O novo aliado da decadência

E assim, devagarinho, em silêncio, encontrámos um novo aliado: Al Qaeda.

Os media não gostam de falar muito do assunto e tentam disfarçar a felicidade: apenas algumas leves, levíssimas referências acerca da natureza de alguns dos “rebeldes” da Líbia.

De repente, deixou de ser uma ameaça pela segurança, nada de sanguinários conduzidos pelo Alcorão.

Até poucos anos atrás, caía uma árvore? Tinha sido Al Qaeda.
Poucos anos? Melhor: poucos meses.

Depois das primeiras notícias do massacre da Noruega, os dedos já estavam todos apontados: tinham sido eles, sempre eles. Na verdade tinha sido “ele”, um produto local, provavelmente com a ajuda de outros “eles”. Mas nada de árabes raivosos.

Foi quando? Julho. Há um mês e meio. 45 dias.
Quantas coisas podem acontecer em 45 dias? Muitas, sem dúvida.

Al Qaeda, por exemplo, investiu este período na revisão das próprias posições. Reflectiu, percebeu, arrependeu-se. E apresentou-se ao mundo ocidental com nova roupa: já não feroz inimigo mas paladino da democracia.


Agora podemos rever o nosso recente passado e provar até um pouco de ternura.
Que fofinhas as Torres Gémeas enquanto ruíam matando quase 3.000 pessoas. Quem tinha sido? Al Qaeda, óbvio.
E que espectáculo os comboios rebentados em Madrid. Quem? Al Qaeda, natural.
Como não falar da simpática manhã no metropolitano de Londres? Sempre ela, Al Qaeda.
E a lista poderia continuar, pois não havia atentado ou explosão sem que isso comportasse o envolvimento de Al Qaeda.

Até parecia que mais ninguém fosse capaz de organizar um atentado, por miserável que fosse. Sei lá, uma cabine telefónica em chamas, o rapto dum gato, nada. Neste aspecto, Al Qaeda tinha estabelecido um monopólio.

“Atentados? É connosco, satisfeitos ou reembolsados”

E a satisfação foi sempre máxima. Nunca houve reclamações. Também por causa do outro motivo: para onde enviar o pedido de reembolso?

Pois a mais terrível máquina de terror alguma vez criada apresentava também esta particularidade: ninguém tinha a mais pequena ideia de onde realmente fosse a sede. Ou uma base. Uma filial, um pequeno escritório, nada.

Ao falar da ETA podemos dizer: estão no País Basco.
IRA? Irlanda.
Al Qaeda? Um pouco aqui, um pouco aí, depende.

Será por isso que sempre faltaram as imagens. Não que o pessoal pedisse uma foto com todo o estado maior da organização. Mas, de vez em quando, alguma coisa, tipo um campo de treino, por exemplo.

E aqui não é possível não falar do azar. Quantos campos de treino de Al Qaeda descobriram os Americanos? Dezenas, talvez centenas. Mas cada vez acontecia alguma coisa.

“Ehi, Jack, tira, tira uma foto, vai!”
“Epá, mas que é isso? A câmara da Barbie? Lamento John, deve ter sido a minha filha. Queres ver uma foto dela?”

Quando não eram as filhas a trocar as máquinas, o problema eram as películas: experimente o Leitor encontrar um revendedor da Kodak no meio do deserto.

Talvez para compensar, as forças dos Estados Unidos nunca pouparam com os “Números Dois”. Nos últimos 10 anos foram provavelmente abatidas algumas dezenas de Número Dois. Nunca Números Três ou Quatro, só Número Dois.

Isso leva a crer que a hierarquia do grupo fosse esta: no topo Ele, o Senhor do Mal, o simpático e defunto Osama Bin Laden; abaixo, algumas dezenas de milhares de Número Dois.
Um esquema simples mais eficaz. E porquê complicar?

Bin Laden, alguém lembra?
Nefropático crónico, com diabetes, impotente, o Senhor do Mal era na verdade uma espécie de cadáver ambulante. Isso até pouco antes da chegada das Tropas Especiais no esconderijo. Pois os militares não encontraram medicamentos no bunker e estabeleceram que o bom Osama já não sofria de mal nenhum.

Esquisito? Não, deve ter sido o ar do Paquistão, que dizem fazer maravilhas.
Um fígado em pedaços? Um pulmão podre? Uma unha encravada? Experimentem uma semana perto de Islamabad e podem voltar como novos. Ou, na pior das hipóteses, ser sepultados no mar segundo a melhor tradição islâmica.

Mas também o bom Bin já foi-se.
Pena, provavelmente teria gostado do novo rumo da organização. Já não “contra” os Estados Unidos mas “ao lado” dos Estado Unidos. E, sobretudo, em defesa da democracia. Que não acaso é um dos valores fundamentais do Islão.

Agora é tempo de perdoar.
Al Qaeda foi malandra? Sim de facto um bocado foi. Mas todos erramos e quem somos nós para julgar? Não reza o ditado “quem nunca errou que atire a primeira bomba”?

E que assim seja.
Al Qaeda faz agora parte do Clube dos Justos. O clube dos bons, dos sábios e dos progressistas.
O nosso clube.

Al Qaeda demonstrou no campo o próprio valor: sem medo, desceu na arena e escolheu lutar ao lado dos oprimidos, contra o novo senhor do Mal, Khadafi. Mau, louco e tarado sexual, tinha tudo para ter sucesso no FMI, mas escolheu ser ditador.

Agora a Líbia está livre. Sobra apenas um pequeno reduto, a Sirte, onde Khadafi teima em esconder-se.

Mas as Forças do Bem, também revigoradas pela conversão dos ex-extremistas islâmicos, tem uma táctica que não pode falir: bombardear tudo o que se mexe.

E cedo ou tarde, podem crer, uma bomba acertará a cabeça do ex-leader líbio. É só esperar.

E os inocentes? Não são um verdadeiro problema. Como disse Arnaud Amaury? “Matem todos, Deus reconhecerá os seus”.
É isso, Deus ou Allah, o trabalho é o mesmo: “Tu sim podes entrar, tu também, tu és mau, para o Inferno, tu foste assim assim então podes escolher: Purgatório ou Portugal?”.

Entretanto, queridos Leitores, festejemos.
A Líbia é o último laboratório desta reencontrada proximidade entre capitalistas e xeques, emirados infames e emiros depravados, esquadrões liberais e alqaedistas re-equilibrados.

Se no começo era o verbo militar, agora é a confusão alimentada pelas notícias fantasiosas dos media de regime, as bombas multiculturais, a promiscuidade político-religiosa.

A palavra de ordem é desordem. O caos.
Mais do que a renascida Al Qaeda, este é o melhor aliado dum Império em decadência.

Ipse dixit.

6 Replies to “O novo aliado da decadência”

  1. Mas os Américas nunca deixaram de ser amigos da Al-Qaeda… aliás são tão amigos tão amigos que a A-Q até aceitou ser a má da fita para ajudar o amigo a disfarçar e desviar as atenções sobre os ataques em 2011… Querem melhor amigo que isto!?!
    Agora estão a ser recompensados… toma lá, dá cá. simples e antigo!

  2. Al-Qaeda é filha dos EUA. Deixada sob os cuidados da CIA, enquanto criança, sempre contou com o apoio do pai, na adolescência se rebelou contra o mundo e agora, na maturidade, segue os passos do pai.

    Abraços!

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