O paquiderme de Bruxelas

Tranquilos: este não é um outro artigo acerca das vacinas. Parte das vacinas para espreitar o funcionamento da União Europeia. Ou a falta de funcionamento. Porque assistir aos noticiários aqui do burgo durante as últimas semanas significava ficar com a ideia de que a coisa melhor era preparar uma festa: Bruxelas estava a gerir a questão das vacinas duma forma exemplar, isso sem falar do dinheiro que está a chegar de borla (?), tipo chuva. Estávamos em boas mãos, possivelmente as melhores em circulação.

Agora a maré mudou e começam a surgir as primeira críticas. Merecidas. Até demasiado brandas. Bruxelas mexeu-se com o estilo que lhe é próprio, já uma tradição: o estilo do paquiderme confuso. A pesada máquina fadiga a mexer-se e cada decisão tem que ser discutida inúmeras vezes. Depois, uma vez alcançado o acordo, é altura de tornar tudo uma lei que funcione. Outro sofrimento.

Não admira que esta Europa “unida” ainda não tenha um política exterior comum e provavelmente é melhor assim: ainda estaria a discutir o que fazer em relação à Guerra do Golfo. O caso das vacinas é apenas a última demonstração da incapacidade europeia. Mas a incapacidade não é de borla: neste caso pode custar até 90 mil milhões de Euros. Dinheiro dos contribuintes, óbvio. E os contribuintes somos nós.

Não entramos aqui na questão da eficácia das vacinas. Por uma vez, como mera hipótese, admitimos que funcionem e que sejam a melhor arma para combater a Covid-19: afinal este é o ponto de vista oficial de Bruxelas, justo? Mas se assim for, por qual razão somos os últimos?

Estamos atrás dos Estados Unidos, onde governava o malvado Donald Trump.

Fizemos pior, em termos de aquisições, do que a Grã-Bretanha e isto é realmente o topo: lembram-se de quando era afirmado que com a Brexit Londres teria sofrido uma tremenda escassez de medicamentos? Pois.

Depois há a Rússia: foi gozada e acusada de falsidade quando o seu Presidente anunciou que tinha encontrado a vacina. Agora todos querem replicar aquele produto, já ninguém goza e em breve será fabricado no território da União Europeia.

Numa mistura de arrogância, improvisação e burocracia, Bruxelas conseguiu fazer pior. O seu organismo de controlo de medicamentos (a EMA), aquele que autoriza e monitoriza os remédios, levou meses a dar luz verde ao que outros tinham autorizado antes e sem por isso ter uma maior certeza sobre a eficácia e os efeitos secundários das vacinas, pois os estudos apresentados eram exactamente os mesmos. A razão? A EMA não dispõe dos procedimentos necessários para controlar o desenvolvimento de um medicamento em caso de emergência. Exactamente o que EUA, Reino Unido e Rússia têm e aplicam.

Depois foi anunciada a formação do grupo de aquisição com todos os Estados-membros porque, como sabemos, “a união faz o força”. Na verdade, Bruxelas chegou só depois de alguns Países (Italia, França…) já terem iniciado conversas com as farmacêuticas. Mas o atraso foi esquecido então em frente, todos no mesmo barco. E logo foi descoberto que alguém (Berlim) tinha jogado em duas mesas ao mesmo tempo, negociando com o grupo “que faz a força” e, paralelamente, por conta própria também. Isso fornece a ideia da confiança que circula.

Acrescente-se a isso o facto de termos levado mais tempo para assinar contratos do que outros sistemas nacionais. Repito: estes eram e ainda são as pessoas que acreditam na vacina, que não têm a mínima dúvida acerca da bondade delas. Lembram-se da piada de Kissinger que suspirava perante a impossibilidade de pegar no telefone e falar com alguém que realmente contasse alguma coisa em Bruxelas? Não era uma piada.

Os atrasos na entrega do precioso medicamento: culpa das casas farmacêuticas? Em parte sim, sem dúvida. Mas em parte a culpa é de Bruxelas. O Financial Times é impiedoso: os atrasos no fornecimento da vacina AstraZeneca à União Europeia estão relacionados ao facto das instalações da farmacêutica nos Países Baixos não terem recebido a licença de fornecimento por parte da Agência Europeia de Medicamentos (sempre ela, a EMA). Isso numa primeira fase.

