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O velho Inferno da Líbia – Parte III (e última)

Dois post acerca da Líbia que suscitaram dois tipos de reacções opostas: dum lado quem vê em Khadafi quem conseguiu construir um País válido, doutro lado quem pergunta “Sim, mas então tudo aquilo que foi dito nos média ocidentais era mentira?”.

Em primeiro lugar: este blog não está  aqui para propor a beatificação de Khadafi. Longe disso.
Como escrevi há alguns dias:

Fez coisas horríveis, é verdade.
Não piores de quanto já fizeram um Obama ou um Cameron qualquer, mas sempre horríveis.

Parece ser uma afirmação bastante clara, que acham?
A atenção de Informação Incorrecta nem é focada na figura de Khadafi, mas sim da Líbia e dos Líbios.


Porque é inútil negar que nos últimos meses a informação ocidental não gastou uma única palavra que não fosse negativa para descrever as condições do povo líbio.
E quem não entendeu esta mensagem, deveria ler os artigos publicados pelo seu diário favorito a partir do passado Fevereiro.

Ao longo de todo o presente 2011 fomos bombardeados por notícias segundo as quais a situação estava desesperada, com o regime que massacrava os civis (e sem ninguém que uma única vez fosse capaz de mostrar uma prova), valas comuns (como o ridículo caso do cemitério perto na praia) e outras barbaridades ainda.

A realidade era diferente, assim como viver na Líbia antes da “libertação” não era um inferno.

Afirma Augusto:

Difícil de acreditar nisso que você afirma.

Augusto, eu além de controlar as fontes e procurar confirmações não posso fazer. Ir até a Líbia para perguntar como estavam as coisas sairia bastante caro. Além de que deveria ser um trabalho dos jornalistas, que com meticulosidade evitam esta tarefa.

Mas sobretudo este último ponto não faz tocar uma campainha? Porquê inventar (literalmente) provas quando teria sido muito mais simples pegar num grupo de cidadãos infelizes e gravar os testemunhos?

Podemos argumentar acerca dum ou outro ponto apresentado nas minhas “listas”, mas todas as fontes que vi confirmavam o que escrevi.

Temos também o testemunho de Maria, Leitora que tinha visitado a Líbia.
Temos também o fórum do Sudão que confirma, em linha gerais, a veridicidade das afirmações.

Se alguém conseguir demonstrar o contrário será bem vindo neste espaço e merecerá uma publicação em destaque (atenção: o assunto não é demonstrar que Khadafi era mau, mas que o povo líbio vivia em condições terríveis, típicas dum regime opressor).
Neste blog não há censura ou preconceitos: demonstrem o contrário de quanto afirmado e terão todo o espaço.

Se depois alguém conseguir arranjar o número de telefone dalguns cidadãos líbios, faça o favor de contactar-me, não me importo de ser eu a ligar para uma entrevista telefónica (desde que não fale apenas árabe, por razões facilmente compreensíveis…).

Mas se a Líbia fosse tão boa assim, por que haveria rebeldes? E mais, por que o povo não se insurgiria contra um golpe? Não se pode negar que houve apoio popular aos rebeldes. Pelo menos algum apoio houve, pode até ser bem menos do que a mídia mostrava. Mas que houve, houve. Alguma insatisfação popular deveria haver ou não?

Augusto, uma pergunta: mas quantos eram estes rebeldes? Eu nunca li números oficiais, acho que nem existem.

Mas importa o número? Falamos de pessoas que militam em Al-Qaeda, não colegiais. Falamos de pessoas armadas pela Nato. Falamos de pessoas que combatem enquanto os aviões aliados bombardeiam até hospitais civis (e disso temos fotografias e vídeos). Falamos de pessoas que utilizavam lança-foguetes, não paus de madeira.

O que pode fazer a população contra forças destas? Pode fazer o que fez: resistir. Porque não podemos esquecer que a invasão tinha começado em Março e Khadafi foi morto apenas em Outubro: são 7 meses de guerra num País de 6 milhões de habitantes, sem obstáculos naturais a não ser o deserto.
E a resistência continua, com ou sem Khadafi.

Já esquecemos, por exemplo, do apoio das tribos do deserto? Também eles são líbios, não são turistas.
Já viu onde estava escondido Khadafi? Não num bunker, contra tudo e todos, até contra o próprio povo, mas numa cidade, Sirte, com mais de 135 mil habitantes.

