Economia para a Paz da China – O Fim da Hegemonia do Dólar

Artigo publicado pelo jornal New Eastern Outlook, da autoria de Peter Koenig, analísta geopolítico e ex-economista do Banco Mundial (BM) e da Organização Mundial de Saúde (OMS).

 

Sob a filosofia da China, o mundo uniteral pode transformar-se num mundo multipolar.

A China, há cerca de uma década, deliberadamente embarcou numa Economia de Paz. Uma estratégia que a China segue, sem se impressionar pelas constantes agressões do Ocidente, que são lideradas principalmente pelos Estados Unidos.

É talvez essa maneira Chinesa firme e não agressiva de criação constante e o abraçar de cada vez mais aliados pelo seu caminho – que fez da China uma história de sucesso? Superar a violência por não-violência está enraizado em 5000 anos de história Chinesa.

Apesar das afirmações incansavelmente repetidas pelo Ocidente, o objectivo da China não é conquistar o mundo ou «substituir» os Estados Unidos como o novo império. Muito pelo contrário. A aliança China-Rússia e a Organização de Cooperação de Xangai (Shanghai Cooperation Organisation pela sua sigla em Inglês, ndt.) busca um mundo multipolar, com mais justiça para todos – ou seja, comércio mais justo no sentido de «ganha-ganha», onde todas as partes igualmente se beneficiam.

Esta é também uma política seguida pela recém assinada Parceria Económica Regional Abrangente, ou RCEP (Regional Comprehensive Economic Partnership pela sua sigla em Inglês, ndt.), o acordo comercial de 15 países assinado na 37ª Cúpula da ASEAN – 11 de Novembro de 2020, no Vietname, bem como pela Iniciativa Um Cinturão, Uma Rota (Belt and Road Initiative pela sua sigla em Inglês, ndt.) do Presidente Xi, lançada em 2013 pelo próprio presidente.

A China não força a cooperação – mas oferece uma cooperação pacífica. Em 2014, o Presidente Xi Jingping viajou para a Alemanha para oferecer a Madame Merkel que a Alemanha se tornasse – na época – a ligação mais ocidental com o ICR (Iniciativa Um Cinturão, Uma Rota, ndt.), ou a Nova Rota da Seda (New Silk Road pela sua sigla em Inglês, ndt.).

Isto teria sido uma abertura para toda a Europa.

No entanto, Madame Merkel, tendo que seguir os mandatos de Washington, não respondeu positivamente.

O Presidente Xi Jinping voltou a Pequim, sem ressentimentos. E a China continuou o seu percurso persistente de conexão dos países da nossa Mãe Terra com infraestruturas de transporte, empreendimentos industriais entre países, projectos de educação e pesquisa, bem como intercâmbios culturais para enriquecer o mundo – respeitando o tempo todo a soberania monetária e política de cada país.

Muitos líderes de países da África e do Sul Global em geral expressam abertamente o seu contentamento e satisfação em ter a China como parceira e por lidarem com a China com base na igualdade.

Com o Ocidente, especialmente os EUA, há assédio e coerção, contratos desiguais e muitas vezes, total desrespeito por contratos legalmente assinados.

Enquanto isso, o Ocidente vive num estado permanente de hipocrisia.

Ataca a China – na verdade sem qualquer razão, mas a mando do moribundo império Anglo-Saxão-Americano, especialmente os aliados Europeus da OTAN – sob ameaças de sanções. Infelizmente, a Europa cobarde cumpre em conformidade.

No entanto, tendo terceirizado – por razões económicas e de lucro – a maioria dos processos de produção para mão-de-obra confiável, eficiente e mais barata na China, o Ocidente depende muito da China para as suas cadeias de suprimentos. A crise da covid, a primeira vaga, mostrou claramente o quão dependente o Ocidente é em bens produzidos na China, de equipamentos electrónicos sofisticados a produtos farmacêuticos.

Como exemplo: cerca de 90% ou mais de antibióticos ou ingredientes para antibióticos são Made in China. Percentagens semelhantes aplicam-se a outras vitais importações ocidentais. – Mas a China não “pune” nem sanciona. A China cria e avança oferecendo a sua aliança para o resto do mundo.

A China também desenvolveu uma nova Renminbi (Moeda oficial da China, ndt.) digital e internacional ou Yuan que pode ser lançado em breve para uso de transacções monetárias – de todos os tipos, incluindo transferências, comércio e até como moeda de reserva.

O yuan já é uma moeda de reserva cada vez mais forte. Essa tendência será aprimorada ainda mais através da RCEP (Regional Comprehensive Economic Partnership pela sua sigla em Inglês, ndt.) e da ICR (Iniciativa Um Cinturão, Uma Rota, ndt.).

É claro que os EUA temem que a sua hegemonia do dólar que construíram desde a Segunda Guerra Mundial com o dinheiro Fiat sem garantias, e que o cartel bancário Anglo-Americano praticamente impôs ao mundo, possa sofrer como moeda comercial internacional e chegar ao fim; a posição do dólar Americano como moeda de reserva pode cair rapidamente.

