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O medo e a faísca

A guerrilha urbana no Reino Unido; as operações da polícia em Espanha contra os “indignados”; o atentado da Noruega; as revoltas na África do Norte; a guerra na Líbia; a eterna guerra no Afeganistão; o nuclear iraniano; a crise económica; o regresso da pandemia; o furacão Irene.

Continuamos? Não, pode ser suficiente assim.

O nosso é um mundo de medo. Um medo que não é natural, mas criado e alimentado de propósito.
Quantos dos factos mencionados acima são “reais” e quantos “criados”?

Vivemos num drama sem fim, adequadamente publicitado pelos media. Não seria correcto analisar de forma separada os vários episódios. Começamos a considerar muitas destas coisas como parte dum conjunto. Ao qual podemos dar um nome: O Colapso da Velha Ordem.

Um colapso natural? Sim, duma certa forma. Mas enriquecido com chamarizes que têm como objectivo alienar a nossa atenção. É preciso anestético para que as pessoas não percebam. Não muito, a maioria já está suficientemente idiotizada: a maior parte do trabalho está feito, o que é preciso é manter a alienação ao nível certo.

Repito mais uma vez: ao longo dos próximos meses será possível observar coisas fantásticas. Em todos os sentidos. “Fantásticas” pois não previsíveis até pouco tempo atrás e “fantásticas” porque fruto da fantasia de quem percebeu que a nossa sociedade tem que dar um passo para frente.
Ou para trás, pontos de vista.


O velho sistema tem a necessidade de renovar-se, com o fim de tornar mais efectivo o próprio poder. O actual sistema político e económico tem mostrado todos os seus limites.

Tem mostrado e foi obrigado a  mostrar: pois seria divertido, por exemplo, re-percorrer toda a história dos subprimes nos Estados Unidos para descobrir como, quando e por quem foi activado o esquema que fez despoletar a Grande Crise em 2008.

É irónico mas é preciso dizê-lo: quem, como este blog, alerta acerca das graves falhas do sistema económico-financeiro, de facto faz o trabalho de quem operou para que a nossa sociedade chegasse até este ponto.

Somos obrigados a denunciar quanto de errado existe neste mundo: mas ao mesmo tempo não podemos esquecer que este trabalho é uma faca de dois legumes.
Eu sei que não é “legumes” mas “gumes”: só que prefiro assim.

Com a consciência de que um simples trabalho de alerta, se não acompanhado por iniciativas concretas, será destinado a favorecer quem desde o início tinha calculado reacções como estas. E “iniciativas concretas” não significa necessariamente descer na rua para gritar “o povo unido jamais bla bla bla”. Aliás, esta seria apenas uma nota de folclore num mundo de alienados.

Iniciativas concretas pode ser muitas coisas: ficar acordados numa sociedade em plena fase Rem já é um óptimo resultado; tentar acordar outras pessoas é excelente; fazer que estes acordados passem a palavra é praticamente um milagre.

Inútil pensar numa nova Revolução Francesa: aqui não faltam as brioches, até há em demasia. E com a barriga cheia, ninguém se mexe.

Voltamos ao principal.

O sistema, de facto, estava podre e sobretudo tinha alcançado os limites. Era precisa uma mudança, que não pode acontecer sem um evento traumático.

Lembramos: a melhor maneira para fazer aprovar medidas odiosas é fazer que sejam as próprias vítimas a exigi-las.

Um exemplo entre os muitos: não foram os Portugueses a escolher o Governo que desde logo deixou claro que o próprio papel teria sido o de passadeira da troika FMI-BCE?

O evento traumático que pode favorecer a mudança é a autodestruição da Velha Ordem. Tudo amplificado pelos media.

Com a representação dos diferentes dramas de vários tamanhos, a tentativa é de fazer que sejam os cidadãos a exigir uma profunda revisão do actual sistema. Assuntos não faltam: mesmo os que parecem ser “desligados” do resto, na verdade contribuem para a criação e a manutenção da mais mortífera das armas: o medo.

Crise económica (desemprego, pobreza), crise climática (desastres climáticos), crise entre as várias civilizações (guerras, terrorismo), crise energética (petróleo, nuclear), crise social (criminalidade, revoltas), crise política (corrupção, má governação), crise sanitária (pandemias). Não falta nada.

Tudo presta para levar a sociedade até o limite. Com a ajuda das falsas oposições, claro, e da autêntica desinformação. Quem costuma seguir este blog, sabe que ao longo do último ano vimos tudo isso: das revoltas manipuladas da África do Norte até a desinformação na guerra da Líbia, estes são apenas os exemplos mais recentes.

Um pouco mais atrás podemos encontrar Wikileaks, as revoluções coloridas do Leste, o assassinato dos engenheiros nucleares do Irão, a morte do Presidente da Polónia e muito mais ainda.

Hoje a Ministra do Trabalho da Alemanha, Ursula von der Leyen, defendeu a criação dos Estados Unidos de Europa, tendo como modelo os Estados Unidos da América.

Que dizer, se é para mudar porque não escolher uma coisa bonita e que, possivelmente, funcione?
Não, o nosso máximo é ficar como os EUA. Depois do American Dream, eis o Sonho Europeu. E que se cuidem os amigos sul-americanos, porque um Sonho do Sul não tardará.

Como acabará?
As fortes probabilidades apontam para que tudo acabe da mesma forma como tinha começado: quem está no poder continuará a estar no poder. Apenas um pouco mais confortável.
E nós? Também nós estaremos aqui, só um pouco menos confortáveis.
Mais pobres e menos livres, de certeza

Mas não gosto de acabar os artigos com notas negativas. Não é a vontade de ser optimista a qualquer custo ou de encontrar o bom onde de bom não há nada.

É que, como costuma dizer-se em Italia: o Diabo faz as panelas mas não as tampas.
Talvez por falta de material, não sei.

A verdade é que este é um jogo de alto risco.
Demonstração: os Estados Unidos criam uma força de 20.000 soldados para presidiar o interior do próprio País. Sinal extremamente claro: o desfecho não está nada certo. Pode ser suficiente uma faísca.

Afinal todos os grandes incêndios começam assim, com uma pequena faísca.

E hoje vou descontrair: vou falar com os peixes.

Nota: espreitem, entre as outras coisas, o blog do amigo Mário Nunes, Kafe Kultura. Há por aí novidades importantes: Ursula von der Leyen, O regresso da gripe aviaria, O furação Irene

Ipse dixit.