A Revolução: para uma mudança da nossa sociedade – Parte I

E assim seja: vamos organizar uma Revolução.

Em primeiro lugar: que tipo de Revolução? Violenta? Pacífica? Ou um pouco das duas coisas?
Mas esperem: quem deveria rebelar-se? Quantos somos? Quem somos? O que desejamos? Há um líder por aí? E mais importante ainda: quais são as ideias?

O facto é que passamos horas na internet entre injustiças, abusos, páginas após páginas procuramos uma esperança, um sintoma de mudança. Mas sempre aqui estamos. Afinal ficamos um pouco fartos de tudo isso, não é? Como dizem em Italia: quem de esperança vive, desesperado morre.
Alguém quer morrer desesperado? Eu não.
Então falamos da Revolução.

Será um artigo muito comprido, porque vamos falar de muitas coisas: o que é possível fazer, quando, como, porque. Vai ser um discurso em alguns casos aborrecido, às vezes presuntuoso, outras vezes ainda errado (e conto com o Leitor para as necessárias sugestões/correcções). Mas acho que tem que ser feito. Por isso: armem-se de santa paciência.

E começamos pelo fim, pois é a parte mais simples: Revolução violenta ou pacífica?

Violência bruta? Força do Amor? 

Eu voto Revolução pacífica. E há várias razões, não é apenas uma questão de pacifismo (não sou pacifista: por vezes – raras vezes, verdade seja dita – a violência é o única recurso).

Pessoalmente estou convencido de que a nossa sociedade irá acabar com um estrondo. A nossa é uma sociedade velha, ancorada a ideias antigas (em alguns casos decrepitas) mas tão enraizadas que apenas algo “radical” poderá limpar tudo até as profundezas e permitir uma verdadeira mudança. Agora, não perguntem qual o estrondo e quem será a provoca-lo: este é um blog, não o antro duma cartomante.

Mesmo assim, e até lá, a única estrada será tentar uma Revolução pacífica. Porque?
As principais respostas são duas:

1. Qualquer violência agora seria facilmente impedida/desviada.

Temos debaixo dos olhos o que acontece com as revoluções em vários Países: o desejo de mais liberdade (um desejo real e genuíno) é utilizado para a implementação de condições que favorecem o actual sistema. O que sobra é o caos e, no geral, uma situação até pior do que a anterior. Perguntem aos líbios, aos egípcios, aos sírios, perguntem aos ucranianos. Perguntem a um movimento como Occupy Wall Street (ou perguntem directamente à George Soros, é mais simples e ele pode explicar bem melhor).

Internet, que favorece a circulação de ideias, é também um excelente instrumento de controlo e de contra-informação. Facebook e Twitter são apenas alguns dos meios utilizados para canalizar a vontade dos povos. Os media de regime fazem o resto. Nem vale a pena aqui falar das polícias ou dos exércitos: qualquer revolução nesta altura é desviada muito antes de chegar a este patamar. As revelações de Edward Snowden deveriam ensinar algo: o sistema não é parvo, sabe muito bem que há descontentamento, sabe que melhor do que curar é prevenir (com a actividade da NSA, por exemplo).

Partam uma montra e serão “violentos”. Partam três montras e serão “terroristas”. Este é o único resultado da violência hoje.

2. Violência contra quem?

Pois, pequeno pormenor: contra quem deveria ser utilizada esta violência? Nenhum de nós vive num País isolado do resto do mundo, a não ser que o Leitor viva na Coreia do Norte. Ocupamos o Parlamento? Damos um murro na cabeça do Primeiro Ministro? E depois? Alguém acha seriamente que o Ocidente permitiria a implementação dum qualquer regime alternativo? Na Europa, por exemplo: Bruxelas estaria a olhar de braços cruzados?

Alguém viu nos últimos tempos o que se passou na Argentina, que nem faz parte duma União como a nossa (mea culpa: deveria ter dedicado mais espaço aos assuntos de Buenos Aires)? E na Argentina nem foi utilizada a violência: simplesmente foi escolhida uma outra política monetária, fora dos esquemas permitidos pela comunidade ocidental.

Viram o que se passou na Crimeia? Mesmo aqui, neste blog, ainda há comentários de quem acha que a Crimeia errou, que deveria ter escolhido outro rumo, mais “politicamente correcto”.

Autodeterminação? Liberdade de escolha acerca do próprio destino? Tudo é aceite apenas se existir no âmbito interior do que é permitido pelo sistema. Fora disso, qualquer pulsão é vista como negativa. A verdade é que o 1974 passou há muito: hoje a violência (é lembramos que é possível ser violentos mesmo sem que haja sangue a correr) não seria a) possível b) entendida pela maior parte das pessoas.
E como tal, seria condenada ao fracasso.

Haveria mais para dizer sobre este assunto. Li muito acerca da experiência das Brigadas Vermelhas italianas, por óbvias razões, não última o facto de vivido a fase final daquela experiência.

Apesar das B.V. (mas também Rote Armee Fraktion, Action Directe, ETA) ter escolhido um caminho que condeno profundamente (o terrorismo, aquele verdadeiro feito de bombas entre os civis, não aquele financiado pelas instituições “democráticas” de hoje), a lição fica e vale para todos os movimentos revolucionários: sem uma ampla base de apoio popular, qualquer violência é marginalizada e derrotada.

