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O nascimento duma ditadura

Há luz no fim do túnel. Deve ser a Europa que queima.
Sim, vamos falar da Grande Doente: a Zona Neuro.

Moody´s ameaça cortar o rating dos Países da União.
Quais? Todos, duma só vez.

Faz sentido: basta com os cortes “gota a gota”, bem melhor um corte único e abrangente. Poupa-se tempo.
Diz a agência:

A Zona Euro está a aproximar-se de uma encruzilhada, entre mais integração ou maior fragmentação.

E Moody’s que contribuir a desvendar as dúvidas acerca da direcção. Resta saber se o Dólar realmente ficaria avantajado no médio e longo prazo com a desintegração do Euro. Mas aqui o discurso é mais complicado.

E acerca da Europa, eis uma entrevista com Nigel Farage.


Líder do partido britânico UKIP (UK Independence Party), que tem como principal objectivo a saída do Reino Unido da União Europeia, Farage é uma das poucas vozes com sentido no Parlamento Europeu.
No passado 16 de Novembro, Farage acusou os burocratas europeus de terem substituído o governo grego com um governo fantoche e Berlusconi com outro fantoche, Monti. Terminou o discurso perguntando quem, em nome de Deus, tinha-lhes dado o direito de fazer isso.

Simpático este Farage. Aqui entrevistado por Byoblu. Que não é uma empresa de detergentes mas um blog. Uma entrevista útil para perceber como duma democracia seja possível transitar para uma ditadura. E não é mera teoria: é o que se passa na Europa.

Dois governos de dois Estados democráticos têm-se demitido em poucos dias e foram substituídos por dois governos técnicos, liderado por homens da alta finança internacional e da Comissão Trilateral, Mario Monti e Lucas Papademos. É uma coincidência?

Bem, você ouviu muitas teorias sobre porque as coisas na Grécia e na Itália aconteceram e como eles vão. Nunca podemos ter certeza. O que sabemos é que dois ministros democraticamente eleitos foram removidos pelos valentões de Bruxelas. Já não eram “aceitáveis”. Papandreou atreveu-se a blasfemar em público, usou a palavra que começa com “r”, a palavra “referendo”. Inaceitável, tinha que ir-se embora. Berlusconi não era recuperável, as coisas podem parecer graves na Grécia, mas na Itália temos o Sr. Monti, o ex-comissário europeu, um dos arquitectos da Zona Euro, o desastre! Um não-eleito que nem sequer era membro do parlamento quando tudo isso começou. E, finalmente, reuniu todas as peças com pessoas nenhuma das quais pode ser definido como um político democraticamente eleito. Independentemente da causa de tudo, se acreditarmos na liberdade e na democracia, temos de admitir que estamos diante duma monstruosidade. É tudo uma coincidência? Não, isso é controle.

Apesar dum estado de crise de gravidade comparável, ao contrário de Itália, Espanha tem enfrentado eleições regulares. Quais são as diferenças reais entre as duas abordagens?

Bem, certamente os Espanhóis tiveram as eleições no Domingo. Muito interessante: eu estava num debate na televisão inglesa, quando os resultados vieram e eu disse: porquê incomodaram-se? Porquê uma eleição, quando afinal das contas têm as mãos amarradas, e nós temos visto hoje nos jornais que a primeira coisa que o Sr. Rajoy fez foi receber as instruções da Merkel; e, certamente, se “eles” não estiverem satisfeitos, no prazo de alguns meses será despedido e substituído com outro. O que está a acontecer com a Zona Euro é que a democracia é deliberadamente e voluntariamente destruída por pessoas que fazem tudo para apoiar o sonho-fracasso do Euro.

O que acha da satisfação duma parte do povo italiano com a substituição do governo Berlusconi com um governo técnico? Há um sentimento difundido de resignação perante a incapacidade de exprimir uma boa classe dirigente “do baixo”, por isso muitos preferem uma solução “de cima”.

Ok, há este assunto pelo qual o sr. Berlusconi não era um bom premier. Isso pode ser verdade ou mentira. Mas a essência da democracia parlamentar é que mesmo que um governo seja mau, vocês, o povo, têm uma ocasião, uma oportunidade de derrota-lo com regulares eleições políticas. A afirmação pela qual Berlusconi não estava à altura, que um governo técnico possa ser melhor, acho estar errada por duas razões. Em primeiro lugar, o sr. Monti é um dos principais autores deste fracasso. Segundo: este é exactamente a forma como começa uma ditadura. É declarado um estado de emergência, as normais leis democráticas são suspensas democrática e há alguém que chega ao poder para o “bem do País”. Então começa a ditadura! Na minha opinião não é justificável.

