Robin Hood e os mortos de fome (“Sem palavras” reloaded): uma iniciativa

Uma pessoa lê certas coisas e depois fica assim.
Assim como? Bah, não sei.

Assim do tipo: com uma vontade de sair para fazer justiça ou de começar a rir.

Eu, que sou uma pessoa pacífica e acho a violência estúpida (pelo menos, a violência contra mim), prefiro rir.
Não é fácil, mas por enquanto é a única solução.

Por enquanto.

O caso da Libéria

A Libéria mais do que um Estado é um conjunto de desgraças. Independente desde 1847, é hoje um País entre os mais pobres do planeta. 3,5 milhões de cidadãos com um rendimento per capita de pouco mais de 200 Dólares. Rendimento anual, claro.

Que pode fazer uma pessoa com pouco mais de 200 Dólares anuais? Além de morrer de fome, entendo.
Em verdade não pode fazer muito.

Mas uma coisa terá que fazer, obrigatoriamente: pagar o Fundo Monetário Internacional.

Sim, leram bem.
Não é o FMI que empresta dinheiro: neste caso é o FMI que, como um vampiro, chupa os poucos Dólares que ainda estão no bolso dos desgraçados Liberianos.

Quantos Dólares? 21,10 % do rendimento. São 47,69 os Dólares que o FMI subtrai da miséria de cada Liberiano, a cada ano.

Isso acontece porque o FMI é financiado com o sistema de percentagens. Cada País tem de contribuir com uma parte do próprio rendimento, calculada tendo como base o dado do PIB (Produto Interno Bruto).
Mas algo deve ter corrido mal nos cálculos. Ou talvez correu demasiado bem, ponto de vista. Porque a Libéria é o País do Mundo que mais contribui em termos de percentagem.

Mas este País não deveria receber ajuda em vez que oferece-la? Deveria. Mas para boa sorte existe o FMI, que não perdoa: “Morres de fome? Tudo bem , mas antes de morrer dá cá o dinheiro”.

A lista

Ao lado a tabela que reporta a lista de todos os Países que participam nesta alegre recolha de fundos para a sobrevivência do Fundo Monetário Internacional.

O quê? É pequena?
Eu sei que é pequena, não sou cego, ora essa. Só que é um ficheiro pesado e muito grande, por isso podem clicar nela para magicamente amplia-la.

A tabela funciona assim: quanto mais alta a posição, mais alta será a percentagem do PIB que o País é obrigado a destinar ao FMI.

Só para rir, vejam quais Países ocupam as posições de topo.

A tabela foi elaborada por Attilio Folliero, com base nos dados fornecidos pelo FMI (dados que já conferi: a tabela é mesmo assim…).

Eu nem comento. Deixo que seja o Leitor a fazer isso.

Apenas uma dica: em caso de dúvidas, lembrem que nós somos os Bons, sempre.

2ª Parte

Escrevi o artigo acima pouco antes de sair de casa. Depois fui comer algo (um kebab!), peguei no carro e fui até um centro comercial. Carrinhos cheios de comida, prateleiras com tudo, necessário e supérfluo.

Fiquei envergonhado. Não deveria ter lido a tabela do FMI mesmo antes de sair. Ou talvez seja mesmo isso que devemos fazer: lembrar que a nossa riqueza é a miséria dos outros.

Eu não quero dar de mim uma ideia errada.
Não sou uma pessoa que passa a própria vida em busca dos Grandes Ideais, não vivo numa caverna a meditar acerca do triste fado humano. E não tenciono flagelar-me ao pensar nas desgraças dos outros.
Sou uma pessoa normal, absolutamente normal.

Mas acho que qualquer pessoa tem o direito e o dever de reflectir; não sempre, mas de vez em quando sim.

Eu abri este blog porque queria dar uma visão um bocado diferente da realidade que é diariamente oferecida. Porque tive a sorte de perceber que efectivamente existe algo de diferente.

Pensava: “Epá,nem tudo está correcto. Vamos falar das duas ou três coisas que estão mal”.
Duas ou três? Meus amigos, a verdade é que comecei a cavar e ainda não parei. E quanto mais cavamos (pois não sei se repararam, mas Vocês cavam comigo!), tanto mais descobrimos coisas revoltantes.

Estava a conduzir e pensava em todas as acções humanitárias, a Cruz Vermelha, os missionários na África: “compre uma caixinha de atum para os pobres Africanos”.
Uma caixinha de atum? Eu compro uma caixinha de atum e o FMI retira-lhe o dinheiro do bolso, estes são os factos.

