Incompetente (segundo e último episódio)

O amigo Incognitus ou não percebe ou finge não perceber.
Mas não faz mal, eu tenho paciência e explico.

Antes demais a resposta dele no fórum:

Novamente, isso mostra grande desconhecimento INDEPENDENTEMENTE da fonte.

Eu já expliquei aqui porquê, volto resumidamente a fazê-lo.


Se comprares um futuro e o venderes de seguida, independentemente da contraparte, o open interest que darão para esse futuro será 0.

Se comprares um CDS e o venderes de seguida, basta que a contraparte não seja a mesma, para o open interest que será revelado para esse CDS ser 2.

Penso que esta explicação é mais que suficiente para se compreender que esses montantes para os CDS abertos não corresponderão à exposição líquida de quem os compra ou vende, e tenderão sempre para montantes astronómicos.

(O zero hedge / “Tyler Durden” nem sempre sabe do que fala. Tem muitos bons artigos, mas alguns maus como é o caso)

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3 anos após o início da crise estamos ainda neste ponto? 3 anos após o início da crise, num fórum dum País falido, há ainda quem fique ofendido se um blog traduzir um artigo dum site americano no qual é denunciada uma finança mergulhada num mar de papel?

Neste fórum em particular falou-se da crise antes dela acontecer, e explicou-se muito do que a originaria.

Não tinha dúvida quanto ao facto do fórum do Diário Económico ter antecipado a crise: todos os economistas ou quem trabalha na área agora descobrem ter antecipado a crise.
Aliás, é difícil encontrar alguém que não estivesse à espera. Os únicos devem ter sido os fulanos da Lehman Brothers, os mais atordoados.

Mas ignoremos.

Outro ponto: os CDS, Credit Swap Default são “morais”? Eu sei que este é um termo que fará endireitar os cabelos de Incognitus, mas é um ponto importante. Ao falar de open interest dum CDS, não seria mal lembrar que foi este tipo de finança que arrastou o mundo para a situação na qual hoje se encontra.

Mas driblemos este assunto também (afinal não é foco da questão), vamos em frente.

O que o artigo de Zero Hedge demonstra é que existe um cartel: um grupo de bancos privados que, sozinhos, arrecadam 96 % do mercado dos produtos derivativos. Talvez o amigo Incognitus considere isso normal, eu não. Não fico surpreendido, mas acho este um sintoma importante do estado no qual se encontra a finança global.
E goste ou não, esta é o tipo de informação que o presente blog difunde também.

Outro ponto que não pode ser posto em discussão é que, além do aumento da concentração, a “alavancagem” nominal da Goldman Sachs é de 537:1, isso realçando que GS não é
um banco comercial. Em comparação, Morgan Stanley está a funcionar com um modesto 26:1.

Tudo normal também aqui? Ok, não faz mal, doutro lado não quero entrar demasiado no “técnico”, pois este foi sempre um dos lemas do blog: quem lê tem o direito de perceber o que está a ler. Então falamos uma linguagem mais simples.

De acordo com o bilionário Warren Buffett (um incompetente) os derivativos são as armas de destruição maciça dos mercados financeiros e o sinal da rede interligada que todos os bancos têm um com o outro; o que torna a economia global dependente da segurança e da estabilidade destas instituições para funcionar.

Os EUA tem um PIB de 14,5 triliões de Dólares e uma dívida nacional que é agora um pouco mais do que isso. No entanto, ao comparar esses dois números com os 250 triliões de Dólares de exposição “potencial” de apenas cinco bancos (alguns dos quais são proprietários e acionistas da Reserva Federal), reparamos que não há impressora que possa funcionar em caso de colapso.

Porque a dúvida é esta, caro Incognitus, esqueça o open interest, caro amigo, e pense nisso: em caso de dificuldades, dificuldades sérias (as mesmas dificuldades que encontraram Lehman Brothers ou Fannie Mae/Freddie Mac), onde arrecadar o dinheiro? Quem pagaria os seus open interests?.

Claro, neste último caso falamos de exposição sobre empréstimos, nada de derivativos: são coisas bem diferentes. Mas também neste caso o risco era “potencial”, não bem real.
Afinal os empréstimos não eram garantidos pelas casas dos contraentes? 12 triliões de Dólares era a exposição “potencial”, Fannie Mae e Freddie Mac foram salvas no dia 7 de Setembro de 2008 com uma intervenção sem precedentes do governo dos Estados Unidos.

Mas qual era o risco “potencial” da AIG? E o risco da Lehman Brothers? Em ambos os casos: crises de liquidez. Não havia dinheiro, caro Incognitus, não havia dinheiro. Tinham CDS, tinham outros instrumentos financeiros. Com certeza tinham também muitos open ineterests, mas não havia dinheiro. E esta é história.

