MMT – Parte I

Meus amigos, então é assim: chegou a altura de falar da MMT, a Modern Money Theory.
E porquê? Porque sim.

Na verdade já enfrentámos uma vez o assunto. Mas agora mais a fundo. Porque falar dos males desta sociedade é simples, propor algo de alternativo já é mais complicado.
Mas fique descansado o Leitor: aqui está Informação Incorrecta. Está tudo dito.

Pode ser a Modern Money Theory uma válida alternativa? Acredito que sim. E reparem: não a alternativa mas uma das alternativas.
Poderá ser implementada? Acredito que não. Porque implicaria a perda do poder que bancos, grandes corporações e elite corrupta conseguiram reunir ao longo dos últimos séculos.

Claro, o discurso é comprido. Mas temos tempo, não temos? Convido o Leitor a acompanhar-me nesta viagem, que começa hoje, no final da qual verá o mundo de forma diferente. Que concorde com a teoria ou que não concorde, tanto faz. Um exagero? Nem por isso. Mas vamos explicar.

A Modern Money Theory não é simples. E porquê? Talvez porque nada é realmente simples na vida. Mas além desta pérola filosofia domingueira, há uma maneira para explicar esta teoria que, lembramos, propõe um ponto de vista contrário ao normalmente difundido e que poderia constituir uma das chaves para um futuro melhor?

A Modern Money Theory, que de agora chamaremos simplesmente MMT, é a potência duma economia ré-distribuidora que salva as vidas e salva as Nações. Mas tem um problema: É um total contra-senso.

Explico. A MMT diz que o deficit e a dívida pública são a riqueza dos cidadãos. Como dizer que fumar é bom para a saúde. Sim, porque o público geral é ainda menos versados ​​em economia e foi treinado para reconhecer logo: dívida e deficit = grande problemas.

As mesmas palavras têm um som ruim.

A MMT diz que os impostos não servem para financiar o estado. Que é como dizer: o Estado vive de ar. Qualquer pessoa iria responder “Onde acaba todo esse dinheiro? Fica perdido no esquecimento?”.

O MMT diz que o dinheiro dos cidadãos e da banca não tem valor, é apenas um código que permite o acesso a bens e serviços, e uma vez que isso estiver feito, destrói a si mesmo. Como se dissesse: “Também este pau não existe. Agora vou bate-lo na tua cabeça mas não faz mal, pois não existe”. Quem falar de MMT é olhado de forma esquisita, ao mesmo tempo que o interlocutor pensa “”Esquisito, até parecia uma pessoa normal…”.

Pessoalmente acredito nesta teoria, mas sei que explica-la não é simples.
Por isso o assunto tem que ser enfrentando com novos instrumentos.

Como os Leitores mais antigos sabem, ao falar de economia neste blog há duas almas:
uma eminência parda, que é Leonardo;
uma eminência parva, que sou eu.

Leonardo, um rafeiro com boa parte do DNA derivado do Rhodesian Ridgeback, é o meu cão especialista de assuntos económicos, o que sugere os artigos mais interessantes e que tem a capacidade de tornar os assuntos simples, até o ponto que também eu consigo perceber.

Eu sei, pode parecer estranho: um cão que fala de economia, é uma estupidez. Mas, como dizem em Portugal: é a vida.

Por isso, eis Leonardo convidado especial que explica a Modern Money Theory.

