Argentina: Cristina e o espectro da inflação

A Argentina é um País que sempre me atraiu.

E não sei porque: afinal o que conheço dele é mesmo pouco: lugares comuns (o tango), alguma coisa acerca da música contemporânea (Soda Stereo, Nexus, Invisible), a Guerra das Malvinas, pouco mais.

Mas a Argentina é também um exemplo dos excessos da economia moderna. Obrigada a declarar default em 2001, mostra os possíveis cenário que, cedo ou tarde, poderiam tornar-se realidade em outras partes do Mundo.

Não sei porque, mas mesmo agora lembro de Países quais a Grécia, a Irlanda, Portugal…ahhh, não, desculpem: “A situação de Portugal não é comparavael a da Grecia”.

Tinha esquecido.

Uma questão de dados

As forças de oposição da Argentina afirmam que o governo da Presidente Cristina Fernandez Kirchner está a manipular os principais dados estatísticos para re-dimensionar a real inflação do País.  

Uma queixa que enfraquece ainda mais a credibilidade da administração, alguns dias após a publicação dos relatórios do Governo sobre o trabalho infantil, a pobreza crónica e o desemprego no País. 

Os dados oficiais apresentados pelo (Instituto Nacional de Estadística y Censos) não convencem.

Analistas independentes dizem que ano passado a inflação tinha sido de 23,5% e que as expectativas para este ano são da ordem de 25-30%. Em vez disso, o Governo publicou um dado que ronda 9% (9,75% o dado preciso), que todos, eespecialistas e cidadãos, julgam ser impossível perante uma situação económica desoladora. 

E a Sra. Kirchner não é o único alvo das críticas. Também no centro das atenções estão Ana Maria Edwin, o Ministro da Economia, que nega o facto da inflação representar um problema, e o Secretário do Comércio Interno, Guillermo Moreno, acusado de abuso de autoridade por ter literalmente perseguido e intimidado economistas autores de estudos não em linha com a visão oficial.

Os números independentes estão baseados na análise fornecida por oito consultores independentes, elaborados através dos dados emitidos pelas Províncias, que mostrando taxas de crescimento (da inflação, claro) muito maiores do que reportado oficialmente, das associações de consumidores e dos sindicatos, que na negociação salarial procuram aumentos na casa de 30%.  

Tudo muito longe da imagem oficial espalhada em Buenos Aires. 

Os Argentinos? “Já vimos…”

Se estas estimativas independentes estiverem confirmadas, a Argentina seria de facto um dos Países com a inflação mais alta do Mundo.  

No entanto, a população não invade as ruas, como aconteceu no mundo árabe e na Grécia. 

E a razão é dupla.

Em primeiro lugar, os Argentinos têm vivido um período de real hiperinflação, na década de ’80, comparado com a qual a situação actual é pouco mais de que uma brincadeira.

 As pessoas estão acostumadas a ver os preços subir: nos anos ’80 subiam com ritmo diário. 

A segunda razão é que, apesar de tudo, a economia está a crescer graças aos aumentos de preços de algumas commodities das quais a Argentina é produtora. Isto permitiu até agora “compensar” a inflação com substanciais aumentos de salários que, embora não completamente em sintonia com a inflação, têm garantido que a perda do poder de compra não seja tão evidente.

Embora seja uma perda substancial, se pensarmos que as famílias argentinas gastam 40% dos rendimentos na compra de bens essenciais. 

Por isso os filhos são enviados para o trabalhar. Um relatório de 2010 da Universidade Católica estima que 17,6% das crianças entre 5 e 17 anos é forçada a trabalhar para ajudar a sustentar a própria família. E 8,2% não frequenta a escola porque demasiado envolvido em actividades domésticas que os Pais não podem executar por causa dos trabalhos duplos e triplos. 

A Argentina, é bom lembrar, entrou em default (bancarrota) em 2001 e uma gestão não idela da situação deixou marcas.

Liberalização + Privatização + Dólar = Default

Durante anos, Buenos Aires tinha sido indicada como um exemplo a seguir em termos de liberalização económica e de privatização. 

Liberalização selvagem, privatização e a seguir a declaração de incapacidade para honrar os compromissos financeiros. 

Nos mercados foi um choque, mas para o País foi a solução para sair duma estagnação perigosa. 

 O governo negociou a reestruturação da dívida (30%), abandonou a taxa de câmbio fixa com o Dólar, desvalorizado a moeda, o Peso.  

Resultado? A economia argentina cresceu 63% em seis anos.  

Mas nem todos beneficiaram da recuperação. A desvalorização, como era previsível, gerou uma espiral inflacionária.  

Muitas famílias tinham os salários em Pesos mas os contratos de arrendamentos em Dólares e foram forçadas a abandonar as casas. Assim nasceram os cartoneros, pessoas que perderam as casas, postos de trabalho e passaram a viver nas ruas. 

Os trabalhadores mais previdentes convertiam os salários em Dólares (no mercado negro), enquanto ss ricos, que tinham contas no estrangeiros e em Dólares, tornaram-se mais ricos desfrutando o efeito da taxa de câmbio e compraram muitas propriedades abandonadas. 

Em resumo, para muitos o renascimento da Argentina significou apenas miséria e sofrimento. 

O que assusta da situação actual é a evidente analogia entre 2001 e o presente, a divergência entre as condições macroeconómicas e as das famílias.  

A questão da distribuição iníqua da riqueza, além do factor pobreza, são o objecto principal da luta política entre a Administração Kirchner e a oposição.  

Mas, como sempre nestes casos, não está claro se as acusações são baseadas num real compromisso para proteger as classes mais baixas ou se é apenas demagogia em vista das próximas eleições presidenciais. 

Invisible: El Jardín de los Presentes 

Las Golondrinas de Plaza de Mayo é uma canção dos Invisible.

Publicada em 1976, faz parte dum grande album, El Jardín de los Presentes, e fala de liberdade num aaltura em que a Argentina encontrava-se oprimida pelo regime militar.

Ipse dixit.

Fonte: GeoPoliticaMente

2 Replies to “Argentina: Cristina e o espectro da inflação”

  1. Não precisávamos de evidências histórica? Tá ae um exemplo do que não deve ser feito em situação default. Essa equiparação do peso com o dólar parece ter tido grandes cifras mas com pouco efeito prático para a população. Em tempos de falência, já sabemos qual hipótese descartar, ou então modificar.

    E valeu pelo som. To precisando aprender espanhol jeje

  2. Se aceitarmos o facto que a formula para se obter a "inflação" em economias como a Americana e seus "descendentes" espelha tudo menos a real inflação… então não podemos olhar para a Argentina e criticarmos os dados que eles debitam… Tudo é uma fraude numérica para manter um sistema impossível de manter a "funcionar"… No fim quem acaba sempre por se lixar é o povinho! Para não variar!

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