Um dos objectivos de Mario Monti, na Comissão Trilateral, foi prosseguir com dedicação à unificação total da Europa. Acredita que, como Presidente do Conselho, está a fazer hoje os interesses do povo italiano, ou das organizações internacionais nas quais ocupou importantes cargos de gerência?

O que é certo é que o Sr. Monti não tem nenhum mandato popular. O que também é certo é que ele quer ter a certeza de que Grécia e Itália permaneçam no Euro e continuem a fazer parte do projecto europeu. Eu não consigo entender por que os Italianos querem suportar isso. É uma monstruosidade absoluta que foi imposta. Em Atenas vimos as pessoas descer nas ruas e digo uma coisa: se eu estivesse em Itália, estaria tentado de fazer exactamente o mesmo.

O que acha do MES, o novo tratado da União Europeia em curso de aprovação que dará a 17 governadores, incluindo Mario Monti, o poder de exigir qualquer quantia de dinheiro aos Estados membros e irá torná-los imunes a qualquer processo judiciário, além do secreto inviolável de todos os seus arquivos e documentos?

Então, a solução para a crise do Euro é obrigatoriamente “mais Euro”. Isto é o que ouvimos de Barroso e Van Rompuy. E agora há este novo tratado MES, o mecanismo de Estabilidade da UE, e a ideia é que em breve haverá uma mudança, talvez em 18 meses ou 2 anos, o que tornará legais os resgates dos Estados europeus como já tivemos. Algo que vai ser legal, mas que certamente não é. Creio que este novo tratado represente a pior evolução da Europa Unida: dará poder arbitrário a burocratas estrangeiros nunca eleitos para controlar as economias de inteiros Países, mesmo que façam uma grande bagunça o tratado vai dar-lhes completa imunidade, para a vida! Este tratado, o MES, vai mexer em coisas que deveriam, aliás devem deve ser submetidas a um referendo em cada Estado membro, e os Italianos não devem descuidar este assunto. Certamente em algum momento terão de decidir acerca do vosso futuro. Não podem assumir o facto de que o sr. Monti e outros estejam a fazer os vossos melhores interesses.

Porquê acusa Van Rompuy de não ter legitimidade democrática? Porquê considera Van Roumpy responsável daquilo que está a acontecer com o povo italiano?

Herman Van Rompuy, um velho amigo! Bem, há 18 meses enfrentamos-nos no Parlamento Europeu: eu dei uma versão alternativa do currículo dele, da sua formação. Mas naquilo em que, com convicção, eu estava certo foi dizer que ele não tinha legitimidade democrática. Siga-me: não foi avaliado por ninguém, e não há nenhum mecanismo para que eleitores ou País europeus poderem removê-lo. E a coisa mais importante acerca desta questão italiana foi ver este homem partir de Bruxelas e vir em Firenze para dizer ao povo italiano que este não é o momento para as eleições, mas é hora de agir. Que, em nome de Deus, deu-lhe o direito de dizer essas coisas ao povo italiano?

O que acha das declarações de Sarkozy e Merkel segundo os quais quem derrotar o Euro passará a ser responsável pelo começo duma nova época de conflitos militares entre os Países na Europa?

Eu conheci Angela Merkel um mês atrás e fiz uma pergunta. Perguntei-lhe porque a Grécia não pode recuperar a sua moeda, desvalorizar e ter o seu próprio governo democrático? A resposta de Merkel foi clara: se permitirmos que a Grécia for embora, outros Países seguirão. Então, o problema aqui é que o projecto europeu deve continuar ao preço de qualquer custo económico ou democrático. Deve ser mantido “junto”. Então, quando começar a desesperar, dizem que se o Euro falhar, pode haver uma guerra. Que guerra? Quem deveria invadir quem? Devemos acreditar que a Alemanha voltará a rearmar-se? E que vai invadir a França? Acho que não! Estas são as velhas técnicas de intimidação, e devemos lembrar que, na realidade, as guerras podem surgir quando as pessoas são forçadas artificialmente a ficarem juntas contra a própria vontade. Lembrem do que aconteceu nos Balcãs, aconteceu no século passado, temos visto ao longo dos últimos 20 anos as ramificações que chamamos Jugoslávia. Há muitas mais probabilidades de revolta, de discordância e até de guerra civil se vamos impor aos Europeus uma forma de governo que não escolheram e não querem.