E sim, o yuan poderia gradualmente substituir o dólar Americano como moeda de reserva – e isso – porque os tesoureiros dos países percebem que o yuan é uma moeda estável, com garantia no ouro, e também apoiada por uma economia sólida – é a única economia no mundo que crescerá no ano covid de 2020, talvez até 3,5%, enquanto que as economias Ocidentais terão uma séria contracção.

As previsões são terríveis para os EUA e a Europa, entre 12% (previsões da União Europeia) e até 30% / 35% (previsão do FED dos EUA).

O dólar Americano e o seu domínio sobre o sistema de transferência internacional através do SWIFT – tem sido usado maciçamente para sancionar os países que não estão em conformidade, incluindo confisco totalmente ilegal de activos – até mesmo de países que reservam activos – como é o caso da Venezuela.

Escapar desse domínio coercitivo do dólar é o sonho de muitos países. Portanto, negociar, investir e lidar com a moeda Chinesa será uma oportunidade bem-vinda para muitas nações soberanas.

As conquistas económicas e as perspectivas projectadas pela China podem ser resumidas em dois grandes eventos ou programas globais:

O acordo de livre comércio recentemente assinado com 14 países – os 10 países da ASEAN (Associação de Nações do Sudeste Asiático, ndt.), mais o Japão, Coreia do Sul, Austrália e Nova Zelândia, ao todo, incluindo a China 15 países.

A chamada Parceria Económica Integral Regional (Regional Comprehensive Economic Partnership pela sua sigla em Inglês, ndt.), ou PEIR, esteve em negociações durante oito anos – e conseguiu reunir um grupo de países para o livre-comércio, de cerca de 2,2 bilhões de pessoas, comandando cerca de 30% do PIB mundial.

Este é um acordo nunca antes alcançado em tamanho, valor e teor.

Além do maior acordo comercial da história da Humanidade, também se liga à Iniciativa Cinturão e Rota (ICR), ou Iniciativa Um Cinturão, Uma Rota, que por si só compreende já mais de 130 países e mais de 30 organizações internacionais.

Também a China e a Rússia têm uma parceria estratégica de longa data, contendo acordos bilaterais que firmam essa nova dupla comercial – além dos países da União Económica da Ásia Central (Central Asia Economic Union pela sua sigla em Inglês, ndt.), constituídas principalmente pelas antigas Repúblicas Soviéticas, integradas neste bloco comercial oriental.

A miríade de acordos e sub-acordos entre países Asiáticos-Pacíficos que vão cooperar com a PEIR (Parceria Económica Integral Regional, ndt.), é vinculada pela Organização de Cooperação de Xangai (Shanghai Cooperation Organization pela sua sigla em Inglês, ndt.), fundada em 15 de Junho de 2001 em Xangai como uma organização intergovernamental, composta pela China, Rússia, Cazaquistão, Quirguistão, Tajiquistão e Uzbequistão. A SCO (Shanghai Cooperation Organization pela sua sigla em Inglês, ndt.) é pouco conhecida e pouco falada no Ocidente.

O objetivo da SCO (Shanghai Cooperation Organization pela sua sigla em Inglês, ndt.) é garantir a segurança e manter a estabilidade em toda a vasta região da Eurásia, unir forças para combater os desafios e ameaças emergentes e melhorar o comércio, bem como a cooperação cultural e humanitária.

Grande parte do financiamento para os projetos PEIR (Parceria Económica Integral Regional, ndt.) e ICR (Iniciativa Um Cinturão, Uma Rota, ndt.) pode vir na forma de empréstimos com juros baixos do Banco Asiático de Infraestrutura e Investimento (Asian Infrastructure and Investment Bank pela sua sigla em Inglês, ndt.) da China e de outras fontes de financiamento Chinesas e nacionais de outros países e participantes.

Nos tempos difíceis que vão emergindo da crise covid, muitos países podem precisar de assistência e de subvenção para poder recuperar-se o mais rapidamente possível das suas enormes perdas socioeconómicas, criadas pela pandemia.

Nesse sentido, é provável que a nova Rota da Seda (New Silk Road pela sua sigla em Inglês, ndt.) possa suportar uma «Estrada da Saúde» especial em todo o Continente Asiático.

A PEIR (Parceria Económica Integral Regional, ndt.) pode, como «subproduto», integrar o enorme continente da Eurásia que se estende desde o Oeste da Europa até o que é chamado de Ásia e abrangendo o Oriente Médio, bem como o Norte da África, de cerca de 55 milhões de quilómetros quadrados (km2), e uma população de cerca de 5,4 bilhões de pessoas, cerca de 70% da população mundial – Ver mapa (Wikipedia).

O ponto crucial dos acordos comerciais da PEIR (Parceria Económica Integral Regional, ndt.) é que serão realizados em moedas locais e em yuan – sem dólares Americanos. A PEIR (Parceria Económica Integral Regional, ndt.) é um instrumento maciço para desdolarizar, principalmente a Região Ásia-Pacífico, e gradualmente o resto do mundo.

