O tamanho importa

Há duas maneiras para enfrentar a crise.

A primeira é aquela da maioria dos Países: obedecer. É o caso de Grécia ou de Portugal.

A segunda é aquela de poucos Países: Argentina, Islândia.

A Grécia

Um trader grego manifestou nas páginas de Business Insider o triste estado de espírito do seu País:

Neste momento, estou com medo de que haja bem pouca visibilidade sobre a evolução política nos próximos meses. Poderíamos jogar a cara ou coroa.

A elite política decidiu: mais sacrifícios. É este um percurso começado há tempo: sacrifícios, depois sacrifícios para resolver os problemas que os sacrifícios anteriores não tinham resolvido, depois novos sacrifícios, depois mais e mais.

O resultado é um País de rastos, com uma economia defunta, o desemprego que continua a aumentar, um clima social que não é exagerado definir como “explosivo”. É presente em muitos gregos a ideia de que esteja por perto um ponto de viragem social, determinado pela capacidade das famílias gregas e da sociedade de suportar medidas de austeridade cada vez mais pesadas.

Ninguém sabe quando o ponto de não regresso será atingido, mas há a consciência de que o programa da Troika (basicamente FMI+BCE) desencadeou um processo do qual ficou excluída qualquer medida que pudesse comportar um sucessivo desenvolvimento económico.

Na Grécia vimos a “ajuda” monetária, a privatização selvagem, o desmantelamento do Estado, a venda do património nacional, a introdução das medidas de austeridade: é a teoria do “sacrifícios agora para ficar melhor depois”.
Na Grécia o “depois” já chegou e o resultado está à vista: um País forte candidato ao abandono da Zona NEuro (hipótese benigna) ou à beira duma implosão económica e social (hipótese maligna).

Há alguns meses pessoalmente tinha dúvidas acerca do futuro de Portugal (outro País que “obedece para fazer boa figura”): tinha a forte suspeita, mas ao mesmo tempo custava-me acreditar que Lisboa pudesse seguir os mesmos passos de Atenas. Sobretudo após ter observado os resultados da Grécia.

Hoje as dúvidas desapareceram: quando o primeiro ministro Passas e Coelhos afirma que espera obter mais tempo do encontro da Troika, apresentado esta eventualidade como um sucesso e ocultando o facto que “mais tempo” significaria a necessidade de subtrair mais dinheiro dos bolsos dos Portugueses (pois, está não aparece nos diários, não é?), então as dúvidas derretem como neve ao sol de Primavera.

O percurso já é e será o mesmo: Atenas é de facto a ante-visão do que Lisboa será no prazo de dois-três anos. Claro, depois há sempre a hipótese dum boom nas exportações do Galo de Barcelos. Nunca se sabe.

Voltando ao assunto Grécia: interessante realçar a atitude dos poderes fortes internacionais. Perante o pedido para ter mais tempo (e evitar a exasperação do conflito social), Angela Merkel disse “Não”.
Já lá vão os tempos dos parabéns ao governo grego pelas decisões difíceis e corajosas, as palmadas nas costas, os sorrisos: agora o jogo ficou mais duro e não há espaço para a piedade.

A Islândia

No outro extremo temos a Islandia.
Já sei qual a objecção: “Ah, mas a Islândia é um País tão pequeno, são apenas 300 mil habitantes…”.

Justo.
Prender os banqueiros responsáveis e culpados perante a lei e possível num País pequeno, já com 10 milhões de habitantes seria um total disparate.
Recusar que as perdas dos bancos sejam pagas pelos habitantes é possível, sim, mas apenas no caso dos moradores não ultrapassarem as 500 mil unidades.
Nacionalizar os bancos é também impossível num grande País, todos sabemos disso: haveria um colapso de todo o sistema.
Acompanhar o FMI até a porta está ao alcance dos micro-Estados (Andorra, San Marino, Islândia), os outros têm que obedecer, até a Bíblia é clara neste aspecto.