A verdade é que os CDS, que lembramos são um tipo de derivativos, foram amplamente responsáveis pela crise de Bear Stearn, AIG e outros. E também esta é história, não uma opinião. 

O que aconteceria com uma repentina mudança das taxas de juros?
Os bancos afirmam que os derivativos em si não são significativos (mais ou menos o discurso do amigo Incognitus) porque estamos perante valores “nominais” que descem “after netting”. 

Mas repito o que escreve Zero Hedge:

O melhor exemplo de como o vício de fundo do netting quase acabou com o sistema é representado pela AIG: a companhia de seguros ficou à beira de tornar triliões de derivativos papel rasgado, deixando todos os que tinham adquirido protecção sem nada na mão, uma situação que apenas Goldman Sachs salvou ao adquirir protecção da AIG.

Também esta é história que está disponível até numa Wikipedia inglesa qualquer.

Porque é disso que estamos a falar: a diferença entre um pedaço de papel e riqueza real. Se o meu amigo Incognitus não perceber esta subtil diferença, então qualquer diálogo é destinado a falir.

Em 2008, os EUA experimentaram uma crise que levou os sistemas bancários e económicos para a beira do colapso, mas através de salvamentos de última hora, com o dinheiro dos contribuintes, o sistema sobreviveu, e a crise foi temporariamente afastada.

Os riscos “potencias” tinham-se tornados “reais”.
Esquisito, não é? Mas acontece. Aliás, aconteceu.

No entanto, apenas três anos mais tarde, a crise está de volta, só que desta vez é acionada por bancos europeus e pelo problema da dívida soberana; e nos bancos dos EUA a exposição de derivativos é muito mais ampla quando comparada com a situação de 2008.

Apesar da crise de 2008, os bancos não se alienaram das suas exposições “potenciais” de derivativos, mas pelo contrário, aumentaram após a intervenção do governo.

Reggie Middleton’s, outro incompetente que costuma ser entrevistado por Bloomberg, Russian Today, BBC ou CNBC, ao falar do relatório federal (o mesmo utilizado por Zero Hedge):

A quantidade de “bolhas” sobrevalorizadas e o risco do mercado são escandalosos, principalmente considerando o facto de que não conseguimos sequer chegar perto de “desinflar” a bolha do início deste ano e do ano passado.

Ainda mais alarmante é que alguns dos maiores bancos do mundo, e alguns dos mais respeitados (e desrespeitados), estão fortemente alavancados neste negócio, duma forma ou doutra. […]  Não é possível ter cumes de riscos tão elevados num círculo fechado de apenas 4 contrapartes, as quais estão nos mesmos negócios, tendo os mesmos riscos.

Como? Reggie tem um grande desconhecimento também? Ok, percebo. (Psssst! Em boa verdade nem eu gosto muito dele, mas enfim…)

E tudo isso enquanto a taxa de empréstimos não pagos sobe pela primeira vez em 6 meses. Claro, é uma subida leve, é tudo “potencial”. Mas subiu.

Caro Incognitus, estas são todas coisas que você conhece, com certeza. E poderia explica-las de forma técnica talvez melhor do que eu.
Talvez.

Mas, caro Incognitus, abra a janela e veja o que se passa lá fora: há a realidade, não apenas o “potencial”.
Uma realidade feita dum País que não produz (“potencialmente” poderia produzir, mas não produz), pessoas desempregadas (pessoas que “potencialmente” poderiam trabalhar, mas não trabalham), salários e reformas que baixam (“potencialmente”? Não, baixam mesmo) e outras coisas engraçadas.

O castelo de papel no qual você vive, no seu fórum, não é mais sólido do que as nossas vidas cá fora. Aliás, algo me diz que poderá ficar bem surpreendido com os próximos acontecimentos. Não é um voto, é uma constatação.

Um castelo de papel cujas bases foram erodidas (existe isso em Português?) não pelo passar do tempo, não pela força do vento, mas, de forma mais simples, por quem quis que isso acontecesse.   

E você arroga-se o direito de criticar quem, como Zero Hedge e, em medida bem menor, eu, tenta afirmar uma simples verdade que está sob os olhos de todos? Que o mundo da finança está podre e completamente desligado da realidade?

Não será este tipo de atitude que torna impopular o mundo da finança e quem nele opera? Ou quem sabe utilizar termos quais stock options, equity swaps, single-stock futures ou over-the-counter é uma pessoa geneticamente mais dotada, que pode julgar os outros?

Meu amigo, você vende e compra, nada mais do que isso. É o mesmo trabalho do talhante. Com a diferença que o talhante compra e vende uma coisa útil, você vende e compra papel que tem um valor apenas porque as convenções assim determinam. Momentaneamente.