Quem somos? Quantos somos?

Aqui a reposta pode parecer simples: somos muitos!

Sim, é verdade: somos muitos. É suficiente navegar um pouco pela internet para entender que há muitas pessoas com vontade de mudança.

Somamos a isso as pessoas que não frequentam internet e que mesmo assim sabem que as coisas não estão bem. Ená, somos mais do que muitos: somos um oceano de pessoas!

Mesmo assim somos sempre poucos. Terrivelmente poucos. Porque depois é preciso distinguir:

Os que confiam no sistema
Há aqueles que não estão satisfeitos mas que mesmo assim continuam a acreditar que este seja um bom sistema. Algumas arestas para mudar, nomeadamente os gatunos que forma eleitos como representantes do povo: mas o sistema funciona. Afinal, todos temos um carro, uma casa, um prato de comida: o que querem mais? Abandonar tudo para quê?

Os interessados
Há aqueles que sabem que as coisas estão más, que entendem que o sistema está podre, mas que mesmo assim não querem mudar de forma excessiva, porque a nossa sociedade proporciona um nível de vida confortável, em alguns casos muito confortável. E porque deveriam mudar tudo?

Os sem coragem
Nem todos nascem heróis. Há pessoas que por natureza não tomam partido ou simplesmente não têm a coragem para lutar. Podem estar insatisfeitos, mas o medo é algo que bloqueia. Existem, ponto final.

Os com outras ideias
Há quem reconheça que as coisas estão más, que o sistema está irremediavelmente podre, mas que mesmo assim não concordam com a ideia duma mudança radical e (razoavelmente) repentina.

Isso deve ser tomado em conta: nem todos nascem ou querem tornar-se “revolucionários”. Em teoria, todos desejamos uma mudança; na prática, há diferencias entre nós.

Todavia não acho este ser o ponto mais importante de todos: porque a nossa sociedade é defeituosa, é razão de stress, é injusta. Estes são factos conhecidos e reconhecidos pela maioria das pessoas. Perguntem para qualquer indivíduo dotado de um mínimo de inteligência: gostaria duma sociedade melhor, mais justa? E quem poderia responder “não”?

Se tudo isso fosse suficiente para mudar, as coisas não teriam chegado até este ponto.- Se fosse suficiente o desejo para uma sociedade melhor, as nossas vidas teriam mudado há muito.

Evidentemente há outro problema, bem mais importante: fundamental.
Que é o que vamos ver a seguir.

Ipse dixit.

5 Replies to “A Revolução: para uma mudança da nossa sociedade – Parte I”

  1. Revolução conceitual, que tenha acesso ao fundo existencial do homem. E não acredito que isso possa ser realizado sem gerar uma violência, não física, mas mental. Sociedades, produtos de doutrinas de poder e dominação teriam que sofrer uma reeducação, um desaprendizado, tudo o que a hierarquia de valores predominante oprime. Refazer ensinamentos, desconstruir ditames da propaganda midiática globalizada. Demonstrar o quanto Estados Nacionais e medias são instrumentos representativos de uma minoria, pilares do Iluminismo e das repúblicas, todas plutocráticas. Despertar o indivíduo para os princípios da equidade e do altruísmo, capacitar a maioria para sua própria governança. Debater assuntos proibidos, como o funcionamento da diplomacia, heranças, finanças, o reconhecimento do inconsciente irracional e seus efeitos, as guerras e suas motivações, o mercenarismo social, a corrupção movida pela busca do capital, a desapropriação do tempo, a indústria cultural e seus efeitos, os princípios religiosos, a supremacia étnica.
    A REVOLUÇÃO ORIGINA-SE NA BUSCA DA PRÓPRIA LIBERDADE MENTAL SEDIMENTADA NA VERDADE e NÃO NOS INTERESSES DE DOMINAÇÃO E PODER!

  2. Eu observo que o sistema (comum a quase todos os paises) foi construido para entrar em colapso (prorrogável) e ser "salvo" pela instituição mentora de sua criação/manutenção.
    Em minha opinião, é impossivel mudar isso, mas acho possível levarmos a termo o plano deles e adotar de vez um governo mundial, num regime teocrático, e os criadores desse monstro que resolvam a merda, nem que tenham que buscar o messias no céu e apresentar solução.

  3. A Sociedade reflecte a qualidade dos indivíduos que a compõem.

    Indivíduos egoístas, cruéis, gananciosos, invejosos, depravados, etc… provocam uma sociedade ou mundo, corrupto e decadente como o que temos.

    Indivíduos nobres e que sentem os outros como a si próprio, descondicionados de tais características negativas, provocariam necessariamente uma sociedade harmoniosa.

    Há pois, que mudar o indivíduo para que a sociedade mude.

    O Romance satírico " O triunfo dos porcos" retrata bem a ideia :

    Os tais"porcos" dos sistemas Marxistas, comunistas etc, estão agora a triunfar dentro do Capitalismo.

  4. Assim sendo, tudo o que tente fazer será sempre sabotado pelo "inimigo" que está no interior de cada um de nós.

    Mas sim, há que defender o que deve ser defendido…

  5. Exatamente, Max

    Claro, tudo foi ao seu tempo.
    Mas eis talvez a mais importante ideia para uma discussão.

Obrigado por participar na discussão!

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