parece claro.
Haverá ainda uma Zona Neuro no próximo Natal? A economia encontrará uma retoma?
Responder é impossível, a velha ordem foi de pernas para o ar e uma nova ainda não foi encontrada.

Então não será que afinal os Mayas tinham razão? Nós interpretámos o calendários deles à nossa maneira, que é errada, mas uma mensagem de mudança pode realmente existir tal como a previsão do fim dum ciclo. Sempre segundo os ritmos naturais do tempo.

A fase de “solidificação” do mundo acabou no final do século XIX: um percurso comprido, começado após a queda do Império Romano, que tinha encontrado a máxima expressão com o racionalismo do 1700. Mas com o século sucessivo, o 1900, começou uma nova fase, a fase da dissolução.
Nesta fase não predomina o Materialismo.
Ou melhor: predomina um Materialismo destruidor, enquanto são visíveis os sinais dum novo Espiritualismo.

Existe um ponto a partir do qual o Materialismo já não é suficiente: há uma espécie de viragem, sendo o objectivo final um Neo-espiritualismo. Um regresso nos braços da Igreja? Não, porque a vertente religiosa clássica foi destruída pelo Materialismo: de facto não sabemos qual tipo de Espiritualismo será alcançado. Não apenas isso, mas os sinais são assustadores. Porque existem sinais, de vário tipo, e nem todos tão simpáticos.

Alguns sinais são evidentes. Pensamos, por exemplo, a todas as igrejas para-católicas ou para-cristãs do Brasil, algumas das quais apareceram também em Portugal. Mas pensamos também a alguns símbolos utilizados nos media, sempre os mesmos, repetidos inúmeras vezes.
Por enquanto: sinais, nada mais do que isso. Mas que não podem ser ignorados.

A “travessia do deserto materialista” pode ter chegado ao fim e o Ocidente pode estar pronto para receber algo que possa ter alguns traços espirituais, esotéricos, ocultistas, humanitários e laicos,sem esquecer a vertente psíquica.

Isso é bom ou mal?
Na minha óptica é mal, muito mal. Não pelo facto de abandonar a “velha época”, que não foi boa e pode ser abandonada sem saudade, mas pelo facto da nova parecer até pior. Mas haverá maneira para voltar sobre o assunto.

O que interessa aqui é validar uma impressão: a impressão de que os Mayas possam ter individuado um período de mudança, entendido não como um evento repentino e brutal mas como algo que se desenvolve ao longo de algumas gerações e que implica um profunda mudança de rumo no percurso do Homem. Tal como aconteceu com a escolha materialista antes.

Ficção científica? Paranormal? Nada disso.
A questão fica em volta da nossa visão do tempo, que está em contraste com a visão típica das civilizações mais antigas. Os Mayas, por exemplo, tinham uma visão cíclica, o que ficou reflectido nos calendários deles. Mas não eram os únicos. Aliás, a visão linear do tempo (houve um ontem, há o hoje, haverá um amanhã e serão sempre cosias novas), tal como a nossa, é uma “conquista” recente na história do Homem: a visão predominante na Antiguidade era a ciclicidade.
Se a nossa visão do tempo estiver errada, se a visão dos antigos povos for real, então não há nada de “mágico” na “profecia” Maya (que nesta altura nem “profecia” pode ser definida): é simplesmente um calendário que reflecte o eterno ritmo dos ciclos. Para nós pode ser uma profecia, pois na nossa visão linear do tempo não há espaço para prever os traços gerais do futuro, mas na óptica Maya (e não só deles) de mágico não há nada: assim é a Natureza.

A passagem entre um ciclo e um outro, como afirmado, não implica efeitos especiais, nem sinais no céu. É um processo demorado, vago, onde as datas servem apenas como símbolos e nada mais.

A nova era é um mistério, no sentido que além de alguns sinais não temos directrizes claras e perdemos a memória dos ciclos anteriores. Mas o calendário dos Mayas pode estar certo: simplesmente, não somos capazes de entender o ensinamento deles.

E nisso a História repete-se mais uma vez.

Ipse dixit.

Fontes: Tra Cielo e Terra, René Guenón: Le Règne de la Quantité et les Signes des Temps (ficheiro Pdf, em italiano)