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Piri Reis, o Turco

Anteontem o Canal História (se lembro de forma correcta) transmitiu um interessante documentário acerca do mapa de Piri Reis.

Quem trata de coisas “estranhas” já conhece o assunto.
Quem não conhece, pelo contrário, terá um bom argumento acerca do qual reflectir.
Quem não conhece e não liga, pode sempre observar os mapas, bonitos e cheios de cores.
Nem as cores? Tá bom, mas há algo que consiga despertar um mínimo de interesse? Não se pode viver assim, sério, tentem fazer algo.

Dizia: Piri Reis. Mas quem era este fulano?

Piri Reis, o turco

Piri Reis nasceu na cidade de Gallipoli, na Turquia, entre os anos 1465 e o 1470, pois ao que parece na altura era possível escolher a data mais simpática.
O tio dele era Kemal Reis, almirante da Marinha Otomana. Não que isso interesse muito, mas de facto teve consequências na vida do jovem Piri, que decidiu seguir as pegadas do parente.

Piri teve uma vida cheia de viagens e de aventuras, até que um dia aceitou um suborno (vicio antigo este) e o Sultão turco, que era pessoa misericordiosa, fez-lhe cortar a cabeça. O que parece ser uma medida eficaz, pois quem fica decapitado raramente volta a ser pessoa corrupta.


Antes de morrer, Piri teve tempo para acabar a sua obra mais conhecida, o Kitāb-i bahriyyè  que, como todos os Leitores já terão percebido, significa “O Livro do Mar”.
O Livro do Mar seria apenas um entre os muitos portulanos se não fosse por um mapa, hoje conhecido como “O Mapa de Piri Reis”.

Que tem de particular?

A particularidade é a seguinte: compilado entre os meses de Março e Abril de 1513, o mapa reporta as costas ocidentais da América do Sul (na altura ainda desconhecidas: o primeiro europeu a atingir o Chile, por exemplo, foi Magalhães, em 1520) e o Polo Sul.

Não o Polo Sul como hoje é conhecido, mas um Polo Sul sem gelo.
E sem pinguins.

Problema: o Polo Sul sempre foi coberto de gelo nos últimos 30 (trinta) milhões de anos.

Como fazia o bom Piri a:
1. saber que além da América do Sul havia outro continente (descoberta do ano 1820)?
2. conhecer o perfil rochoso de tal continente?

Piri Reis, no seu livro, afirma ter baseado o próprio mapa em documentos mais antigos; os mesmos documentos utilizados por Cristoforo Colombo? É provável.

Hoje sabemos com certeza que na Antiguidade os homens da área mediterrânea tinham ultrapassado os limites do pequeno mar em busca de novas terras.

E de certeza sabemos que os Fenícios seguiram as costas da África atingindo e ultrapassando o Equador.

Heródoto e o Sol do lado errado

A expedição fenícia é digna de grande interesse.

O historiador grego Heródoto relata que o Farão Nechao ordenou que um navio fenício saísse do Mar Mediterrâneo pelo Ocidente (as Colunas de Hércules), circum-navegasse o continente africano até voltar para o Egipto pelo Mar Vermelho.

A exploração teve sucesso? Segundo Heródoto não e a razão é simples: os marinheiros contaram que numa determinada altura o Sol estava no Norte e não no Sul do céu. O que, segundo Heródoto, não fazia sentido.
O Grego não podia saber que esta é a melhor prova do facto que a expedição aconteceu: só quem atravessa o Equador pode ver o Sol no Norte, facto inconcebível no mundo mediterrânico.

Os Fenícios terão também atingido novos continentes? Como a América, por exemplo? Há teorias acerca disso, e talvez algo mais de que simples teorias.

Mas o que interessa agora está relacionado com o mapa de Piri Reis: o navegador turco entrou na posse de antigos documentos fenícios?

Ficção científica

A resposta parece ser “não”. E, em qualquer caso, não foi graças ao povo do antigo Líbano que Piri conseguiu copiar as costas da Antártica, pois na altura dos Fenícios já o Polo estava abaixo de mais de um quilómetro de gelo.

Então, qual a possível explicação?

De facto não existe uma explicação cientificamente aceitável. Por isso a ciência limita-se a ignorar o mapa de Piri Reis (que, é bom lembrar, é absolutamente autêntico, tendo ultrapassado todos os possíveis testes laboratoriais).

Para encontrar uma solução é preciso entrar no mundo da ficção científica. Nada mais, nada menos.

Uma das críticas que o establishment científico fez ao mapa é o facto deste representar os continentes americanos fortemente distorcidos: para ser mais precisos, América do Norte e América do Sul parecem ser mais “estreitos” do que na realidade. Além disso, a América do Sul, na ponta meridional, tende ligeiramente para a direita.

De facto é assim: Piri Reis desenhou os perfis orientais e ocidentais dos dois continentes, mas ambos ficam muito “estreitos”. Um simples erro? Talvez não.

Os mapas que costumamos utilizar são representações da Projecção de Mercator (do nome do cartografo Gerhard Kremer, Gerardus Mercator em Latim). Google Map, por exemplo , utiliza esta Projecção.

Mas a Projecção Mercator é uma representação “cómoda” do planeta, não realística, pois é fortemente distorcida. Os astronautas, por exemplo, não vêem o mundo como num mapa, pois o ponto de vista é muito diferente: eles vêem o mundo com outra distorção, ditada pela curvatura terrestre.

Complicado? Nem por isso.
Observem a seguinte imagem:

Ao utilizar Google Earth, que fornece uma imagem do planeta como poderia ser visto a partir do espaço, a América fica à esquerda e parece bem mais estreita do que na realidade (esquerda).

Mas não é tudo: se “puxamos” um pouco para baixo (imagem à direita), podemos observar que, de facto, a ponta meridional do Sul América aponta para direita. Como no mapa de Piri Reis.

O que significa isso? Que o cartógrafo turco sobrevoou o planeta? Ou que utilizou mapas aéreos velhos de 30 milhões de anos?

Nem uma nem a outra hipótese parece fazer muito sentido.
Assim, temos de ficar com a dúvida, pois o mistério do mapa de Piri Reis permanece sem solução.

Mas antes de acabar, podem espreitar este outro mapa.

Este é um magnífico mapa de Martin Waldseemüller, ano 1507, 6 anos antes do mapa de Piri Reis. Também este é um mapa bem conhecido , pois foi Waldseemüller que aqui chamou “América” aos dois continentes recém descobertos, para lembrar o navegador italiano Amerigo Vespucci que explorou a zona.

No mapa de Waldseemüller encontramos dois pormenores interessantes:

  1. as costas ocidentais da América do Sul são suficientemente definidas, sobretudo tendo em conta que na altura ninguém tinha ainda observado o Oceano Pacífico (encontrado só em 1513 pelo espanhol Vasco Núñez de Balboa).
  2. o istmo de Panamá não existe, estando o Atlântico e o Pacífico em comunicação. Tal como há 3 (três) milhões de anos.

Curioso, não é?

Ipse dixit.

Nota: ambas os mapas podem ser encontrados, com óptima definição, no site da Livraria do Congresso dos Estados Unidos.