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A Fabian Society

Muitas vezes foi pedido algo acerca da Sociedade Fabiana.
Então vamos ver o que é isso, ora essa.

A Fabian Society nasceu em Londres, em 1884, e tinha como objectivo elevar a condição das classes trabalhadoras para que fossem capazes de tomar conta dos meios de produção.
Comunismo? Pelo contrário, o Fabianismo recusa o Marxismo e aposta num Socialismo não utópico: a nova sociedade deveria ser alcançada não com um movimento revolucionário mas com um percurso de desenvolvimento, uma verdadeira evolução no sentido socialista.

Obviamente os comunistas sempre viram o Fabianismo como uma desgraça. Dizia Leon Trotsky:

Em toda a história do movimento laburista britânico houve a pressão da burguesia contra o proletariado com a utilização de radicais, intelectuais, igreja, socialistas e owenistas, que recusam a luta de classe, defendem o principio da solidariedade social, rogam a colaboração com a burguesia, enfraquecem politicamente o proletariado.

Todavia, foi mesmo a Fabian Society a conseguir resultados tangíveis. Além de estar na base do actual Partido Laburista, os Fabianistas conseguiram os cuidados de saúde e a instrução gratuitos para todos os cidadãos, normativas especificas acerca das condições de trabalho e leis contra a exploração das crianças. Muitos dos Ministros do Trabalho e políticos do Reino Unido foram também Fabianistas ( Tony Blair, Gordon Brown).

Estes resultado obtidos ao longo do tempo bem ilustram o conceito base do Fabianismo: a ideia de que a transição do Capitalismo para o Socialismo pode ser realizada por meio de pequenas e progressivas reformas, dando início ao Socialismo no contexto duma sociedade capitalista.

Lógico, portanto, que o Estado tenha um papel fundamental segundo os Fabinistas: é o instrumento com o qual podem ser implementadas aquelas reformas que irão permitir a transição para uma sociedade socialista. Contrariamente aos marxistas, segundo os quais o Estado é apenas um instrumento nas mãos do capital, na concepção fabiana deve ser usado para promover o bem-estar social.

Fabianistas famosos foram George Bernard Shaw (dramaturgo), H. G. Wells (escritor), Annie Besant (activista), Graham Wallas (psicologo), Hubert Bland (socialista e fundador da Fabian Society), Edith Nesbit (escritora, fundadora), Oliver Lodge (físico), Leonard Woolf (politico), Virginia Woolf (escritora), Ramsay MacDonald (politico), Bertrand Russell (filosofo).

A Fabian Society ainda existe? Sim, ainda existe, apesar de ter escolhido não envolver-se directamente no mundo da política. Funciona mais como think tank, um centro de “pensamento” e troca de ideias.
E muitos vêm na Fabian Society uma tentativa (outra?) para implementar uma Nova Ordem Mundial.

Isso porque alguns entre os “fabianos” de facto manifestaram a aspiração de um Estado mundial de tipo tecnocrático, cujo berço deveria ser o Império Britânico (ou o que sobrar dele), com a função de planear e administrar os recursos humanos e materiais do planeta. O facto dalguns fabianos serem também membros de círculos “mundialistas” anglo-saxónicos, como o Royal Institute of Internacional Affais e o Council on Foreign Relations, aumenta as suspeitas.

De seguida, o editorial publicado no Farol da Democracia Representativa (já o nome é preocupante) no Março do ano passado, acerca do alegado fabianismo dos Estados Unidos:

A preocupação do nacionalismo conservador americano, conduzida pelas associações civis que compõem o “Tea Party” inspira o partido republicano a repensar o seu programa e seus valores e impõe seguidas perdas de posição aos democratas, deixando claro que sua maior “liability” é o próprio homem que elegeram, além, claro, da desmistificação das promessas de um mundo melhor com o suporte governamental.

O americano médio não é dado a discussões políticas, mas percebe o valor de suas conquistas cívicas, como a imutabilidade de sua Constituição e seu dever de protegê-la para manutenção da ordem nacional. Prefere trabalhar para gerar riqueza e pagar os seus tributos, como partícipe do sistema capitalista em que se desenvolve, e acredita que uma república democrática seja o sistema político mais adequado à realização de seus projetos como cidadão americano.