Tudo isso não significa que a Líbia fosse um paraíso. Em parte porque um País perfeito ainda não foi inventado, em parte porque Khadafi não era santo, de certeza. Mas nem era aquela besta sanguinária que foi recentemente descrita.

Ricardo:

Não quero questionar os motivos da NATO… são óbvios… quero é justamente diminuir o peso na consciência… a Líbia não podia ser tão boa… o cara tem que ter alguns muitos desvios comportamentais… qualquer coisa… é fardo pesado demais para carregar saber isso…

Exacto: a Líbia não era um paraíso, como afirmado.

Nunca gostei do Lula (ex-presidente) do Brasil. Mas ele era muito amigo do Kadhafi… do Hugo Chavez… do Fidel Castro… não posso achar que são boas pessoas… não consigo… não sei se a lavagem cerebral ocidental foi muito forte… mas não dá!

Será que a lavagem cerebral foi tão forte?

Ricardo, lembra de Saddam Hussein? Lembra das armas de destruição maciça? Os misseis capazes de atingir a Europa e, quem sabe?, até os Estados Unidos? Lembra das armas químicas? Lembra das armas bacteriológicas? Lembra do testemunho da enfermeira oprimida que na verdade nem era enfermeira mas sim filha do embaixador em Washington?

Pergunto: quem espalhou estas notícias? Não foi um blog, de certeza.

Ricardo, lembra das cidades dos terroristas de Al-Qaeda, cravadas na rochas das montanhas do Afeganistão e por isso difíceis de detectar? Lembra dos laboratórios subterrâneos onde Al-Qaeda produzia armas químicas, bacteriológicas e talvez atómicas também?

Quem espalhou estas notícias também?

Respostas: em ambos os casos funcionários ocidentais, devidamente amplificados pelos media, nos mesmos Países que agora até participaram na Operação Humanitária na Líbia.

Será que isso pode significar alguma coisa?

É igual quando quero procurar o lado bom do Nazismo e só encontro racistas loucos do orgulho branco defendendo… não dá para acreditar…

Bem diz Burgos:

Acho que tu não tem que procurar o lado bom, tens que procurar a verdade dos fatos.

Esta é a ideia.
O nosso primeiro objectivo não deve ser emitir uma sentença (bom/mau) mas tentar perceber qual a verdade, sempre que isso seja possível. Porque uma coisa temos de ter aprendido: os media, infelizmente, não contam a verdade, mas apenas algumas verdades (e quando não haver verdades, então não hesitam em cria-las).

E quando estiver ocultada uma parte da realidade, fica mais simples tornar os factos mais “simpáticos” para nós e as nossas intenções.

Na Líbia não estava tudo mal. Assim como nos Estados Unidos não está tudo bem. E vice-versa.
Problema: nos Estados Unidos as coisas continuam como antes. Na Líbia não.
Mas, explicam os media, é muito melhor agora.

Porquê? Qual o nosso direito de intervir? Porque é lícito bombardear aldeias e cidades da Líbia (bombardeamentos humanitários, óbvio) enquanto um ataque contra os Estados Unidos é “terrorismo”?

O regime líbio era um inferno?
Isso justifica a utilização de armas com base no fósforo contra os civis ou as forças adversárias?
Justifica a nossa atitude perante os nossos soldados que violam as resoluções da ONU e já nem gostamos de falar nisso porque não fica bem na fotografia?

Eu acho que não. E não gosto ter que aceitar as mentiras do regime (o nosso regime) só para acalmar a minha consciência. Se for por isso, então melhor fazer a minha parte aqui e agora, única maneira para não ter remorsos. Caso contrário, seremos sempre cúmplices.
“Seremos” todos, incluído eu.

Nem vamos falar de Khadafi.

Gostaria apenas de deixar uma sugestão.
Faça o Leitor as contas de todas as pessoas que morreram por causa das decisões dum Presidente Bush (um dos dois, tanto faz) ou até dum Obama (mas porque esquecer um Blair, um Cameron ou um Sarkozy?) e comparem o resultado com os mortos provocados pelo ex.líder líbio.
Façam as contas e depois escolham o “mau”.

E com esta nota de pura alegria, fechamos o “caso Líbia”.
Fechamos como post, claro, pois pode continuar nos comentários, como sempre (e “Obrigado!” para todos os Leitores que já participaram).

Ipse dixit.