Site icon

Pavlov e a Coluna de Nuvem

O bom Ricardo cita a recente operação que vê israel atacar a Palestina. E o blog deveria escrever algo de inteligente acerca disso, possivelmente notícias inéditas. Mas isso é muito complicado.

Na verdade, a operação Coluna de Nuvem que a exército de Tel Avive iniciou com o míssil contra o carro dum dirigente de Hamas não apresenta grandes novidades: é apenas o novo capítulo da eterna guerra entre Árabes e israelitas.

Todavia podemos observar algumas tímidas diferenças. E não são boas.

Não podemos esquecer que Coluna de Nuvem é a primeira grande operação desde o começo da Primavera Árabe; e esta teve como consequência (do ponto de vista israelita) o desaparecimento (ou os graves problemas) dos actores que tinham tomado parte nos acordos de Camp David, no longínquo 1979: Egipto, Jordânia, Síria, até o pequeno Líbano.

Sobretudo o primeiro, o Egipto, que faz fronteira com a Palestina e que está nas mãos da Irmandade muçulmana próxima de Hamas, desenvolve um papel de extrema importância: não é um mero acaso se mesmo agora, e pela primeira vez, os Árabes deram prova de possuir mísseis capazes de atingir Tel Avive.

Tudo isso significa que as fronteiras de israel estão em plena ebulição, tendo sido alterado o status quo dos últimos 30 anos.

O Estado de israel vive numa situação imprevisível e por isso incerta: os Estados Unidos não tencionam atacar o Irão nos próximos tempos e isso quebra os sonhos duma rápida vitória e uma segura hegemonia regional de Tel Avive. Pelo contrário, os que apoiam Teheran encontram nisso razão para novo fôlego.
As colinas do Golan, local contestado entre israel e a Síria, registam a presença de jihadistas, enquanto em Haleppo ou Homs actuam grupos islâmicos de várias tendências.

Doutro lado, até o regime do Qatar não esconde simpatias pró-Palestina (apesar das razões serem aqui menos claras) e o mesmo se passa com o ex-aliado turco.

Tel Avive fica agora ano centro duma situação particularmente confusa e nestas condições reage como o cão de Pavlov: com um reflexo condicionado, utiliza a força, ataca, tal como sempre fez ao longo da sua história.

Isso permite enviar um sinal para inimigos e aliados: a força permanece intacta, a determinação também. Mas também um sinal para o interior: em breve haverá eleições em israel e a firmeza é o melhor cartão de visita de Netanyhau.

Mas quem atirou a primeira pedra desta vez? israel afirma que a operação é consequência directa dos 750 mísseis disparados por Hamas ao longo do último ano; Hamas afirma que é uma guerra para a libertação do povo palestiniano das infames condições nas quais são obrigados a viver.

Pouco importa: haverá sempre uma razão para justificar os actos de guerra, sejam estes uma retaliação ou uma libertação.

O que temos de realçar é que, mais uma vez, quem paga a factura são os cidadãos, aqueles que dum lado ou de outro vivem com a ameaça dos mísseis.

O que temos de realçar é que israel continua com uma política neo-nazista que obriga os Palestinianos a viver em condições deploráveis e sem a possibilidade de ser adequadamente representados no âmbito internacional (a ONU).

O que temos de realçar é que a escolha de Hamas não paga: lançar mísseis contra israel para provocar uma retaliação e esperar numa hipotética ajuda vinda de não se sabe donde é pura fantasia e só aumenta a tensão e o sofrimento dos Palestiniano.

A única (mas grande) diferença é que desta vez é possível observar algo no horizonte, uma nova hipótese: o equilíbrio está quebrado na região, um equilíbrio terá que ser alcançado outra vez. E isso pode significar só uma coisa em locais onde a voz das armas cala constantemente aquela da diplomacia: uma guerra envolvente velhos e antigos regimes.

Mas engana-se Hamas: não serão os seus mísseis a faísca. A causa será a existência dum israel incapaz de integrar-se na região, um Estado que conhece apenas a linguagem da força e das armas. Por isso, sem uma mudança de paradigma, o destino de israel está marcado: não é “se” mas “quando”. Claro, Tel Avive poderia sempre encontrar um novo rumo, tendo como base o dialogo e o respeito pelos vizinhos. Mas por enquanto não há sinais neste sentido e o desfecho parece marcado.

Não é esta a esperança dum fanático partidário, mas a simples constatação duma realidade histórica: estes “corpos estranhos” acabam sempre por serem rejeitados, é uma reacção “natural”. Podem sobreviver até quando houver apoios externos (os Estados Unidos), uma notável força intrínseca (o exército) e até quando a existência for funcional para determinados projectos, mas sem uma adequada harmonização acabam por ser expulsos, sendo apenas uma questão de tempo.
  
Seja como for, e sem esperar um possível conflito, neste filme há sempre entre os protagonistas o aumento do preço do petróleo. E do lucro dos produtores. Parece um lógico causa-efeito.

Parece. Mas nem sempre o que parece é: o “causa-efeito” bem poderia ser um “efeito-causa”. Esquisito, não é ? Pois é. 
Mas vale a pena pensar nisso.

Ipse dixit.