E atenção: pois ainda uma vez o FMI somos nós.
Não são “eles”, mas nós.

Porque não adianta pensar que não foram eleitos, que “eles é que mandam”. Ao não fazer nada, aceitamos esta realidade. Somos nós, e no blog já falámos disso.

Mas queria que ficasse claro, ainda uma vez, e forma absolutamente incontroversa:

A CULPA É EXCLUSIVAMENTE NOSSA

Nossa e não de outros.

É nossa de quem lê este blog e de quem não lê.
É de quem olha para o ecrã com um sorriso de superioridade, de quem fica preocupado, de quem acha que além do kebab bebi demasiada cerveja (era sumo de coco), de quem continua a achar que sim, é ele mas que afinal os outros são mais culpados.

Não, meus amigos, não há outros mais culpados.

Não digo isso para que o Leitor possa sentir-se um verme. Não adianta caminhar de joelhos sobre os feijões, não resolve nada. Mas se a nossa vontade for mudar alguma coisa, temos que assumir as nossas responsabilidades.

Um exemplo de Portugal.
Nos últimos anos Portugal comprou dois submarinos. Não interessa quem foi, qual o governo: foi A mas poderia ter sido B.
Alguém pode explicar-me o que raio vai fazer Portugal com dois submarinos? Estamos na era da guerra nuclear, informática, biológica; há drones no ar. E Portugal compra dois submarinos? Nem o dinheiro do gasóleo para faze-los funcionar há agora.
Mas temos dois submarinos.

Depois alguém ganhou com isso (empresários privados, políticos…a esquálida história de sempre), mas nem isso interessa. O que queria realçar é que na altura da compra ninguém disse nada. Foi tudo absolutamente normal.

Normal que um País sem dinheiro gaste algumas dezenas de milhões de Euros na compra de armas. Normal que perante um PIB miserável, parte deste seja destinado à compra de armas (inúteis, além disso).

Mas se o PIB é o que é, e se temos obrigatoriamente que deitar dinheiro no lixo, não vale mais a pena fazer alguma coisa para quem sofre? Quem realmente necessita?

Resposta: não, melhor comprar dois submarinos. Esta foi a resposta, implícita mas sempre esta foi.

Este é um exemplo extremamente banal, mas pensem no seguinte: quantos destes exemplos (até bem melhores) podem ser encontrados em cada um dos nossos Países?

E que fazemos nós? Que faz o leitor? 
Resposta: nada.

Nada? Não é verdade. Algo fazemos.
E, de facto, o que fazemos é continuar a eleger pessoas que continuam a fazer que as coisas sigam da mesma forma.
E quando as pessoas não forem eleitas, nós ficamos calados, para não disturbar.

Não há maneira de contornar os factos: a responsabilidade é nossa.

Mas, como antecipei, o meu objectivo não é reunir um grupo de leitores que possam chorar em frente do ecrã. Também porque se começam a chorar não conseguem ver bem o que escrevo. Então escrevo para quem?

Abri um segundo blog, Iniciativas Incorrecta. E foi uma escolha errada nos tempos. Que dizer, abro um blog e Portugal entre em falência.
Digo a verdade: antes de começar a fazer algo era meu desejo ver quais as escolhas feitas.

Talvez seja tempo de pensar em algo diferente. Exumar Iniciativas Incorrectas para fazer não uma série de petições mas apenas uma petição. Não limitada aos Países de língua portuguesa, mas mais abrangente.

Por isso, eis a minha proposta (que vai um pouco contra o que era o propósito original de Iniciativas, mas enfim, na vida temos que mudar também, não é?):  

deduzir dos orçamentos dos Ministérios das Guerras (este o verdadeiro nome dos Ministérios das Defesas) uma percentagem que será destinada à ajuda humanitária.

Que tal?
Eu sei, é utópico. Incompleto. Provavelmente errado, ilógico, populista e um pouco patético também. Nem sei onde apresenta-la. E não terá sucesso.

Mas é sempre uma ideia. E, como sempre, estou pronto para discuti-la, modifica-la, re-pensa-la, re-escreve-la, re-tudo.

Há revoluções por aí fora, verdadeiras ou “criadas”.
Talvez seja altura de começar alguma coisa em internet também (fora dos Facebook da CIA, entendo).
Atrás não há ninguém, e por isso não levará para lado nenhum.

Mas acho ter chegada a altura de experimentar alguma coisa.