Numa segunda fase, quando finalmente o medicamento da AstraZeneca chegou, eis o alarme: as vacinas da AstraZeneca matam. Podemos pensar: “também as outras”. Sim, mas as da AstraZeneca matam mais. E os dados? Já sabemos: 30 tromboses num total de 16 milhões de doses subministradas. Uma percentagem absolutamente normal, sobretudo consideradas as faixas etárias dos cidadãos vacinados. Os Estados-membros: defendem a vacina? Nem por isso. Primeiro foi a Dinamarca (bem dois casos de trombose em todo o País), a seguir foram os outros: vacina da AstraZeneca bloqueada.

Como vimos, a vacina da AstraZeneca tem uma lista de efeitos adversos que não tranquilizam muito e até agora conseguiu 451 mortos em dois meses escassos de utilização (desde 29 de Janeiro). Mas a vacina da Pfizer, subministrada a partir do final de Dezembro (dia 29), já coleccionou 2.540 mortes em menos de três meses, o que dá uma média de 846 mortos por mês. O que não é nada mal.

O que distingue a AstraZeneca é sem dúvida o grande número de reacções adversas não resolvidas ou resolvidas com sequelas. Mas estes dados estavam disponíveis já no estudo apresentado à EMA, o ente que regula os fármacos no Velho Continente: era não apenas previsível mas até esperado um resultado como este. Então por qual razão foi aprovada?

Até seria ridículo não fossem os mortos envolvidos, as pessoas que ficaram com sequelas irreversíveis e até, como antecipado, os custos. Se a vacina salvar vidas, então o custo do atraso foi também humano (mortes).

Diário La Repubblica:

AstraZeneca, EMA rumo ao sim. Cuidado com os efeitos secundários. Espera-se hoje o veredicto dos peritos. Possível advertência na bula, embora os eventos adversos sejam extremamente raros.

“Sim”? Então, as 30 tromboses já não valem? Foi travado um medicamento para quê? Principio de precaução? Não, não há princípio de precaução quando já o estudo do produtor realça a forte incidência de graves reacções adversas: há o principio de estupidez se depois o fármaco for retirado por causa do elevado número de graves reacções adversas.

Sobrevoamos acerca daquele “embora os eventos adversos sejam extremamente raros”, descaradamente falso (lembro: é o mesmo estudo da AstraZeneca que admite a forte incidência de graves reacções adversas) e falamos da bula: “possível advertência”. Vamos advertir acerca do quê? Qualquer bula, de qualquer medicamento, contém advertências: sobre-dosagem, possíveis efeitos adversos… é normal que assim seja e a vacina AstraZeneca não é uma excepção.

A bula da vacina é disponível em versão portuguesa no portal da EMA. O documento já prevê:

4.3 Contraindicações

4.4 Advertências e precauções especiais de utilização (rastreabilidade, hipersensibilidade e anafilaxia, reações relacionadas com ansiedade, doença concomitante, trombocitopenia e perturbações da coagulação, indivíduos imunocomprometidos, Uso em idosos, Uso durante a gravidez e lactação.

4.8 Efeitos indesejáveis, secção acompanhada por uma tabela que inclui as reacções muito frequentes, frequentes, pouco frequentes, raras, muito raras e desconhecidas.

Verdade, na lista dos efeitos indesejáveis falta a trombose, mas se o medicamento for aprovado é porque a trombose não pode ser directamente relacionada à vacina. Vamos inserir algo como “Foram relatados casos de trombose que todavia não puderam ser relacionados ao uso do medicamento”? Isso não faz sentido. Ou algo mais genérico tipo “Alguns morreram mas é melhor não ligar”?

Depois há o lado económico: as vacinas custaram à Europa 22 biliões de Euros. E isto era mais ou menos conhecido. Mas os Países europeus têm um atraso de várias semanas na subministração destes medicamentos e isso pode gerar uma perda de cerca de 90 mil milhões de Euros, equivalente a cerca de quatro vezes o valor dos contratos assinados. Porque o atraso significa mais confinamento, mais actividades fechadas e uma economia que continua em coma profundo.

Turismo? Nem pensar. Aliás, pensamos nisso: a UE tenciona introduzir uma espécie de passaporte “verde” (tudo tem que ser verde nesta altura): quem for vacinado pode apresentar o passaporte e deslocar-se livremente pelos vários Países. Genial. E os que não forem vacinados? Nada de passaporte, óbvio. Então testes, quarentena, etc.