O
economista Prémio Nobel Joe Stiglitz escreveu:

O que a Islândia fez foi a escolha certa. Seria errado deixar para as futuras gerações todos os erros do sistema financeiro.

E outro Prémio, Nobel Paul Krugman:

Como a recuperação da Islândia demonstrou, fez enfurecer os
credores dos bancos privados, mas, no entanto, tiveram de engolir as perdas.

[…]
Uma coisa engraçada aconteceu no caminho para o Armageddon económico: o
grande desespero da Islândia tornou impossível qualquer
comportamento convencional, deixando que a Nação quebrasse as regras. Enquanto
todo o mundo salvou os banqueiros e fez o público pagar a conta, a
Islândia deixou os bancos falirem e, na verdade, tem expandido a
protecção social. Enquanto
todos os outros estão empenhados na tentativa de acalmar os investidores
internacionais, a Islândia aplicou um controle temporário sobre todos os
movimentos de capitais para dar-se um espaço de manobra. 

Bloomberg escreve:

A
Islândia tem dado lições básicas às Nações que estão a tentar
sobreviver ao sacrifício do resgate, após a abordagem que a ilha escolheu ter conseguido uma recuperação surpreendentemente forte.[…]
A escolha da Islândia para desenvolver o seu próprio programa, a decisão de
deixar as perdas para os detentores das obrigações e não para os contribuintes ajudou a restaurar a Nação do colapso.

E o FMI? Que diz o FMI?
Pasmem-se:

A decisão de não responsabilizar os contribuintes pelas perdas dos bancos estava certa.
A chave da recuperação da Islândia foi um programa que procurou
garantir que a reestruturação dos bancos não exigisse que os contribuintes
islandeses ficassem com as excessivas perdas do sector privado. A Islândia
recusou-se a proteger os credores dos seus bancos, que faliram em 2008,
após as dívidas alcançar 10 vezes o tamanho da economia.

Dito de forma muito simples: ao contrário dos Estados Unidos e de vários Países da Zona NEuro, a
Islândia tem permitido que o seu sistema bancário falisse durante a crise económica global, deixando o onere para os credores do sector privado e não para os contribuintes.

Mas isso, já sabemos, foi possível porque a Islândia é pequena, muito pequena. E paciência se alguém achar o contrário. Como Adriaan van der Knaap, director geral da UBS AG:

Isso não iria perturbar o sistema financeiro

Conta Arni
Pall Arnason, o ministro islandês dos Assuntos Económicos:

Se tivéssemos garantido todos os passivos dos bancos, estaríamos na mesma situação da Irlanda.[…]
No início, os bancos e outras instituições financeiras da Europa
diziam “Nunca mais vamos dar-os dinheiro”. Depois disseram 10 anos, em seguida 5. Agora dizem que em breve estarão prontos para novos empréstimos.

Mas isso, repetimos, foi possível porque a Islândia é um País pequeno.
Haveria também o caso da Argentina, mas admitimos: é um País demasiado grande.

Então mudemos de assuntos, voltamos ao básico para mostrar quanto falsas sejam as teorias das quais estamos embebidos. Por exemplo: qual a melhor forma para fazer crescer um País? O proteccionismo ou a maximização das trocas comerciais, tipo globalização?

No próximo post.

Ipse dixit.

Fontes: New York Times (1) (2) (3), Washington Blog (1) (2) (3), Business Week, The Big Picture, Business Insider, Exame

7 Replies to “O tamanho importa”

  1. "Ah, mas a Islândia é um País tão pequeno, são apenas 300 mil habitantes…"

    Max…é muito mais fácil organizar 300 mil do que 10 milhões, isso não haja dúvida…além de que a Islândia não tem exército que o governo lance em cima dos protestantes, não se esqueça.

