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O Grupo dos Trinta – Parte I

Um prefácio? Até tinha escrito um.

Depois pensei: “Tempo perdido. Publica e nada mais”.
Sim, acho que é isso. Não quero gastar o tempo dos Leitores e o meu também.

Enquanto deixamos que a nossa vida seja vendida como uma mercadoria qualquer, preferimos preencher o vazio com lobisomens, aventais, caveiras, antigos rituais ou beber da Fonte da Santa Ignorância, a televisão.

Aqui há uma conspiração, mas nada de alienígenas, vampiros ou Bicho-papão. É uma das conspirações nos moldes das leis. As mais aborrecidas e as únicas que resultam.

O que tinha escrito? “É preciso estudar”? Sim, sim, tá bom… No dia seguinte aparece um link para ver uma menina nua que dança numa festa maçónica.
Quem quer entender que entenda. E paciência.

Derivativos

O resultado dos Derivativos , que são produtos financeiros inteiramente compreensíveis para pouco mais de 200 pessoas em todo o mundo, é a crise financeira de 2007-2012. Foi uma brincadeirinha começada no escritório da AIG de Joseph Cassano em Londres, para iniciar um colapso global.

Não que tudo tenha sido culpa da AIG, porque antes já tinha nascido a bolha dos Derivativos dos subprime nos Estados Unidos, a bolha imobiliária, os criminosos Mers, os Servicers e os Derivativos tipo Frankestein (uma criação de Wall Street) que em breve acabaram por infectar todo o mercado financeiro e os bancos. A partir dai foi (e ainda é) possível começar o mantra do “controle orçamental”, da “austeridade”, o pesadelo da “Dívida Pública”.

De facto: esvaziar os Estados para torna-los impotentes.

Breve parênteses.
Tenho uma certa admiração acerca de quem inventou o esquema: foi possível criar algo com o qual apresentar ao povo-boi dados que “demonstram” como um excesso de despesa foi mortal pelas finanças dos vários Países.

Admiração? Sim, mesmo isso, dito sem ironia. Meus amigos, temos de reconhecer que foi e ainda é uma obra prima: é preciso saber pegar na arma que fica nas mãos dos cidadãos e torna-la numa arma contra os cidadãos. Cérebros finos, disso não há dúvidas.

E o resultado é que as pessoas, nas ruas, hoje falam da dívida pública como do pecado mortal dos anteriores políticos. Doutro lado, uma eventual tomada de consciência na internet é mantida sob controle com notícias estúpidas, sem sentido, até ridículas. Assim, nas ruas é maldita a salvação da sociedade enquanto no mundo informático é apontado o Bicho-papão.

Genial.
Mas fechamos a parênteses.

Os Derivativos são armas de destruição de massa, e “massa” é a palavra certa uma vez que estes activos-Frankenstein percorrem o planeta sem nenhum controle ou regulação para um valor total que assusta qualquer calculadora portátil.

Em 1994 o alarme tocou, com a Merrill Lynch que fez desaparecer 1,5 biliões de activos em Orange County (EUA), mas ninguém ligou e os activos continuaram a percorrer alegremente o planeta todo, até ocupar qualquer instituição bancária. Ainda hoje, os contratos OTC (Over the Counter, sempre produtos Derivativos) são livremente usados para destruir, como bem sabe o criminoso John Paulson.

Usando os Derivativos , um punhado de especuladores pode tranquilamente afundar um Estado soberano do G8, empurrá-lo até à beira da falência com consequências horríveis que têm o nome de desemprego, subemprego, suicídios, pobreza; pode obriga-lo a vender o património dos cidadãos, cortar salários, reformas e serviços, destruir o que ainda sobrar da democracia.

Não é difícil e tudo isso em troca de lucros incalculáveis dos especuladores, mas também do fascismo financeiro da União Europeia, aquele mesmo fascismo que impôs os Tratados mortais da UE, os mesmos para os quais nenhum cidadão da União alguma vez votou.

Estamos a falar duma arma de triliões de Dólares, 8 vezes o Produto Interno Bruto do Mundo, não sei se é claro.

Perante tudo isso, repito, façam uma pesquisa na internet e tentem encontrar alguma coisa acerca do Grupo dos Trinta. Resultado: pouco ou até nada. Isso é espantoso e realça, mais uma vez, a sofisticação de quem arquitectou este diabólico plano

O Grupo dos Trinta

O que faz este Grupo?
Os Leitores mais antigos já conhecem a resposta, pois o esquema é velho. Mas funciona.
 