Na dúvida, podem sempre ler (ou re-ler) O malabarista e a menina isso para entender o espírito.
O importante não é ganhar mas tentar.

A palavra aos Leitores.
Sejam críticos, e muito. Por favor, não tenham medo de dizer “caro Max, parece-me uma ideia estúpida”.
O que fiz foi atirar uma pedra, agora é só ver qual o efeito.
E das críticas podem nascer boas ideias.
É disso que precisamos.

Ipse dixit.

Fonte: Attilio Folliero

8 Replies to “Robin Hood e os mortos de fome (“Sem palavras” reloaded): uma iniciativa”

  1. Suores frios; aumento da batida cardíaca; uma sensação de querer esmurrar alguém até pedir misericórdia; indignação; espanto; terror; inconformidade; tristeza; fúria…

    Enfim…não sei mais o que sinto depois de ver tal coisa…

    Infelizmente, só nos resta perdoar-lhes, pois no FMI são todos ignorantes…

    É nestas alturas que reforço a minha fé em Jesus Cristo e penso que um dia a justiça será feita…

  2. A mudança deve ocorrer subjetivamente.
    No interior de cada um, através da educação e pensamento, da união de valores e ideiais.

    Vamos começar a mudança, através de nós mesmos, através dos blogs, das redes sociais, do ciclo de amigos, da família, enfim, através de todos os nossos contatos.

    O começo é a parte mais demorada e quase invisível, mas ao longo do tempo pode ser extremamente veloz e efetiva.

    Vamos começar por nós mesmos, através da nossa consciência,
    eu acredito que podemos, sim.
    Estamos em maior número, e nossa união pode ser muito mais poderoza do que o seleto e pequeno grupo elitista que está no topo.

    O poder está nas pessoas.

  3. Não sou violento… não sou totalmente pacífico…

    … mas com certeza não sou passivo…

    Essa visão de quem tem religião… seja os cristãos ou a nova era…

    … um aguarda rezando a volta de Jesus… o outro aguarda dançando e pregando a felicidade a mudança para era de Aquarius…

    Aguardar, aguardar… todos só estamos à aguardar???

    Gostei da indagação de ontem do Max… vamos envelhecer esperando???

    Precisamos pensar numa forma de mudar isso… já!!!

    Nem que para solucinar algo… para si mesmo… ou para sua família…

    … não é possível entrarmos no grupo seleto que não é afetado negativamente pelo sistema…

    … é possível criar um sistema paralelo? No qual nós e nossa família não seja prejudicada???

  4. Até Quando Esperar
    Plebe Rude

    Não é nossa culpa
    Nascemos já com uma bênção
    Mas isso não é desculpa
    Pela má distribuição

    Com tanta riqueza por aí, onde é que está
    Cadê sua fração
    Com tanta riqueza por aí, onde é que está
    Cadê sua fração

    Até quando esperar

    E cadê a esmola que nós damos
    Sem perceber que aquele abençoado
    Poderia ter sido você
    Com tanta riqueza por aí, onde é que está
    Cadê sua fração
    Com tanta riqueza por aí, onde é que está
    Cadê sua fração

    Até quando esperar a plebe ajoelhar
    Esperando a ajuda de Deus
    Até quando esperar a plebe ajoelhar
    Esperando a ajuda de Deus

    Posso
    Vigiar teu carro
    Te pedir trocados
    Engraxar seus sapatos
    Posso
    Vigiar teu carro
    Te pedir trocados
    Engraxar seus sapatos

    Sei
    Não é nossa culpa
    Nascemos já com uma bênção
    Mas isso não é desculpa
    Pela má distribuição
    Com tanta riqueza por aí, onde é que está
    Cadê sua fração
    Com tanta riqueza por aí, onde é que está
    Cadê sua fração
    Até quando esperar
    A plebe ajoelhar
    Até quando esperar
    A plebe ajoelhar
    Esperando a ajuda do divino Deus

  5. aqui em santos, brasil, li.
    e gostei!
    a idéia é boa e é para ser considerada.
    antigamente a pena era mais poderosa que o canhão. agora é a vez do teclado.
    emerson57

  6. “Nunca duvide de um pequeno grupo de pessoas determinadas a mudar o mundo, pois, no final das contas, talvez sejam elas as únicas capazes de fazê-lo”

    Na verdade é isso que tem acontecido sempre.

    Temos que ter iniciativa e atitude!

Obrigado por participar na discussão!

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