A Operação Portas Abertas e o muro de Israel

Peço desculpa aos Leitores.
Peço desculpa pelo facto de insistir sobre este assunto, mas a questão da imigração está a tomar contornos dignos do teatro de revista. Porque não fosse pelo lado humano, que permanece profundamente trágico, o resto é só anedotas.

Pegamos no Presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker. O simpático homenzinho propõe hoje a distribuição pelos Estados membros de mais 120 mil refugiados, com carácter urgente e obrigatório (isso é: não podem ser rejeitados, justo porque estamos em democracia).

Proponho hoje a recolocação de mais 120 mil pessoas que estão na Itália, Grécia e Hungria e isto tem que ser feito de modo vinculativo. São 160 mil pessoas que os europeus devem receber de braços abertos.

Mas quantos são? 120 mil ou 160 mil?
São os 120 mil de hoje mais os 40 mil propostos ontem. Ao que parece, a cada dia quadruplica: no Domingo serão 40.960.000.

40 milhões? Mas porque pôr limites?

A migração tem que ser legalizada e a Comissão Europeia vai apresentar uma proposta no início de 2016.

Mas a migração já é legalizada: há leis que regulam a entrada no espaço europeu. Perguntem aos imigrantes do Brasil. O que quer dizer Juncker é diferente: esta será uma Operação Portas Abertas. Única condição: quem entra não pode escolher o seu destino. O que é justo, pois nas deportações em massa nunca é escolhido o destino. Mas imaginem os (primeiros) 4.000 que sonhavam a Suécia e ficarão em Portugal…

O supremo líder comunitário continua:

Este não é um momento para ter medo, é tempo de a União Europeia agir com ousadia e determinação.

Jean-Claude Juncker

Exacto: o medo chegará depois, quando o ISIS começará a actuar para semear o pânico. Ou achamos que o Estado Islâmico não infiltra os seus homens na vaga migratória? Pode ser que o ISIS até estivesse perto de esquecer-se disso, mas de certeza alguém lhe fez presente a rica oportunidade.  

Ainda Junckers:

Defendo que os requerentes de asilo sejam autorizados a trabalhar e a ganhar o seu dinheiro enquanto decorre o processo, o trabalho é uma questão de dignidade. […] Devemos tudo fazer para alterar as legislações nacionais de modo a permitir que os refugiados possam trabalhar a partir do primeiro dia da sua chegada.

Parece-me uma boa ideia. Único problema: na União há mais de 20 milhões de desempregados. O que vamos fazer? Vamos conceder um “direito de prioridade” aos imigrantes? E por qual razão? Ou vamos inscreve-los nos Centros de (des)Emprego para receber um subsídio, enquanto um desempregado português, por exemplo, após dois anos perde o direito a recebe-lo?
Isso vai ser engraçado, sem dúvida.

Tempo ainda para uma última frase histórica, daquelas que devem ser esculpidas na pedra:

Este é um tempo para a humanidade e para a dignidade humana.

Lágrimas e aplausos. Missão cumprida.

Os muros não são todos iguais (os de israel são melhores!)

Há um pormenor esquisito nesta história dos imigrados.
Uma Esquerda inteligente deveria criticar duramente o Ocidente pelo facto de não criar adequadas condições de sobrevivência nos Países mais desfavorecidos, os que originam a vaga migratória. E deveria considerar a migração como último recurso, pelo sofrimento que provoca (em primeiro lugar entre os emigrantes).

Isso enquanto a Direita (aquela moderada) poderia simplesmente ignorar os acontecimentos, saboreando a chegada de nova mão de obra barata e de poucas pretensões.

Acontece exactamente o contrário: a Esquerda (ou aquela coisa que ainda teima em definir-se assim) critica quem ousa dizer uma meia vogal contra a vaga migratória, enquanto a Direita pede que as fronteiras sejam fechadas. Aparentemente não faz sentido.

Pegamos no diário da Esquerda governamental em Italia, La Repubblica.
Há meses que este diário de pseudo-Esquerda ataca o Primeiro-Ministro húngaro, Victor Orban, criminalizando-o pela facto de ter iniciado a construção dum muro na fronteira com a Sérvia, com o objectivo de deter os migrantes que viajam através da rota dos Balcãs. Lemos as paginas e encontramos a história comovente de Ferencs Gyurcsány, o ex-premier que decidiu hospedar na sua casa alguns refugiados; um artigo que explica que os imigrantes são indispensáveis à economia europeia (“recurso económico para salvar as pensões”, “empregos que os italianos não querem fazer” e outras amenidades); e nem falta uma entrevista ao pai de Aylan, a criança encontrada morta na praia.