O Sr. Obama representa os interesses do fabianismo que corroboram com os das elites globalistas, consubstanciados ao seu lado pela sra. Clinton, tradicional quadro do socialismo fabiano. Já assistimos a este filme aqui em nosso país: assistencialismo, aumento exagerado das despesas governamentais, desprezo pelas limitações constitucionais do governo em detrimento da defesa dos direitos do cidadão. Só que lá, isso desagrada, enquanto aqui, a tolerância moral e a corrupção conivente acolhem e reelegem.

As palavras do discurso poderão fazer mais mal no médio prazo do que o impacto negativo que causaram no imediato. Poderão, por exemplo, ser usadas para a Comissão da Verdade e tantas outras matérias que, ao invés de apaziguadas e resolvidas, permanecem incubadas pela sanha vingativa de falsos heróis da pátria. Sob este ângulo, o papel desempenhado pelo Sr. Obama veste, sob medida, os interesses revolucionários socialistas no Brasil.

A mentalidade revolucionária, operando ininterruptamente, tem nos imposto perdas profundas de valores caros à manutenção de uma sociedade democrática e livre. Vivemos um processo revolucionário permanente cuja reversão só se vislumbra com uma reação determinada, capaz de acordar a sociedade do torpor em que se encontra e extirpar o mal alojado em seus vários segmentos.

Os que se decepcionaram com o discurso talvez ainda não estivessem preparados para escutar da boca de um presidente americano um texto escrito em conjunto com os intelectuais orgânicos do partido hegemónico no Brasil, socialistas que são com as mesmas intenções internacionalistas.

Os que já o esperavam, confirmaram com tristeza a degradação moral a que é levado um ser humano, a trair uma pátria inteira em seus ideais, seus valores e as tradições legadas pelos Founding Fathers, sujeitando-se a fazer coro com a escória da política mundial em troca de só o diabo sabe o quê.

Tudo isso para dizer que a Administração de Obama seria uma emanação da Fabian Society.
Tudo muito engraçado, não fosse um pormenor: na Europa, berço do Fabianismo, assistimos a factos que vão na direcção oposta, atropelando alegremente os ideais fabianos.

Privatizações selvagens, cortes nos serviços sociais, cortes nos salários, piores condições de trabalho, Estados cada vez mais “leves”: exactamente o contrário do que sempre defendeu a Fabian Society.
Mais: jogando com a especulação, seria até mais fácil ver em tudo isso uma manobra marxista para o despoletar uma revolução (violenta) das classes trabalhadoras.

A ideia segundo a qual tudo faz parte dum plano para implementar a Nove Ordem Mundial é tese conhecida: mas neste caso é importante realçar como isso constituiria a antítese de tudo o que foi defendido e actuado ao longo do tempo pela Fabian Society: nada de “pequenos passos”, nada de “pequenas melhorias”, nada de transicção, mas uma manobra para entregar o poder a uma elite que possa governar o mundo. Desaparece, portanto, a ideia da classe trabalhadora dona dos meios de produção, desaparece a base da Fabian Society.

Possível? Neste mundo tudo é possível, e é também possível admitir que as novas gerações da Fabian Society conseguiram inverter os ideais primordiais do movimento para aproximar-se ao conceito da Nova Ordem Mundial. Mas neste caso seria preciso realçar como a Fabian Society contemporânea nada tenha a ver com a original, cujas bases teóricas já citámos acima. Ou pensar que desde o início a Fabian Society foi uma manobra para aproximar elementos da Esquerda à tese mundialista.

Temos portanto a visão clássica de quem apoia a teoria da NWO: um mundo a preto e branco, com os maus dum lado (os mundialistas) e as vítimas do outro (todos os outros). Eu sou casmurro e continuo a ver mais cores; sobretudo, continuo a ver uma história antiga quanto o mundo. E esta NWO parece-me cada vez mais uma mala extra-large na qual é possível enfiar tudo e mais alguma coisa. Mas esta é uma opinião pessoal.

