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O juro composto

O que é o juro composto?
É o juro de cada período que é somado ao capital para o cálculo dos novos juros nos períodos seguintes.

É o juro da dívida pública.

Para perceber como funciona, sendo hoje Sexta-feira Dia Mundial dos Contos (assim decidi), eis uma parábola.

Havia em Belém uma família cuja existência tinha sido abençoada com o nascimento dum filho.
Maria, a mãe, foi ter com o pai, José:
– Ó José, sabias que acabaram as fraldas?
– Ahe? Se quiseres posso construir uma fralda em dois minutos.
– Ó José, tu és carpinteiro…
– Por isso: sabes quanto dura uma fralda de madeira?
– Deixa, José, deixa. Em vez disso, vamos até o novo centro comercial em Nazareth, que acabei o detergente da loiça também.

E foi assim que a família pegou no burro e viajou até o Sagrado Mega Store, novinho em folha. Aqui Maria comprou o detergente, as fraldas, um desodorizante para a casa de banho, enquanto José aproveitou para adquirir alguns pregos de chumbo, bons para os caixões.
Uma vez chegados à caixa, a funcionária apresentou o total.
– São 20,01 Dólares Romanos [nota: não esqueçam que na altura o território era uma província de Roma].
Maria pagou com uma nota de 20 e uma moeda de 1 Dólar.
– Não tem um cêntimo?
– Não, lamento, o meu marido usou todas as moedas para o parque dos burros.
– Não faz mal: fique com a moeda de 1 Dólar, eu vou tomar nota do cêntimo e da próxima vez a senhora salda esta ridícula dívida, pode ser?
– Ohhhh…é que não gosto de deixar dívidas…  
– Não se preocupe, minha senhora: o nosso Sagrado Mega Store aplica um simplicíssimo juro composto de 4% sobre as pequenas dívidas.
– 4% de 1 cêntimo? Tão barato. Então até a próxima.
Maria esqueceu logo da dívida: afinal era apenas um cêntimo e a vida ofereceu bem outras preocupações. Mesmo assim, o Sagrado Mega Store, entretanto adquirido pela JP Morgan, continuou a calcular o juro composto.

Até que um dia, no Paraíso…
– Ó Jesus, vens aqui por favor.
– Que foi mãe?
– Olha, lembrei-me agora: quando tu eras pequenino, eu e teu pai fomos até um centro comercial para comprar as tuas fraldas e deixámos uma dívida de 1 cêntimo. Não te importas de ir e pagar?
– Ó mãe, após mais de 2000 anos? Se calhar o centro já nem existe, não é?
– Ó Jesus, não é o dinheiro, é o princípio que conta. Depois temos que dar o exemplo, não é? Queres que tua mãe apareça nas revistas de gossip como “A Grande Devedora?”. Faz-me este favor: vais, paga e quando voltares passa por Portugal e traz uma posta de bacalhau também.

Foi assim que o bom Jesus foi ter ao Sagrado Mega Store, hoje Centro Comercial Boa Vida, para falar com o departamento da contabilidade.
– Ah, sim, a pequena dívida…por acaso é uma das mais antigas, mas aqui ficamos com as contas todas, nada foge…faça o favor, sente-se. Vai um cafezinho?
– Não, obrigado, é que tenho uma certa pressa, tenho ainda que passar em Portugal…
– Então vamos ver: 1 cêntimo, com 4% de juros compostos, calculando 2011 anos. Mmmhhhh, o total subiu um bocado…
– Tá bom, afinal era um cêntimo…
– Sim, senhor Jesus, mas o juro era composto. E como se pode ler este número? Bom, para simplificar: suponha o meu amigo que vai saldar a conta em bolas de ouro…
– Bolas de ouro?
– Sim, do tamanho da Terra. Para saldar a conta agora são precisas 1.444 bolas de ouro do tamanho da Terra.

Após um tempinho, Jesus voltou ao pé da mãe.
– Então, querido, pagaste a dívida?
– Sim, com certeza…
– E o bacalhau?
– Cá está o bacalhau.
– Ó filho, mas está todo queimado!
– Eh? Ah, sim, houve um pequeno incêndio lá no planeta…

É assim que funciona o juro composto.
É assim que é paga a dívida pública.

Ipse dixit.

Fonte: Domenico De Simone (vídeo)