Uma verdadeira lavagem cerebral que nunca indica as causas (porque as pessoas abandonam os Países de origem? Como seria possível ajuda-las antes que sejam obrigadas a abandonar as suas casas? Quais são os Países que recusam este tipo de ajuda? Etc., etc.), mas só convida a aceitar o fenómeno da imigração porque “é bom”, porque “somos humanos”, até porque “é necessário para a nossa economia” (wow, que ajuda desinteressada!).
Não falta nada.

Nos diários de Direita, pelo contrário, não passa dia sem que partam flechas envenenadas contra os imigrantes e os que apoiam esta vaga, como o simpático Juncker.
O que é isso, o mundo ao contrário?

Mas voltemos ao muro. Podemos analisar o jornal todo de pseudo-Esquerda e, de facto, não há nenhum indício acerca da decisão tomada pelo primeiro-ministro israelita,
Benjamin Netanyahu.

Qual decisão? Esta: o governo iniciou a construção
duma barreira na fronteira com a Jordânia, no quadro da política de
rejeição dos imigrantes, em particular dos africanos (quase todos
sudaneses e eritreus). Notícia relatada (e fortemente criticada) pelo Il Giornale, diário de Centro-Direita. Não é isso um pouco estranho?

Enquanto o “muro” húngaro é na realidade uma barreira de arame farpado (que simpática não é, mas pode ser desmantelada rapidamente), o muro israelita mesmo muro é: uma parede com cerca de 30 km que liga as cidades de Eilat, no Mar Vermelho, e de Timna.

O projecto, aprovado em Junho, prevê a unificação desta parte do muro com a outra já erguida na fronteira com o Egipto: no total vão ser 240 km de barreira que vai impedir o acesso aos imigrantes. A estas duas barreiras (que, como afirmado, serão unificadas) é preciso adicionar aquelas presentes na fronteira com a Síria (nas Colinas de Golã) e na Cisjordânia ocupada.

A intenção é clara. Netanyahu afirmou de forma inequívoca a necessidade de levantar um muro “para bloquear a maré de migrantes”. E entre os refugiados há muitos Sírios, aqueles que fogem de Aleppo, Palmyra, Raqqa, todas áreas ocupadas pelos milicianos do ISIS.

No entanto, tomamos nota: os muros não são todos iguais, pois alguns são mais xenófobos do que outros. O “muro” da Hungria é muito xenófobo; aquele de israel é uma questão de protecção, ao ponto de nem merecer uma linha num diário que se auto-intitula “de Esquerda”.

Ipse dixit.

Fontes: no texto.

10 Replies to “A Operação Portas Abertas e o muro de Israel”

  1. Se eu fosse conspiranóico, diria que o fabianismo está cada dia mais atuante e o plano de destruição do status vigente passa muito bem obrigado. Mas como eu não sou conspiranóico digo que esta esquerda tem coração de mãe. Talvez simplória, inocente quem sabe, mas nunca má intencionada.

    A direita participa da queda europeia, mas com dignidade. A Europa para os europeus mesmo metida em trapos.

    O que ocorre hoje no mundo nem o oráculo de Delfos teria resposta pra dar.

    Expedito.

  2. Quando o patrão é o mesmo a publicação X e Y podem-se conotar com direita, esquerda, frente, trás …ao omitir estão só a contar parte da verdade, mas não é assim que se vendem ilusões?
    A ideia que fica é justamente a que Expedito expõe em cima.
    Nada como um lobo vestido de cordeiro e do outro lado o ódio do mais primitivo.
    O resultado é o mesmo criar conflitos e desestabilização e que se matem uns aos outros.
    Quem paga a conta duas vezes já se sabe, os do costume.
    Nuno

  3. A "lavagem" continua.

    Uma Europa sobre tensão resultante duma guerra sem armas. Agora é só aguardar pelos conflitos civis e a consequente "ordem & segurança" pedida pelo povo.
    Sobra um governo de "parceria" FMI e BCE a esfregar as mãos diante desta obra Orwelliana.

    Fica o meu palpite sobre os próximos desenvolvimentos.

