Google quer o meu número de telefone.
É uma questão de segurança, dizem.
Com certeza, deve ser isso.
“Estou, sou Google, fala Max?”
“Sim, sou Max”
“Certeza?”
“Certeza”
“Pode jura-lo?”
“Juro”
“Tá bom, então adeus”.
De facto sinto-me mais seguro.
Google sabe muito de mim. Demais.
Blogger. Picasa. Gmail. Chrome. Buzz. Google+.
Falta-me só Orkut.
Diz o Centro de Privacidade de Google:
Existem 5 princípios de privacidade que descrevem a forma como abordamos a privacidade e as informações do utilizador em todos os nossos produtos:
- Utilizar informações para fornecer produtos e serviços valiosos aos nossos utilizadores.
- Desenvolver produtos que reflictam normas e práticas de privacidade eficazes.
- Tornar a recolha de informações pessoais transparente.
- Fornecer aos utilizadores escolhas úteis para proteger a respectiva privacidade.
- Ser um supervisor responsável das informações que mantemos.
Interessante. Só que:
- Eu não quero um produto valioso, eu quero um bom produto que proteja a minha privacidade. Que, por exemplo, não mantenha o histórico das minhas pesquisas. Pois o que procuro na internet é questão minha, não de Google.
- É simples desenvolver produtos que reflictam normas de privacidade eficazes: é só não recolher informações.
- Mas eu não quero a recolha de informações.
- Eu não quero escolhas, quero só uma possibilidade: que os meus dados não sejam recolhidos.
- Mas quem nomeou Google supervisor?
O que sabe Google?
Sabe o meu nome, onde moro, quem são os meus amigos, a quem escrevo, quem me escreve, o que é dito nos e-mail; sabe o que penso, o que digo, o que faço; quais fotografias tiro, onde já fui e com quem. O que gosto, o que não gosto. Qual a minha instrução, as ideia políticas. O que procuro na internet, o que compro na internet.
Com Google nos telemóveis nem estes escapam. Quem ligamos, quem nos liga. Onde estamos. Que fazemos.
Porque utilizar internet significa deixar rastos.
E se um “supervisor” for capaz de recolher estes rastos, em pouco tempo terá um óptimo retrato dos utilizadores. Não é preciso ter um blog onde exprimir as próprias ideias: é suficiente navegar, os rastos são deixados de forma quase inconsciente.
E não falta o nosso aspecto psicológico: ou acham que os joguinhos servem só para nós entreter e gastar alguns trocos (pois há quem gaste dinheiro com isso).
Mas se o Leitor acha Google o problema está enganado, pois Google é apenas um entre os muitos que querem os nossos dados.
O Leitor tem um cartão de crédito? Ou um Multibanco (como se chama no Brasil?)? Então tem ideia da quantidade de rastos que deixa atrás de si?
Com um simples multibanco é possível reconstruir o nosso dia-tipo, com boa aproximação.
Onde tomamos o pequeno almoço, onde abastecemos o carro e com quanta gasolina, a que hora entramos na autoestrada, onde saímos, hora de chegada no parque da empresa, onde, quando e com quem almoçamos, a que hora saímos do parque, em quais lojas compramos, a que hora voltamos para casa, os amigos com os quais saímos à noite, em qual cinema vamos passar duas horas para descontrair.
Porque nos desejamos descontrair, mas entretanto os nossos dados são continuamente recolhidos.
Depois a Brigada de Trânsito diz “Os documentos, s.f.f”.
Mas não sejam ridículos, liguem para o meu banco que ele conta a minha vida toda.
Eu moro em Portugal e aceito com a máxima tranquilidade que os meus dados sejam recolhidos por uma empresa dos Estados Unidos. “Tá bom”, posso pensar, “os Estados Unidos são longe, o que pode acontecer?”.
E os dados dos bancos? Onde acabam? Quem pode lê-los? São mantidos ao longo de quanto tempo?
Os dados recolhidos pelo Multibanco ou pelo cartão de credito não ficam no banco: ficam nos computadores da empresa que gere os cartões, em associação com o banco. Mas quem é esta gente? O que quer?
E a televisão via cabo? Sabe quais programas vejo? Conhece a minha conta Facebook, sabe quais filmes alugo.
E a rede wi-fi?
E o operador do telemóvel?
E o cartão para as portagens?
Quem controla os controladores?
“Ò Max, estás um pouco paranoico, não estás?”.
Talvez.
Obama quer instalar um transmissor rádio na pele dos Americanos? Obama é um idiota, para controlar os nossos movimentos já existe tudo: com internet, um cartão e um telemóvel (que é possível seguir até quando desligado) a nossa vida não tem zonas cinzentas: está tudo em claro, é só preciso ler.
Não é uma assombrosa tecnologia do futuro: é o presente.
Eu posso ser paranoico, mas pergunto: tudo isso é normal?
Se a resposta for “sim”, então eis a pergunta mais importante: quais garantias temos?
Ipse dixit.