Grande parte dos investimentos em infraestrutura da ICR (Iniciativa Um Cinturão, Uma Rota, ndt.), ou Nova Rota da Seda (New Silk Road pela sua sigla em Inglês, ndt.), pode ser financiada por outras moedas em vez do dólar Americano.

O novo Renminbi digital (RMB) ou yuan da China pode em breve tornar-se uma oferta legal para pagamentos e transferências internacionais, e reduzirá drasticamente o uso do dólar Americano.

O dólar Americano já está em declínio maciço. Quando cerca de 20-25 anos atrás cerca de 90% de todos os activos de reserva em todo o mundo foram denominados em dólares Americanos, essa proporção encolheu hoje para menos de 60% – e continua diminuindo.

O emergente RMB/yuan internacional, juntamente com uma economia chinesa reforçada pela PEIR (Parceria Económica Integral Regional, ndt.) e a ICR (Iniciativa Um Cinturão, Uma Rota, ndt.), pode contribuir ainda mais para uma desdolarização, bem como para a perda da hegemonia dos Estados Unidos no mundo.

E como dito anteriormente, o RMB/yuan digital internacional pode também estar progressivamente substituindo o dólar Americano, bem como as reservas de euros nos cofres dos países em todo o mundo. O dólar americano pode eventualmente voltar a ser apenas uma moeda local dos EUA, como deveria ser.

Sob a filosofia da China, o mundo unilateral pode transformar-se num mundo multipolar. A combinação PEIR (Parceria Económica Integral Regional, ndt.) e Nova Rota da Seda (New Silk Road pela sua sigla em Inglês, ndt.) estão perseguindo rapidamente este nobre objectivo, um objectivo que trará ao mundo muito mais equilíbrio.

Talvez por mais alguns anos, o Ocidente, liderado pelos EUA – e sempre apoiado pelo Pentágono e pela OTAN, não possa esquivar-se de ameaçar países que participam dos projectos da China, mas sem sucesso.

Sob a filosofia de Tao, a China avançará com os seus parceiros, como a água que flui progressivamente, constantemente criando, evitando obstáculos, em busca do seu objectivo honroso – um mundo em Paz com um futuro comum brilhante.

 

Fonte: New Eastern Outlook

Artigo seleccionado e traduzido por JF.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

5 Replies to “Economia para a Paz da China – O Fim da Hegemonia do Dólar”

  1. “…Sob a filosofia de Tao, a China avançará com os seus parceiros, como a água que flui progressivamente, constantemente criando, evitando obstáculos, em busca do seu objectivo honroso – um mundo em Paz com um futuro comum brilhante. … ”

    Excelente artigo meu caro , adorei , adorei, adorei a epístola de Peter Koening artigo supostamente sobre economia consegue-nos em algumas partes elevar espiritualmente com uma profundidade quase religiosa, fiquei até com um lágrima no canto do olho, é lindo, comovente até , em algumas passagens senti me levitar e consegui ouvir um coro de anjos ecoando suavemente nos meus ouvidos . ( fdx não deveria ter bebido tanto…)
    Obviamente os gajos de Taiwan e Hong Kong são uns retardados … quem não gostaria de ser governado assim ? E os arruaceiros Tibetanos e Uigures de que se queixam ? Hã? Enfim … ter olhos e não ver é pior que ser cego …

  2. Olá Max: noooossa, não precisa por a China encima de um pedestal, nem tão pouco a ponto de ver só falsos interesses.
    A China, do meu ponto de vista apenas está usando das suas competências para, sem militarismo, tornar-se o país mais rico e forte do mundo.
    Mas as guerras não se fazem só com blindados, soldados e mercenários. A China, está em guerra , disputando o monopólio dos transportes, dos portos e de toda logística decorrente. A Nova Rota da Seda é um empreendimento monumental tão velho como a China da Antiga Rota da Seda.
    Me parece que, se os países africanos, por exemplo, tem o benefício das novas rodovias e ferrovias, pontes e canais, isso não cai por acaso aos pés dos governantes africanos. Com juros mais baixos, a dívida destes países pertence à China, que passa pelos lugares determinados e de interesses chineses, desloca e causa problemas para as pessoas por onde corre o transporte.
    Claro que barateia os produtos transportados em menos tempo, e cria novas chances e oportunidades para muitos.
    Estamos acostumados a dominação pela força, pela corrupção, pelo expancionismo territorial, a dominação que nos esmaga é de um império troglodita.
    A China é muitíssimo mais inteligente, mas isso não quer dizer que ela não tenha um projeto de dominação, mesmo que esse projeto seja ´e é multicultural, aliando-se a outros países na Eurásia. Os EUA tomam, a China compra, mas a dívida passa a ser de quem vendeu, e nessa história toda, entre um troglodita e um samurai, eu prefiro nenhum dos dois.

  3. O mundo está trocando de colo, e o futuro mostrará que ainda podemos piorar, mas simplesmente por ser a China.

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