  4. Ando a cata de razões para esse acontecimento recente das migrações para solo europeu e, embora não me tenhas ainda respondido sobre o envolvimento dos EUA em sua obra imperial embasada no terror, aparecem aqui mais algumas "razões".
    1.Os migrantes não podem escolher o destino, o que significa que outros escolherão por eles, e o que também significa que a Europa do "norte" receberá os melhores preparados para o trabalho…e a "escória"…já para os países do Mediterrâneo.
    2. Mais muros serão levantados em torno dos guetos de estrangeiros pobres e…unidos uns contra os outros, praticar-se-á a guerra sem invasão imperial em solo europeu…fantástico!
    3. O clamor por segurança ecoará mais alto e forte do que nunca a partir das próprias vítimas do terrorismo do ISIS, e do seu próprio medo e covardia, e o estado policial entrará em vigor na Europa, não por imposição, mas respondendo ao clamor das massas. Os poderosos deste planeta são demais inteligentes…medida perfeita!
    Ora bolas…e eu que gostava tanto de passear na Europa, que ainda conheço tão pouco. Era tão bom caminhar alegre e despreocupada por lugares ermos, carregados de história, em meio a gentes e bichos bem tratados pela vida…E agora…pronto: a guerra financeira os está empobrecendo, a guerra psicológica os está enlouquecendo e… finalmente, a guerra fraticida entre humanos os levará ao império do terror. Que pena! Só vejo uma coisa positiva nesta triste história: o povo europeu terá uma mínima ideia do que é experimentar sensações que os povos em zonas de guerra permanente, a exemplo do oriente médio e países do terceiro mundo experimentam.

    1. Olha Maria, às vezes vamos para Oeste para chegar ao Leste.

      A Europa já foi muito "redimensionada" nos últimos anos: reformas, ordenados, desemprego, etc. Não acho haver ainda muito mais espaço para manobras de "repressão", também porque o sentimento anti-europeu está cada vez mais em alta. As pessoas perguntam-se "o que diabo estamos a fazer aqui?", vêem um Europa sem rumo, e em alguns Países este mal-estar já tomou formas políticas.

      Não falo só da Grécia de Syriza (que, todavia, bem mostrou o sentimento anti-europeu dos Gregos). Falo também do Movimento 5 Estrelas em Italia (partido com um terço de todos os votos), do movimento de Direita na França (primeiro nas sondagens), do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista em Portugal, do governo da Hungria, do Team Stronach da Áustria, do ODS na República Checa (primeiro partido do País)…

      Os imigrantes fornecerão mão de obra barata e, verdade, criarão guetos. Com certeza haverá acções do ISIS. Mas, se lembras, já houve as de Al-Qaeda antes. O objectivo destas acções (o metro de Londres, a estação na Espanha) não era desestabilizar a Europa, mas criar um sentimento anti-árabe e justificar assim um maior empenho militar no Oriente.

      Se a ideia fosse apenas desestabilizar a Europa, a Ucrânia teria sido um óptimo pretexto: tinha todos os ingredientes necessários. Mas, pelo contrário, a guerra foi "abafada" e já desapareceu da capas do diários (e até das páginas internas). A verdade é que os EUA precisam da Europa como base sólida contra a Rússia: portanto, é provável que haja ataques do ISIS, como referido, mas com o intuito de "mexer" nos Europeus para um maior empenho em Países como a Sìria, por exemplo (os imigrantes não são apresentados como "refugiados sírios"?)

      Mas há uma parte do teu comentário que atingiu-me bastante. Esta parte:
      "Só vejo uma coisa positiva nesta triste história: o povo europeu terá uma mínima ideia do que é experimentar sensações que os povos em zonas de guerra permanente, a exemplo do oriente médio e países do terceiro mundo experimentam".

      Se até tu, pessoa que respeito sobremaneira e que considero particularmente aguda, não consegues fugir ao desejo de vingança (já encontrado em outros Leitores do Brasil), se para ti ver um continente em chamas é coisa "positiva", então pergunto-me para que raio serviu este blog, o que faço eu aqui. Significa que estes foram 5 anos de trabalho deitados no lixo. Significa que se calhar é melhor eu dedicar o meu tempo a algo mais produtivo, porque até aqui não consegui nada, iludi-me de transmitir uma mensagem que afinal não foi para lado nenhum.

      Não é uma "lamentação", não estou à procura de coisas do tipo "Max continua, o blog é fantástico!", não estou interessado nisso. É apenas uma constatação.

      Grande abraçoooooo!!!!

  5. Desculpe Max, mas não entendi o comentário de Maria da mesma forma que você. Penso que o comentário se refere à um despertar do europeu na desgraça, infelizmente. E por minha conta acrescento que talvez daí possa haver cobrança da sociedade sobre o que se passa em outras nações. Cobrança sobre seus representantes e principalmente que estes cobrem pelas atitudes temerárias do governo dos EUA. Que parem de respaldar toda a arbitrariedade das suas pretensões hegemônicas. A Europa está de joelhos no milho como castigo imposto pelo governo norteamericano. Agora mesmo temos assistido declarações de países europeus dispostos a "combater o ISIS" na Síria. Sabemos perfeitamente qual a real motivação na região. É tudo menos ISIS. A mesma coisa sobre sanções contra a Rússia. Sempre respaldando a canalha fantoche que governa os EUA, que age por imposição da corja megacorporativa. Até quando a Europa vai ficar ajoelhada no milho (da Monsanto, talvez)? Até a América do Sul tem tentado ficar ereta e não dobrar sua espinha em relação à esta gangsterada. Mas tudo por aqui já anda a fazer água. As ações de ONGs já se fazem sentir e alguns desavisados já emplacaram a ideia golpista.

    http://br.sputniknews.com/opiniao/20150909/2082746.html

    Expedito.