Você é contra a União Europeia. Como acha que os Estados podem sobreviver numa era de mercados globais, deixados sozinhos a lidar com as potências emergentes, sem uma união forte?

O discurso da globalização é muito amplo. E uma das analogias que podem fazer é isso: estamos aqui, no meio do Oceano Atlântico, num grande tempestade. Há enormes ondas que sacudem tudo e a situação é extremamente perigosa. Agora o ponto é que se estarmos todos juntos num grande navio, de alguma maneira será mais seguro e podemos lidar com essa tempestade violenta com alguma esperança e uma expectativa maior de sobrevivência. Defendo que, na verdade, o que é mais importante, se quisermos sobreviver numa tempestade no Atlântico, não é estar num navio bem grande, que seria possível chamar de Titanic, mas acho que a coisa mais importante é ter as mãos firmes no leme e ser capaz de desenhar o próprio curso, seguindo a direcção certa. Em termos comerciais, em termos de relações internacionais, em termos de política externa, o meu País, o Reino Unido, e Itália têm abordagens totalmente diferentes. Isso não significa que eu sou melhor de que você, e não significa que eu sou pior, isso significa que o meu País é muito diferente do teu, acho que temos uma melhor esperança para sobreviver à tempestade se formos verdadeiramente capazes de traçar o rumo que queremos seguir, ao invés de seguir uma decisão conjunta tomada em nome de 27 pessoas diferentes, com ideias conflituosas e ver tudo reduzido a uma confusão, um compromisso que não se encaixa em ninguém e dirigido por burocratas da Comissão Europeia, temos visto isso em qualquer outra área da política, têm falhado em todas ao longo dos últimos vinte anos.

Não acha estar presente uma dominação excessiva dos mercados, em vez de perseguir um modelo social com base  no bem-estar dos cidadãos? Concorda na ideia de que as regras do mercado e da especulação devem prevalecer, na medida em que minam populações inteiras, embora no final eles têm todos os recursos físicos necessários para viver bem?

Toda a conversa é que o Estado pode ter o melhor cuidado com as pessoas, que o Estado pode garantir que do berço à sepultura você está protegido, para que possa prosperar e trabalhar. Bom, os exemplos desta realidade não são muito positivos. Olhem para a União Soviética. No início pensaram assim, e olhem o desastre absoluto que foi. Eu sei que a sociedade do livre mercado tem excessos. Existem pessoas preparadas para quebrar as leis, as regras, sei que a razão do lucro pode ser a razão da ganância. Bem, eu digo isto. A minha visão da evolução da sociedade humana é que, se querermos escolas, hospitais e um bom status social, para ter todas essas coisas é preciso fazer lucros! Porque é graças ao lucro que as pessoas pagam impostos. E o que temos agora nesta União Europeia é algo que é chamado de mercado livre, mas na realidade é totalmente controlado pelos Estados, nas mãos de grandes bancos e multinacionais, que está a bloquear as empresas verdadeiramente livres, as pequenas e médias empresas, e estamos a ver o baixo crescimento, o desastre da dívida, um verdadeiro negócio ruim para aqueles para os quais, creio eu, essas coisas foram concebidas e implementadas: a parte mais fraca da sociedade. Precisamos fazer dinheiro, ganhar dinheiro, temos de competir com todo o mundo em desenvolvimento. Mas tudo o que estamos a fazer e vestir um casaco que diz: “Oh, podemos trabalhar menos, ganhar mais”, “Pode aposentar-nos mais cedo”. Não funciona. Não paga. Uma vez que você pensou cuidadosamente sobre tudo isso, o mercado é o que dá lucro, dá os impostos, os impostos dão o bem-estar em todos os Estados livres.

O que acha que a Itália deveria fazer para superar a crise?

A Itália? Eu sempre tive a certeza de que a Grécia e Portugal nunca foram adequados ao Euro, não deveriam ter sido parte e devem ser deixados livres, ou melhor, serem liberados o mais rapidamente possível. Agora, para a Itália a questão torna-se um pouco mais complicada. Você têm uma grande economia, mas acho que a verdade é que nunca podem tomar os negócios, a cultura, a política e fundi-los com os dos Alemães de forma pacífica. Não vai ser agora, vai levar tempo, mas eu realmente acho que a Itália deveria abandonar o Euro, voltar a utilizar a Lira, livrar-se de Monti e dos amigos dele, que nunca foram votados, não têm legitimidade democrática e quanto mais cedo forem caçados melhor será.

Fontes: ByoBlu, Il Corriere della Sera,