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Finalmente: mais transparência!

A notícia económica da semana é sem dúvida o resgate da Espanha. Ou melhor: dos bancos espanhóis. Ou melhor ainda: dos bancos americanos e europeus.

A Espanha “faliu” tal como Grécia, Irlanda e Portugal? Não é bem assim, há algumas diferenças. Vamos ver quais.

Mais uma vez estamos perante aquela que os diários nestes dias chamam de “bolha imobiliária”, o que em parte é verdade. Mas só em parte: as razões têm que ser procuradas em operações de risco elevado, com perdas bilionárias.
Como exemplo “mediático”, podemos lembrar os empréstimos milionários que os bancos concederam às equipas de futebol (Real Madrid, Barcelona) para a aquisição de futebolistas. Aquisições que também foram utilizadas como garantias para operações financeiras.

Outras explicações presentes nos media falam de “ataques internacionais contra o Euro”e da péssima situação económica do País como causa primária: neste caso é explicado que a crise e o elevado desemprego impedem que quem contraiu um empréstimo possa agora devolvê-lo.

Também neste caso estamos perante uma “meia verdade”, pois não seria mal procurar os motivos que levaram os bancos a aplicar uma concessão maciça de créditos sem ter adequadas garantias ou sem ter em conta o panorama económico não apenas internacional.

Mas esta última explicação tem o mérito de convencer o cidadão de que afinal a culpa é de todos e justifica uma medida inédita: contrariamente aos casos de Grécia ou de Portugal, a “ajuda” desta vez não será entregue ao Estado espanhol mas directamente aos bancos. 100 biliões de Euros directamente para os cofres das instituições bancárias.

Assim é tudo muito mais claro e pode ser esquematizado na seguinte forma:

  1. o governo espanhol aumenta a própria dívida para salvar os bancos nacionais;
  2. a operação não resulta, portanto fica com a dívida e observa mais dinheiro que entra em Espanha para acabar direitinho nos cofres dos bancos;
  3. agora são todos os cidadãos da União Europeia que pagam com o próprio dinheiro os buracos bancários espanhóis, com a socialização das dívidas privadas.

Olé.
Doutro lado, já sabemos quais as alternativas apresentadas: a apocalipse do sistema bancário espanhol,  o efeito dominó que arrasta toda a finança europeia, o fim do Euro e, possivelmente, da vida no planeta.

Dúvida: mas a “ajuda” é dada assim, sem nada em troca?
Não, claro que são previstas algumas garantias. São as letras pequenas que podemos encontrar em qualquer contrato. Afinal não é uma ajuda da Cruz Vermelha.

Em Espanha já se fala de: subida do IVA, aplicação do IVA normal onde até agora vigorava o IVA reduzido, redução de funcionários da função pública, aumento da idade da reforma, leve revisão em baixa das mesmas reformas, 10 mil milhões de poupança nos sectores da saúde e da educação.

Uma última nota acerca de quanto observado em abertura: esta é uma ajuda não exclusiva para os bancos espanhóis mas americanos e europeus também. Falar de “bancos espanhóis” hoje não faz muito sentido, pois as instituições financeiras são um emaranhado de interesses supra-nacionais.

Caixa-Bank, por exemplo, tem participações na Erste Bank (Áustria), Inbursa (México), Bank of East Asia (Hong Kong), BPI (Portugal), Boursorama (França).

E, por sua vez, os bancos podem não ser inteiramente espanhóis, como no caso do Banco Popular Espanhol, entre cujos accionistas encontramos o Grupo Alianz (Alemanha), o Grupo Américo Amorim (Portugal), Crédit Mutuel (França), Silchester International Investors (EUA).

Isso para não falar das instituições bancárias internacionais que detêm parte da dívida espanhola e que ficariam pesadamente envolvidos em caso de maiores problemas dos hermanos

Como vimos, nada de novo no horizonte: a prioridade da Zona NEuro continua a ser a salvaguarda do capital privado dos grandes grupos, a protecção descarada dos mesmos responsáveis e instrumentos financeiros que criaram a actual situação de crise.

Não há um plano de apoio para os desempregados de Espanha, onde cerca de um quarto da população não tem trabalho, porque isso simplesmente não interessa: a base teórica em Bruxelas, como em outras partes do mundo, é aquela pela qual a riqueza deriva unicamente do funcionamento das instituições financeiras e das operações destas, que têm a prioridade absoluta, ficando a economia real apenas como “lógica”, embora nunca certa, consequência.

A única novidade é que agora as Mentes Pensantes nem actuam com a pantomina do “resgate para o País”: agora o dinheiro é retirado dos bolsos dos cidadãos e entregue directamente aos bancos. Temos que ver os aspectos positivos: ganhámos em transparência.

Ipse dixit.