    1. Acho que o problema no texto da Maria foi "o povo europeu"…..

      Coitadas de nós ovelhas, como todas as outras espalhadas pelo mundo, podemos ter um mais alto nível de vida e mais escolaridade em percentagem mas, em ignorância somos iguais ou ainda piores que os desgraçados que os nossos estados exploram e matam pelo mundo. O povo não tem que sofrer mais do que já sofre, seja na Alemanha seja no Burkina Faso, o povo tem é que se ajudar mutuamente e combater a podridão que nos controla.

  6. Ver responsáveis da Igreja Católica defender o DIREITO À SOBREVIVÊNCIA de Identidades Autóctones é algo que seria uma coisa de admirar!
    Quando se fala no (LEGÍTIMO) Direito à Sobrevivência de Identidades Autóctones [nota: Inclusive as de 'baixo rendimento demográfico'… Inclusive as economicamente pouco rentáveis…] nazis made-in-USA – desde há séculos com a bênção de responsáveis da Igreja Católica – proclamam logo: «a sobrevivência de Identidades Autóctones provoca danos à economia…»
    [nota: os nazis made-in-USA provocaram holocaustos massivos em Identidades Autóctones]
    .
    .
    P.S.
    http://separatismo–50–50.blogspot.com/
    (antes que seja tarde demais)

  7. Max: sentimento de vingança…eu Max!!!! Não me considero tão burra, tão estúpida e tu me conheces o suficiente para saber que posso lá ter meus defeitos…e como tenho, mas seria impossível para mim achar que um povo precisa pagar pela cretinice dos poderosos em qualquer tempo e em qualquer lugar. Se escrevi algo que possa ser confundido por issoé porque devo mesmo estar velha demais e trocando as palavras. Jamais teria a vontade de atingir o amigo que considero uma rara figura e ademais, um amigo. me desculpa se errei com as palavras, mas de certo com o sentimento não errei porque sempre considerei que só se sabe algo quando se experencia. Este foi o sentimento e o externei com muita tristeza, jamais com sentimento de vingança.

    1. Maria, é um problema recorrente este das expressões mal interpretadas nos comentários: é a limitação do meio. As palavras ditas são uma coisa, que podemos "ler" correctamente à primeira, aquelas escritas podem assumir outras nuances, bem diferentes das nossas intenções.

      Por isso tinha ficado pasmado ao ler o teu comentário anterior: simplesmente não conseguia reconhecer-te, não era aquela a Maria que conhecia. Acredita: li, interpretei mal e fiquei mesmo mal disposto. Pensava "Eh pá, não é possível, até ela…".

      Mas antes de continuar, e para os Leitores mais novos, um esclarecimento, pois esta troca de comentários entre Maria e eu pode aparentemente carecer de algum sentido.

      Maria é Leitora de longa data e, além disso, é amiga pessoal, apesar de nós vivermos em continentes diferentes. Não se trata de dar mais importância aos comentários dela (isso seria muito injusto de minha parte no respeito aos outros Leitores e não é isto que está em causa), mas é um facto que a sua contribuição tem sido muito importante ao longo dos anos. E foram mesmo os comentários e as trocas de ideias que fizeram nascer a amizade, até que Maria um dia pegou no avião e participou no (único até agora) encontro entre os Leitores do blog.

      Pessoa aguda, inteligente (considerem que é mulher!!! lolololol) e, como se não bastasse, pessoa que não se limita às palavras mas passa aos factos no que diz respeito às escolhas da vida (coisa extremamente rara esta última), com uma mente muito aberta, não tenho problemas em admitir que tem sido fonte de inspiração no trabalho do blog.

      Acho que isso pode ajudar a compreender melhor esta estranha troca de comentários.

      Voltando ao assunto: peço-te desculpa por ter interpretado mal o teu pensamento: é verdade, conheço-te e isso deveria ter-me obrigado a fazer uma leitura bem diversa daquela que fiz. Enfim, eu também tenho os meus defeitos…

      "Tenho os meus defeitos"? O que raio me fazes escrever? Apaga, apaga a última frase, não gosto nada. Substitui com "Todos vocês têm os vossos defeitos".
      Esta já gosto 🙂

      Grande abraçoooooooo!!!!!

Obrigado por participar na discussão!

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