Primeiro: destrói-se a capacidade do Estado para criar e controlar qualquer riqueza financeira significativa (a “superstição ou a histeria da Dívida Pública”, como diz P. Samuelson). Nesta altura, a criação da riqueza financeira continua a ser significativa apenas nas mãos dos mercados de capitais, dos quais os Estados acabam por depender totalmente.

Segundo: os mercados de capital, agora donos e soberanos, encarregam lobbies e tecnocratas para que possam ser criadas leis, ferramentas institucionais e instrumentos de propaganda que permitam optimizar o saque global.

Terceiro: os governos, impedidos de criar qualquer tipo de riqueza, são totalmente dependentes da chantagem dos mercados e de quem estes controla, sendo assim obrigados a engolir ou directamente ignorar as aberrações especulativas, como a existência dos OTC.
Depois disso, os golpes financeiros são quase uma piada.

Agora, voltem até o segundo ponto, aquele da lobbies e dos tecnocratas: é aqui que encontramos, em destaque absoluto, o Grupo dos 30.

Em 1978, Rockefeller (tinha que ser, não é?) ajuda a criar o grupo. Serão 30 membros rotativos, mas sempre 30 indivíduos. E o que está definindo é muito mau desde o início: são quase todos os homens que trabalham com a mão direita na especulação financeira e com a esquerda na regulamentação governamental da mesma. Isso não tem piada nenhuma: um grupo assim deveria ser preso.

Eleni Tsingou, na sua investigação académica acerca do Grupo (em 2003):

Este grupo não apenas legitimou a participação do sector privado nas políticas do Estado, mas também permitiu que os interesses privados se tornassem o centro das decisões político-financeiras. Isto porque muitos dos seus membros são aqueles mesmos políticos que o grupo pretende convencer.

O Grupo dos 30, então, começou o trabalho com cérebros de primeira grandeza e bem recheado de dinheiro. Não faltava nada e os resultados não demoraram. Em 1993, o Grupo publicou o primeiro estudo abrangente sobre os produtos Derivativos: Derivatives: Practices and Principles.

Os controladores das transacções financeiras de América e Europa encontravam-se no meio do nevoeiro mais denso acerca destes produtos, portanto aceitaram o estudo de braços abertos: até que enfim, alguém que explica alguma coisa. Só que a ignorância não permite contrariar as conclusões, e as conclusões do Grupo dos 30 eram essencialmente duas:

  • os derivados OTC são essenciais porque “representam novas formas de compreender, medir e gerir o risco financeiro” (esta é lindíssima: os produtos financeiros mais arriscados alguma vez criados deveriam ter reduzido o risco)
  • e, em segundo lugar: foi salientado que “a chave para o uso de Derivativos é a auto-regulação: as regras estatais intrusivas teriam arruinado a elasticidade do produto e impedido a inovação financeira” (que significa: as leis são feitas por nós, privados, porque vocês, políticos, nem sabem do que estamos a falar. O que era bem verdade)

E para não fazer a figura das bestas ao quadrado, o que fez a maioria dos políticos? Seguiram os principais leader políticos que eram, na melhor das hipóteses, pagos pelas elites financeiras. Verdade seja dita: encontrar material informativo acerca dos Derivativos não era simples na altura.

Mas no estudo citado o Grupo dos 30 também ousou mais e escreveu que os auditores deviam “ajudar a remover a incerteza das normas legais e fornecer um tratamento fiscal [isso é, os impostos, ndt] favorável perante os Derivativos”.
Um trabalho teórico nada mal, preparado e divulgado com o lubrificante gentilmente fornecido pela JPMorgan.

Apesar da audácia dessas linhas, os três principais órgãos de controle (o Comité de Basileia, o Congresso dos EUA e a Federal Reserve) acharam a ideia da auto-regulamentação bem simpática e começaram a remar contra aqueles que lançavam o alarme: veja-se o caso de William K. Black.

Nesta altura, duas das mais poderosas lobbies financeiras anglo-saxónicas, o Institute for International
Finance
(IIF) de Washington e a Investment Banking Association (IBA) de Londres lançaram na mesa de negociações as suas propostas para a auto-regulamentação dos Derivativos , com o óbvio total apoio do Grupo dos 30. Tanto para ter uma ideia, o IIF é a lobby que algumas semanas atrás deu as ordens na negociação-suicídio da Grécia para o segundo resgate.

Amanhã: segunda e última parte.

Ipse dixit.