Prenda para os Leitores do Brasil. Encontrei o excerto dum livro (“Cadernos da Liberdade”,
autoria: Gen. Sérgio Augosto de Avellar Coutinho) que fala do fabianismo no Brasil. É cumprido e já deu-me sono, mas se alguém estiver interessado pode ler à vontade:  

O Fabianismo no Brasil

O Fabianismo chegou ao Brasil com Fernando Henrique Cardoso, retornando ao país, depois de seu asilo político na Europa, com seus companheiros do chamado grupo de São Paulo, todos ex-militantes da Ação Popular Marxista-Leninista.
Asilado na Europa, depois de ter passado pelo Chile, Fernando Henrique Cardoso reformulou suas crenças marxistas e passou a pretender filiação junto à Internacional Socialista (oriunda da II Internacional).
A iniciativa coincidia com o esforço de Leonel Brizola em 1978/79, ainda asilado, para juntar-se à Internacional Socialista na Europa. Com ousadia e persistência, aproximou-se dos expoentes socialistas europeus, particularmente de Mário Soares, do qual conquistou o apoio e a amizade. Miguel Arrais e Fernando Henrique tudo fizeram para neutralizar o ex-governador, inclusive com a elaboração de um dossiê depreciativo que FHC entregou a Mário Soares. Nada adiantou; na reunião da Internacional Socialista em Viena (1979), a organização, por unanimidade, fez opção por Brizola. “… na platéia, derrotados, Fernando Henrique Cardoso e Miguel Arrais assistem ao vitorioso, discursando na condição de líder brasileiro da social-democracia e representante oficial da organização no Brasil” (Luiz Mir, A Revolução Impossível, pág 689 a 691).
O insucesso levou Fernando Henrique a se aproximar do movimento fabianista. Em 1982, participou da reunião de fundação do Diálogo Interamericano com sede nos EUA.
Ao retornar do seu auto-exílio em 1979, Fernando Henrique Cardoso e os seus correliigionários do grupo paulista ingressaram no partido do Movimento Democrático Brasileiro onde, com outros anistiados de esquerda constituíram a ala dos “autênticos”. Participaram da Constituinte de 1987/88 onde o grupo de FHC desempenhou ativo papel na tentativa de implantar o socialismo e o parlamentarismo no Brasil.
Na Constituinte, é interessante notar a convergência das esquerdas reformistas e revolucionárias, todas procurando ampliar ao máximo as franquias democráticas.
Logo após a Constituinte (1988), o grupo de Fernando Henrique e diversos outros “autênticos” divergiram e saíram do partido, fundando o PSDB, Partido da Social Democracia Brasileira. Estava assim criada a organização política do fabianismo no Brasil.
Em 1992, o Senador Fernando Henrique participou da reunião do Diálogo Interamericano de Princeton, para a qual convidou Luiz Inácio Lula da Silva e alguns outros membros do Partido dos Trabalhadores. Para o Diálogo, o desaparecimento da União Soviética tinha deixado as esquerdas revolucionárias da América Latina sem base de apoio. Entretanto, reconhecia que sua organização e capacidade de mobilização ainda poderiam ser úteis para o programa pretendido pela entidade. Podemos aduzir que o PT, como partido laborista, tivesse muita afinidade com o fabianismo, daí porque estava sendo atraído. O primeiro ponto de uma ação comum foi a opção pela via eleitoral, buscando-se o abandono da violência armada. Lula já comprometido com o Foro de São Paulo, concordou com o programa mas não se filiou ao Diálogo.
Em 1994, FHC se elegeu Presidente da República. Na condução política da sua administração e nas relações com o Congresso, onde não tinha maioria, usou o poder e certos recursos autoritários. Valeu-se descontraidamente das Medidas Provisórias fugindo das resistências parlamentares. Sem muito esforço, mas com uma eficiente e convincente negociação individual com os parlamentares, conseguiu emenda à Constituição, quebrando a antiga e prudente tradição republicana que não permitia a reeleição do Presidente da República.
Para assegurar o segundo mandato, Fernando Henrique tratou de manter a estabilidade monetária e o Plano Real que já lhe havia garantido a eleição de 1994.