  2. Olá Anônimo: não leva a mal a correção, mas não é preciso organizar 300 mil (ou 10 milhões) para que meia dúzia com vontade política, e que esteja na governança, tome as medidas cabíveis. É claro que o apoio da população conta, mas aí tanto faz 300mil ou 10 milhões. Abraços

  3. HÁ QUE CORTAR COM AS ‘REGRAS’ DA SUPERCLASSE!
    .
    -> A superclasse (alta finança internacional – capital global, e suas corporações) não só pretende conduzir os países à IMPLOSÃO da sua Identidade (dividir/dissolver identidades para reinar)… como também… pretende conduzir os países à IMPLOSÃO económica/financeira.
    -> O RESULTADO ESTÁ AÍ À VISTA: um caos organizado por alguns – a superclasse: uma nova ordem a seguir ao caos…
    [nota: a superclasse ambiciona um neo-feudalismo].
    .
    {no blog ‘O Insurgente’: “O Fim das Nações Sai à Rua” -> «Europa deve ser um território… que não será nada mais do que um conjunto de indivíduos atomizados e sem ligações familiares/comunitárias»}
    .
    .
    -> Para muita gente, a “derrota dolorosa de Merkel perante Monti e Rajoy”… é uma derrota perante diversos estratagemas para injectar dinheiro em bancos falidos…
    -> Mais: venda de empresas estratégicas para a soberania (e que dão lucro !?!?!)… nacionalização de negócios “madoffianos”” (aonde foram ‘desviados’ milhões e milhões), auto-estradas «olha lá vem um», PPP’s,…
    -> E mais: a existência duma estratégia demográfica… foi sempre considerada como fundamental para uma estratégia de luta pela SOBREVIVÊNCIA de longo prazo: ver este blog Origem Tabu-Sexo … ora… existindo não-nativos JÁ NATURALIZADOS com uma demografia imparável em relação aos nativos… como seria de esperar, abunda por aí muita conversa para ‘parvinhos-à-Sérvia’.
    .
    -> Antes que seja tarde demais, há que cortar com as ‘regras’ da superclasse ; assim sendo:
    1- Há que mobilizar aquela minoria de europeus que possui disponibilidade emocional (e coragem) para se envolver num projecto de luta pela sobrevivência;
    2- Há que reclamar o legítimo Direito à SOBREVIVÊNCIA das Nações ( e das Identidades Étnicas Autóctones): leia-se, SEPARATISMO-50-50!

  4. Olá Anónimo!

    E que tal organizar 40 milhões de habitantes? A maioria dos quais católicos?
    Porque este é o caso da Argentina.

    Abraço!

  5. maria:

    "não é preciso organizar 300 mil (ou 10 milhões) para que meia dúzia com vontade política, e que esteja na governança, tome as medidas cabíveis"

    Se fizer asneira, há quem tenha que se mobilizar para os tirar do poder…e aí, quantos menos forem precisos, melhor, que são mais fáceis de organizar.

    Max:

    "E que tal organizar 40 milhões de habitantes? A maioria dos quais católicos?
    Porque este é o caso da Argentina."

    Provavelmente estarei a atirar ao calhas, mas:
    Aí, a informação correu, e gerou-se uma atitude, e se a maioria era católica, isso inclui plausivelmente quem pertence às forças de segurança, que perceberam que por baixo da farda, não são máquinas de obedecer ao governo, são pessoas. Aqui, já nem católico se é…é-se materialistas, e estamos fartos de trabalhar para vermos sempre tudo tirado por materialistas ainda maiores…e portanto desistimos de fazer alguma coisa. Porque mesmo o estado está contra as pessoas, funciona mal de propósito só para fazer as pessoas desistirem de querer salvá-lo, de tão estapafúrdio que se tornou. Ao passo que na Argentina ainda se podia tirar a água do barco antes que afundasse, aqui, já anda tudo a correr aos botes salva-vidas…e não os há.

  6. Eu li que os Lêmures vieram de marte…

    … onde leu isso? Em qual contexto? Elaiá… cada um… 🙂

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