Porque não desfrutar a ocasião para tornar este seu mundo um pouco mais simpático e acessível?

E quer explicar a mim como funciona um CDS? Tenho que rir ou quê?
Percebo que na qualidade de administrador tenha alguns deveres, tenha que defender a linha editorial  Mas, pelo menos, limite-se a isso, sem ofender quem nem conhece. Repito: não lhe fica nada bem.

Caro amigo Incognitus: o meu blog está aberto a todos, mas desta vez fica ainda mais aberto para si. Aceita falar serenamente e fora de qualquer tecnicismo dos mercados, de forma que todos possam perceber?

Nota: não vou postar isso no seu fórum porque não gosto mesmo do Diário Económico, lamento.
Nota número dois: para mim o assunto Zero Hedge/Relatório fica por aqui. Há vida além disso.

Ipse dixit.

6 Replies to “Incompetente (segundo e último episódio)”

  1. Só um louco acredita que o seguinte não vai acontecer:

    – Grécia vai entrar em Default e Bancarrota

    – Bancos Franceses e Alemães vão falir, em última instância… não sem antes serem injectados, outra vez, muitos milhões e o zé mané vai pagar…

    – Atrás desta falência anunciada e já não muito distante os principais bancos da Wall Street vão-se ver Gregos para se safar pois afinal de contas eles "financiaram" estes bancos em qualquer coisa como $2.7 triliões… coisinha pouca…

    – E… com estes bancos todos em stress e a falirem os ZÉs MANÉs vão-se ver como os Gregos…

    Se por acaso quem leu isto acredita que estou louco… não não estou!!! ihih

  2. E só para acabar em beleza:

    "NEW YORK: Germany may in fact be preparing to abandon the Euro and re-introduce the Deutsche Mark as the country's currency, the newest buzz on the web indicates. Dr Pippa Malmgren, President of Principalis Asset Management, predicts on her website that in the coming weeks, the Germans will announce they are re-introducing the Deutschmark. For the purpose, they have already ordered the new currency and asked that the printers hurry up.

    The Daily Express echoed the sentiment reporting that Germany's Central Bank, Bundesbank, has been ordered to print Deutsche Marks as a contingency when the time comes to leave the Euro.

    A poll by Frankfurter Allgemeine had found that 71% of the Germans saw no future for the Euro"

    É preciso ser mesmo louco… a Alemanha regressar ao Marco Alemão… cu-cu tá tudo louco!!!eheh

  3. Para mim acho boa ideia Portugal fazer o mesmo, mas para isso tem de agarrar no dinheiro da 'ajuda' Troikiana investir no setor primário, tal como a agricultura:
    – incentivar os ZÉs MANÉs a trabalhar no setor primário – e por incentivos fala-se em reduzir a carga fiscal sobre quem produz e taxar as riquezas dos 'ilibados' bancos;
    – sair do Euro, reimplementando o Escudo, para podermos controlar o nosso valor lá fora;
    – exportar (pois AINDA temos produtos muito bons) e baratos;

    Resumindo – adeus às quotas de produção que só serviram para escravizar, deixando-nos à mercê d'um BCE e amigos.

    Poderia-se aprender com o Fuhrer, certo? Afinal, não era um génio só para o mal…

    Abraço,
    — —
    R. Saraiva

  4. Eis a resposta do Sr Incognitus:

    "É inútil discutir com a pessoa em questão, eu já expliquei porque é que o artigo original era mau e não vou continuar a atirar contra um alvo em movimento.

    Quanto à crise, os seguintes artigos, entre outros, foram escritos antes dela acontecer e explicam a mecânica (de notar que as datas em "História" não coincidem porque os artigos já vêm de uma versão anterior do Thinkfn, que existe desde 2004. As datas citadas dentro dos artigos são as da publicação original):

    A bolha invisível
    O poder dos incentivos
    O modelo de originação

    (uma outra questão acessória: estruture os seus argumentos e sintetize-os, fala aí de uma série de coisas e ninguém terá a paciência para responder a todas nem para ler isso tudo. Os argumentos devem cingir-se à questão original e não abordar questões nas quais nem sequer sabe a posição deste fórum. Aquilo que foi criticado foi o pegarem em números que não representam a realidade dos CDS e usarem-nos para escrever um artigo ou formar uma opinião – eu expliquei de forma simples porque é que esses números são falaciosos e mais não deveria ser necessário para alguém razoável compreender)"

  5. Cruzessss cheguei a ficar com medo!!!

    Essas palavras chegaram a respingar ódio no meu écran, hehehehe.

    Porque será que ele está tão preocupado assim?

    Abraços

Obrigado por participar na discussão!

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