– Bom dia Leonardo.
– Oi.
– Antes demais, obrigado para aceitar o convite.
– De nada, estava só no sofá a descansar.
– Alguns entre os Leitores estarão nesta altura com dúvida: terá um cão a bagagem cultural suficiente para tratar assuntos económicos?
– Sim, claro. Estudei Economia Aplicada e Disfarçada na Real Universidade do Alto do Índio.
– Desculpa Leo, mas no Alto do Índio não há uma Universidade, há o canil municipal…
– Então, começamos logo a contradizer? O que é isso, um interrogatório? Onde está a liberdade de pensamento?
– Ok, ok, fica calmo e mudamos do assunto, pode ser?
– Inconcebível, nunca fui tratado assim…
– Sim, mas a MMT?
– Bom, vamos ver. Vou ilustrar brevemente um conteúdo de importância política e social vital, que, no entanto, pode ter sobre os Leitores, da primeira vez, um impacto desestabilizador, um pouco como aconteceu com os que pela primeira vez ouviram as teorias de Cãopérnico, quando tentou…
– “Copérnico”…
– …tanto faz. Dizia: como quando tentou explicar que, afinal de contas, era a Terra que girava em torno do Sol, e não vice-versa.
– Ahahah, que idiotice!
– Olha que é mesmo assim.
– Sério?
– Ah pois é. Bom, a resistência mental dos ouvintes perante a MMT é parecida. A força mental dos ouvintes foi muito abalada, já que eles viviam num mundo que tinha a Terra no centro. O que o Leitores vão ler terá um impacto semelhante.
– E a Lua?
– Ó Max, esquece esta história do Sol, tá bom?
– Ok, ok…
– Vou explicar, como fez Cãopérnico, que um conceito universalmente assumido como “natural” ou “comprovado” pode, na realidade, ser virado de avesso. Vou falar duma coisa que qualquer economista, não apenas canino, hoje aponta como “perigosa”, algo que deve ser combatido.
– Credo!
– Então:como é possível que uma tal “verdade” afinal possa não ser “verdade”?
– Pois, como pode ser?
– É possível, é bem possível. A Ciência é linda mesmo por causa disso, porque a pesquisa pode descobrir que afinal as coisas não são exactamente como imaginadas até então. Por exemplo:o colesterol.
– Que tem a ver agora o colesterol?
– Espera. Desde o final de 1600 que o colesterol é suspeito de ser mau.
– E é mau.
– Cala-te. Hoje, sabemos todos os humanos com mais de 50 anos foram crescidos com nos ouvidos a história do colesterol mau, que mata. Até nasceu uma industria de low fat, produtos com gordura reduzida. Depois…
– Depois quê?
– Depois a Medicina descobriu que nem todo o colesterol é mau. Aliás, há um colesterol bom, muito bom mesmo. É o HDL. O HDL é muito bom, até combate os efeitos do colesterol mau, o LDL. Ter um alto teor de HDL no sangue protege dos enfarte e dos ictus.
– Então o colesterol é bom ou mau?
– Pode ser bom e mau. É bom não esquecer esta história ao ouvir falar da MMT.
– Vou me lembrar.
– Isso mesmo. Agora pensa: há décadas que ouvimos dizer sempre a mesma coisa, que o deficit é mau, que a dívida é má, que deficit e dívida são só desgraças. Depois alguns economistas começaram a pesquisar e perceberam que nem tudo é tão mal: afinal existe um deficit HDL.
– Onde, no sangue?
– No, na economia.
– Ah…
– É um deficit que protege o organismo, que é a sociedade, das doenças mortais: o desemprego, a pobreza, a recessão. Este deficit HDL é a Despesa a Deficit Positiva, que é contrária ao deficit LDL, o Despesa a Deficit Negativa. Os cientistas que fizeram esta descoberta  são os pais da MMT, como Robinson, Keynes, Innes, Gogley…
– George Gogley, aquele que foi preso na semana passada?
– Não, não Clooney: estes são os economistas que perceberam a questão da Dívida HDL. Mas atenção!
– Que foi?
– Concentra-te, pois há uma pequena-grande diferença. No âmbito da Medicina, uma descoberta pode ser incómoda, justo?
– Justo.
– Mas geralmente emerge e é aceite. No mundo da Economia isso pode não acontecer.
– Ah não?
– Não: estamos a falar dos interesses não apenas de algumas casa farmacêutica, mas de toda a nossa sociedade que foi construída com determinadas regras. E uma destas regras era: a Dívida é má, ponto final.
– Pois é má, todos percebem isso.
– Pode ser má e pode ser boa. Lembra do HDL?
– Não.
– Ó Max, a história do colesterol bom e mau!
– Ah, sim, já sei…
– Isso: são poderes económicos que têm interesses milhares de vezes maiores do que o mundo da Medicina. É a mesma base da nossa sociedade, entendes?
– Mais ou menos…
– Mas é por isso que da MMT pouco se fala. Se a MMT fosse implementada, viraria de avesso todo o canil.
– O mundo, queres dizer.
– Tanto faz. Tens uma bolacha?
– Não.
– Então por agora é tudo.
– Como assim? E quando continuas?
– Quando houver bolachas.

Pois é. O problema é que hoje é Domingo: e onde vou encontrar bolachas?

Ipse dixit.

Fonte: Paolo Barnard

MMT Parte I, Parte II, Parte III, Parte IV

11 Replies to “MMT – Parte I”

  1. Max, os meus cães que não têm pendores filosóficos acham que tudo que possuem lhes é dado pela graça divina(Eu)e a única coisa que sabem é a diferença entre um tijela cheia e uma tijela vazia, perceba já temos os primeiros números da economia (um) e o (zero),neste caso tijela cheia e tijela vazia e esta é a realidade econômica deles.

  2. Tibiriçá… Se os cães que vivem contigo dominam a linguagem binária então aproveita pois eles compreendem o mundo virtual/digital melhor que eu e tu! Eles dão aulas?

  3. "Também este pau não existe. Agora vou bate-lo na tua cabeça mas não faz mal, pois não existe".

    eheheh….faz-me lembrar "Wittgenstein", de Derek Jarman…nesse filme havia diálogos do género:

    "-Existem rinocerontes neste quarto!
    -E onde estão eles? Não vejo nenhum"
    -A questão é metafísica, e não empírica!"

    E um onde um aluno dá um tabefe na própria cara e diz:
    -Não pode dizer que não senti esta dor!
    Ao que o Wittgenstein responde:
    -Tem a certeza que sentiu essa dor?

    lol…

  4. Olá Max: então meu curso de pós graduação em economia está a caminho! Estás pedagogizando os escritos do Barnard,(para tentar melhorar a minha compreensão), como tinhas falado, um tempo atrás, ajudado pelo nosso inestimável professor Leo? Ótimo! Li a introdução com a atenção devida. Abraços

  5. Léo , o que fazes ai na casa do Max ? por que não estás na frente do governo ? garanto que se estivesses lá , Portugal não estaria quase na lama como está agora …

    é bem verdade : ande ao contrário e o Nirvana lhe salta no colo .

Obrigado por participar na discussão!

This site uses User Verification plugin to reduce spam. See how your comment data is processed.

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

%d bloggers like this: