Quantitative quê? Parte II

Na antiguidade, quando ainda era muito jovem (6 de Outubro de 2010), publiquei alguma coisa acerca do Quantitative Easing. E, dado os recentes e próximos acontecimentos, vale a pena voltar a falar do assunto.

Não vou simplesmente publicar outra vez o post já escrito, vou mas é actualiza-lo.

O que é o Quantitative Easing (QE)?
Pegamos no nosso carro, o bonito Jaguar com bancos em pelo de camelo, abrimos o capot, observamos o motor e perguntamos: há óleo neste motor? Não há? Então toma uns 5 litros de óleo fresquinho.

É o que faz um banco central: há dinheiro? Não há? Então ligamos a impressora e vamos encher a economia de dinheiro acabado de ser imprimido.

Dito assim até parece uma boa coisa: dinheiro para todos, dinheiro de borla. Afinal é só ligar a impressora e imprimir. Porque ninguém pensou nisso antes?


Resposta: porque está errado.
Voltamos ao nosso carro.

Ao olhar para o motor, não conseguimos saber se há óleo ou se não há. É preciso retirar a varinha, limpa-la, voltar a inseri-la no idóneo orifício, e só assim podemos saber uma coisa simples: há óleo, está tudo aí, no interior do motor.
Só que não circula, porque o motor está desligado.

É a mesma coisa que acontece na economia. Há dinheiro, não é falta dele o problema: é que não circula, pois o motor da economia está parado.

O Quantitative Easing é isso: saber que há óleo no motor e, mesmo assim, deitar um balde do precioso líquido no motor, na esperança que isso possa pôr em funcionamento alguma coisa.
Mas que acontece quando no motor ultrapassarmos o nível máximo de óleo? Avarias.

De facto, o QE comporta problemas e na primeira parte do artigo vimos alguns deles, específicos da situação do passado Outubro. Agora vamos ver as consequências de carácter geral.

O primeiro grande problema é o vício.
Tal como no caso do abuso dum medicamento, demasiados QE reduzem os (eventuais) efeitos benéficos.
Com o QE1, a Federal Reserve (o banco central dos Estados Unidos) conseguiu duplicar o valor do S&P500 (que, para simplificar, podemos entender como o valor das trocas na Bolsa de Wall Street); mas o QE2 conseguiu um aumento de 30% e nada mais.

O segundo grande problema, bem mais grave, é a perda de valor da moeda.
É o velho mecanismo de sempre: se no mercado houver uma maçã, esta será bem valiosa; se houver 10.000 maçãs, o valor de cada uma desce. O mesmo acontece com o dinheiro: demasiado dinheiro gera inflação (o valor do dinheiro é mais baixo), por isso as matérias primas custam mais e os preços sobem.
Com a inflação provocada pelo QE, os nossos ordenados valem menos, pois os preços das coisas que costumamos comprar será mais elevado.

Mas há um terceiro problema, um pouco mais escondido: como o Dólar é (por enquanto) a moeda de referência nas transacções internacionais, a inflação propaga-se aos mercados emergentes também; estes aumentam o preço do dinheiro deles (para compensar a perda com o Dólar) e isso “arrefece” o mercado global.

Síntese: os únicos Países com economias que ainda funcionam, abrandam.
Síntese extrema: recessão global, a mesma que está a bater à porta.

Por isso, ouvir dum QE nos Estados Unidos e pensar “Tá bom, isso é com eles…” é errado: é connosco, não apenas como “eles”.

Por causa destes problemas, seria lícito esperar que um eventual QE3 fosse subministrado de forma um bocado diferente. Aliás, o melhor seria não subministra-lo mesmo.

Mas os sinais indicam o contrário.

  • A Grécia é pronta para a falência oficial e, na mesma altura, Jurgen Stark, o chefe economista do Banco Central Europeu, abandona o banco. Possível explicação: o BCE está a preparar “algo” do qual Stark não gosta. E sabemos que Stark, enquanto “falcão”, não gosta mesmo dos Quantitative Easing.
  • Todo o mundo ocidental apresenta dados macroeconómicos miseráveis. É preciso um estímulo.
  • Na última reunião do BCE dedos apontados, com satisfação, para a inflação em queda. Uma excelente notícia tendo em vista um eventual QE que, como vimos, aumenta a inflação.
  • No mundo ocidental há aquele que, com um eufemismo, é definido como “excesso de capacidade produtiva”. Por isso há muito desemprego. Historicamente, uma situação como esta é resolvida com cortes nos impostos ou no preço do dinheiro. Coisa que hoje não é possível fazer. É preciso, ainda uma vez, um outro estímulo qualquer.
  • O medo duma forte vaga de inflação derivada dum eventual QE é hoje menor. O preço do petróleo (determinante para a inflação) está em queda (mesmo que não pareça, pois nas bombas a gasolina custa sempre o mesmo: em Maio o petróleo custava quase 115 Dólares ao barril, hoje nem chega aos 90) e as previsões são para valores que não devem subir muito nos próximos meses.
  • Os bancos europeus e americanos estão em crise. Ainda detêm assets tóxicos, têm medo, não concedem créditos, alguns bancos franceses estão à beira duma crise histérica.

Síntese: é preciso um estímulo, que não pode chegar dos cortes nas taxas ou de novos impostos, e parecem existir as condições para introduzir um novo Quantitative Easing.
Aliás, segundo vozes não seria um normal QE, mas algo mais. Uma espécie de arma final.

Tentamos adivinhar?
Um mega QE, coordenado entre os principais bancos centrais.

Durante o fim-de-semana, o G7, reunido em Marselha, confirmou o empenho em apoiar os institutos de crédito enquanto crescem os medos de que a Europa possa ser atingida por uma crise bancária. Está a ganhar força a ideia de que ao sistema bancário europeu sirva uma maciça recapitalização.

“Recapitalizar”.
Significa aumentar o capital com a injecção de dinheiro ou de outros activos.
E como de outros “activos” não é que haja muitos…

Mas isso na Europa. E nos Estados Unidos?

Aí a situação é um pouco mais complicada: os Americanos já sofreram dois Quantitative Easing nos últimos anos, a ideia dum terceiro não é encarada com muita alegria. Lembramos que, como já afirmado, cada QE significa uma perda de valor do dinheiro na posse dos cidadãos; e os Republicanos provavelmente, utilizariam isso como uma nova arma contra a Administração Obama.

Mas donde chega o dinheiro das campanhas eleitorais da Direita americana?
Pois…

Ipse dixit.

Link: Quantitative quê? Parte I
Fontes: Bimbo Alieno, Linkiesta

3 Replies to “Quantitative quê? Parte II”

  1. Fantástico, como estão ganhando tempo !!
    Pensava mesmo que isto ia rebentar por esta altura(fim do verão), mas resolveram enterrar-se ainda mais, para ganhar uns meses…

    O problema é quando realmente chegar a hora do aperto, ainda vai ser pior….

    Os trunfos estão a acabar….

    Saudações

  2. Como parte da agenda "problema-reação-solução", estão só preparando o "problema" bem grande pra estourar de vez. A solução eles já tem pronta, só falta o problema ser implementado e em seguida virá a reação, aí quando estiver no ponto que querem, dão a solução.
    Abraços

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