Mas a campanha de vacinação procede segundo determinados parâmetros, as chamadas faixas prioritárias: médicos e paramédicos antes, depois faixas etárias de maior risco, etc.. No meu caso, não tendo qualquer doença crónica e não estando no grupo de maior risco, quando deveria ser vacinado (o condicional é obrigatório pois recuso a vacina)? Ninguém sabe. No futuro, talvez ainda antes do Verão, talvez não. E os mais jovens? Ainda pior, ficam atrás de mim por uma questão de idade. Mas isso significa que uma pessoa que deseje ser vacinada (porque convencida de que o remédio funcione ou simplesmente porque quer deslocar-se para o estrangeiro) de facto estará impedida de sair do seu País ao longo dos próximos meses, talvez até o próximo Outono. Principio de igualdade? Não há.

Tudo isso tem um custo enorme que é extremamente difícil de quantificar. E a verdade é que a União Europeia respondeu e ainda está a responder à emergência com um caminho cheio de dúvidas. O caso AstraZeneca é paradigmático: resume em si todas as contradições de Bruxelas. Ursula von der Leyen, a Presidente da União Europeia, faz lembrar o condutor dum elefante adormecido que recusa admitir o que todos podem ver: o bicho dorme, de vez em quando mexe um pouco a tromba mas basicamente dorme. “Não que não está a dormir”, responde Ursula “é apenas a sua maneira de resolver as situações de emergência. E funciona maravilhosamente bem!”. A pergunta é: o que está escondido debaixo do elefante?

 

Ipse dixit.

5 Replies to “O paquiderme de Bruxelas”

  1. Para se proteger das moscas (que o incomodam) enquanto dorme, o paquiderme cobre-se de terra e esterco…
    Lá debaixo não será mais do mesmo?

  2. Grande Max,

    Ao ler as tua linhas até se pode ficar a pensar que a UE não é liderada por alguém, quando o que se passa é que é fortemente liderada, só que os donos estão do outro lado do Atlântico, basta olhar para a evolução do PIB. A zona euro não começou por ser o maior bloco económico do mundo? Penso que na UE sucedeu o mesmo que já tinha acontecido no Japão uma década antes, a segunda maior economia da Mundo é agora três vezes mais pequena do que a China, Parece haver aqui uma tendência histórica que nos garante que os países próximos dos EUA são dissolvidos, pelo menos desde que o Reino Unido perdeu o maior império do Mundo. Mais um exemplo, a Índia que mantém na miséria mais abjecta centenas de milhões de pessoas. Temos uma outra via, a China e a Rússia que ao manter a soberania garantiram os direitos humanos das respectivas populações…

  3. “O que está escondido embaixo do elefante?”. Depende do que você queira ver. Sem considerar o fator conspiração, tudo se torna muito contraditório, ilógico, e aparentemente incompreensível. Agora, mesmo que você reconheça algo conspiratório, isso não significa que você identifique como este processo é conduzido, porque, obviamente, trata-se de conspiração e não de uma teoria diversionista.

  4. Uma coisa é certa, a Itália tem que dar uma resposta à humilhação e abandono que sofreu por parte da união europeia (ue) na fase mais crítica da pandemia provocada pela doença do coronavírus covid-19.

    Se não fosse a Federação da Rússia (FR) a oferecer ajuda ao governo Italiano teria sido uma catástrofe.

    Depois de ser efectuado o empréstimo financeiro de Bruxelas aos Estados-membros, e o dinheiro cair nas contas, veremos o que vai acontecer à união europeia (ue), e como já aqui escrevi a Itália poderá abandonar esse organismo dando início ao colapso do mesmo, para felicidade de todos nós.

    A união europeia (ue) é um projecto Inglês, nunca foi um projecto Europeu, nem tão pouco uma organização económica onde os países que a integram colaboram entre si numa perspectiva de ganha-ganha, muito pelo contrário, é um projecto político ditatorial Anglo-Saxónico, globalista, e neoliberal, que pretende destruir os Estados-Nação Europeus, os seus povos e culturas.

    1. Projeto inglês ?!?! E quem são os tais ingleses além de serem originários dos germanicos anglos e saxoes? A linguiça tá bem mais abaixo nesse pirão. Uma linguiça quase invisível aos olhos dos opiniaticos de plantão.

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