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15 de Outubro: foi ontem

Bom, o 15 de Outubro acabou.

Em Lisboa foi um sucesso, tal como em Madrid, Bruxelas, New York, Atenas, Londres, Berlim…
Claro, os números oficiais falam duma adesão tudo somado reduzida: doutro lado, esperar milhões nas ruas não era lógico e nem é lógico que as autoridades reconheçam eventuais participações maiores.

Medo de acidentes dum lado (tal como aconteceu em Roma, mais de 100.000 participantes, 2/300.000 mil segundo outras fontes) e uma notável inércia das pessoas do outro fizeram o resto.

Serviu? Não serviu?
Interessa? Não era esta a ideia.

Não concordo com alguns comentários que apareceram no post anterior, e explico a razão.


Medo de que as manifestações sejam “pilotadas”?
Claro que são, quem pode duvidar disso? Se houver dúvidas, procurem algo acerca dos financiadores dos Indignados em Madrid, há algumas semanas. E o mesmo pode ser dito de Occupy Wall Street, assunto do qual já falámos neste blog.
Somos grandes e vacinados, já não acreditamos em Peter Pan.

Mas…

Mas: a mudança acontecerá na mesma, com ou sem manifestações, com ou sem a nossa participação, disso podemos ter a certeza. A máquina já está em marcha, agora é só seguir a corrente até os eventos estarem prontos para o “salto para a frente”. Não a máquina dos manifestantes, mas aquelas de quem decidiu uma mudança agora.
Então?

Então cada um de nós tem duas opções:

  1. ficar sentado e dizer “Tá bom, é tudo falso”
  2. mexer-se para tentar mudar alguma coisa.

No primeiro caso (“Não me mexo porque é tudo falso”) seremos simples espectadores e nada será possível fazer.
No segundo caso há a possibilidade de obter algo, nem que seja pouco (que é sempre melhor do que nada, ou não?).

A coisa pior é que no primeiro caso será também preciso mexer-se, mas numa altura em que os jogos já estarão decididos. Será um mexer-se não espontâneo, mas obrigado, tal como o percurso que terá de ser seguido.

Porque, caso não esteja ainda suficientemente claro, haverá uma altura em que cada um de nós terá que tomar uma decisão. E esta altura está a aproximar-se. Não importa se o Leitor morar em Portugal, na Bélgica, nos Estados Unidos ou no Brasil: abram os olhos, o nosso mundo está a cair em pedaços, não há “ilhas felizes”.

É uma demolição controlada, como já foi escrito, nada acontece por acaso. Mas qual a alternativa: ficar sentado e repetir “Ah, mas isso está tudo organizado”? Qual o resultado desta atitude? Vai melhorar alguma coisa? Quais os resultados práticos?

Se o nosso objectivo é melhorar este raio de mundo, as próximas semanas/meses/anos (bem poucos anos, eventualmente) representarão a única possibilidade. Depois será demasiado tarde.
“Depois” haverá outra realidade, outro regime, com outros nomes mas com as mesmas pessoas. E nós ainda aqui, como sempre, a dizer “olha só o mundo como está mal”.
Isso se ainda existir internet nos actuais moldes, óbvio.

Se bem percebi, alguns Leitores gostariam de uma atitude bem mais “forte” (e este é um eufemismo): concordo, tenho a mesma vontade. Mas…

Pois também aqui há um grande “mas”.
Em primeiro lugar, chamamos as coisas com o nome delas: “revolução” e/ou “luta armada”, é assim que se chamam.

Mas deixem-me perceber algo: uma das nossas principais queixas é o facto das pessoas estarem “adormecidas” (outro eufemismo) e a ideia é fazer a revolução? E com quem? Porque as revoluções fazem-se com mais duma pessoa, possivelmente com algumas centenas de milhares.

E onde está esta gente? Vamos acordar os “adormecidos”? E como pensamos acorda-los? Com uma bandeira vermelha na mão? Ou pagamos uma publicidade na televisão, entre uma novela e o resumo dum jogo de futebol?

Cidadão, pronto para a Revolução? Desça na rua com uma bandeira ou um lenço vermelho, ocupe o Parlamento e leve consigo uma arma, que pode sempre dar jeito.

Oiça a senhora Fernanda, 94 anos, reformada:
“Sim, eu também revoluciono! Peguei na minha tesoura, na reserva de fraldas para incontinentes, e ocupei a esquadra da Polícia! Queriam deter-me os malandros, mas com a minha mala, tunga!, na cabeça do sargento e, tunga!, na cabeça do cabo, até os outros se entregarem. Viva la Revoluc…ahi, a minha dentadura postiça…”

Cidadão, junte-se à Revolução, para um mundo melhor, mais justiça e dinheiro para todos. Reunião amanhã na Praça da Câmara, venha disfarçado pois é secreta.

É esta a ideia?
Ou, ainda pior, luta armada ou terrorismo? Já vi o terrorismo com os olhos de criança, obrigado, para mim chega, quem fala disso não sabe o que diz.

Então?
Não vamos mexer em nada porque achamos que estas manifestações são inconcludentes? E porque não mexer-se e tentar fazer a própria parte, introduzindo elementos de discussão, não aqui num blog mas na vida real, entre as pessoas?

Li do patetismo das família que participaram nas manifestações. Não vi patetismo nenhum, vi a tentativa, apesar de débil, de contar, de fazer algo. Vi pessoas abandonadas, tal como nós, que agarraram a primeira ocasião para fazer alguma coisa.
Pelo menos elas eram visíveis, estavam aí, os que ficaram atrás dum blog nem por isso.

Ou a ideia é preparar a revolução a partir dum blog como este? É para rir? Ninguém irá mexer-se. Pelo menos até quando houver comida e televisão.

Depois, quando estas drogas faltarem, será demasiado tarde, porque já terá sido atingido o ponto de não regresso e as forças populares serão conscientemente canalizadas para o palco do caos organizado.

Esta que temos na nossa frente não é uma eleição onde podemos não ir às urnas porque tanto o mundo continua igual a si mesmo: seremos obrigados a ir, duma forma ou de outra. A única coisa que podemos fazer é escolher que sejam os outros a dizer-nos como e quando; ou tentar nós decidir algo.

O resto são apenas palavras.
Claro, esta é apenas a minha opinião e como tal pode estar errada.
Mas lembrem, como disse o nosso Grande Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva: eu nunca me engano e raramente tenho dúvidas :)))

Ipse dixit.