Para pagar dívidas públicas, o serviço desta dívida e remunerar investimentos financeiros, foi buscar recursos num vasto e discutível programa de privatizações.
A esquerda de oposição lhe fez e faz ferina crítica, estigmatizando-o de “neo-liberal”, não tão grande ofensa para um socialista Fabiano.
Com relação às recomendações do Diálogo Interamericano, expressas no Projeto Democracia, podem ser citadas as seguintes realizações de Fernando Henrique Cardoso:
1) Abertura democrática, com franquias, ampliadas e garantidas na Constituinte, com o trabalho de FHC nas comissões e de Mário Covas no Plenário.
2) Acolhimento dos comunistas, primeiro no Partido, depois nos cargos de governo e, finalmente, com indenizações das famílias de terroristas mortos pela “repressão”, de início limitadas às dos que morreram nas prisões e agora generalizadamente.
3) Afastamento sumário do serviço público ou veto de nomeação de qualquer pessoa acusada de torturador ou de ter pertencido a órgãos de segurança durante o governo dos militares presidentes. A demissão ou veto era imediato, sem qualquer apuração formal ou de provas das acusações, num ato ilegal de restrição à Lei de Anistia.
4) Submissão das Forças Armadas ao controle político civil, com a criação do Ministério da Defesa, afastando os militares de participação e influência nas decisões nacionais, inclusive nos assuntos de segurança. Foi aventada também a criação de uma Guarda Nacional para retirar do Exército ou restringir a sua destinação constitucional de defesa da lei, da ordem e dos poderes constituídos. Não dispondo de recursos para tal projeto, a iniciativa ficou limitada à criação de um segmento fardado da Polícia Federal, subordinada ao Ministério da Justiça.
5) Uso e suporte às Organizações Não-Governamentais de inspiração e de ligação a entidades internacionais fabianas e outras, com transferência de funções públicas e de recursos governamentais, particularmente nas áreas de educação, saúde, segurança pública, meio-ambiente, direitos humanos e complementação social. Foi promovida uma “ampliação do Estado” que daria inveja a um projeto concebido por Antônio Gramsci.
Fernando Henrique é seguidor dos conceitos da Terceira Via participando das idéias de um “consenso internacional de centro-esquerda”, acompanhando a posição de Anthony Giddens (teórico da Terceira Via), Tony Blair (líder trabalhista inglês), Lionel Jospin, Bill Clinton, De La Rua e Schöreder.
O governo FHC (1994-2002) deixou ao País com gravíssimos problemas sociais e econômicos pouco tendo feito para a realização da transição para o socialismo. As lentas e progressivas transformações são próprias do processo reformista Fabiano. Portanto, não se fale de fracasso, porque a semente desta vertente social-democrática está plantada e aparentemente, superou no País, a linha da Internacional Socialista representada pelo decadente Partido Democrático Trabalhista de Leonel Brizola.
Por outro lado, o movimento fabianista pôde e pode realizar, em determinados momentos, um papel subsidiário da esquerda revolucionária. Muitos aspectos da concepção pragmática do fabianismo coincidem com certos processos gramscistas de mudanças pacíficas e progressivas para conquistar a sociedade civil e enfraquecer a sociedade política. Depois de 1980, os dois fatos novos mais significativos ocorridos nas esquerdas no Brasil foram as presenças do fabianismo reformista e do gramscismo revolucionário.
Terminado seu governo, Fernando Henrique Cardoso agora é “homem do mundo”, promovido e “badalado” pelos movimentos e organismos da esquerda internacional. Lembro um pouco Bernad Shaw, um dos fundadores do fabianismo na Inglaterra, marxista reformado que se transformou em socialista reformista. A diferença fica na retórica vazia e na produção literária reduzida do intelectual brasileiro.
Apesar de tudo, FHC voltará; pessoalmente ou representado, mas voltará.

Ipse dixit.

Fontes: Farol da Democracia Representativa, Mujahdin Cucaracha, Wikipedia (versão inglesa)