A morte do Euro, o coma do Dólar – Parte II

Segunda parte do artigo acerca do futuro do Euro e do Dólar.
A primeira parte pode ser encontrada neste link.

 E porque não sair?

Antes de analisar as consequências do mau estado do Euro sobre o destino do Dólar, uma pergunta: Mas não é possível evitar o caminho até aqui descrito, talvez com a saída dum País da Zona Euro?

Tecnicamente é possível, mas é preciso respeitar determinadas condições.

Vamos distinguir entre saída da União Europeia e do Euro.

O Tratado de Lisboa, que entrou em vigor em 01 de Dezembro de 2009, afirma, pela primeira vez e expressamente, o direito de qualquer Estado a sair da União Europeia (artigo 50), opção antes inexistente nos anteriores tratados europeus.

O processo de separação exige que o Estado que quer abandonar a União Europeia comunique a escolha ao Conselho da UE.
Neste altura é aberta uma negociação entre a União e o Estado, culminando num acordo que estabelece os termos para a rescisão, com uma resolução que tem de ser aprovada pela maioria do Conselho e aprovado pelo Euro-Parlamento. É possível voltar atrás na escolha, mas neste caso, o Estado será de novo submetido aos normais procedimentos  para a adesão. O que faz sentido.

O Tratado de Lisboa não prevê a possibilidade dum Estado abandonar o Euro.
A única possibilidade para sair é utilizar a clausula de abandono da União Europeia, a prevista pelo Tratado de Lisboa.

Nem há sequer o direito de expulsar um membro do Euro. De facto, o Conselho da UE só pode fazer recomendações ao Estado-Membro para verificar a existência dum deficit excessivo. Além disso, mesmo se o País continuar a violar as recomendações, o Conselho só pode convoca-lo para pedir de implementar medidas de contenção e impor sanções.

Por isso, como afirmado, a resposta é “Sim, é possível sair do Euro”, mas isso significa automaticamente abandonar a União também.

Além das dificuldades burocráticas e das ligadas à introdução duma moeda nacional “nova” (mesmo que seja a velha pre-Euro), pela qual será preciso negociar uma taxa de câmbio, isso implica abandonar, por exemplo, o Tratado de Schengen, que regula a livre circulação de pessoas e mercadorias entre Países da União.

Os antigos tratados entre Países, de facto, foram ultrapassados pela União, por isso o País “exule” deveria, provavelmente, renegociar o próprio status mesmo em relação aos outros Membros. Reintrodução das alfandegas, acordos bilaterais, isso para não falar dos problemas estritamente económicos que mereceriam um longo capitulo à parte.

De facto, o Euro foi implementado e encarado por todos como uma via só com um sentido. Por isso, sair é possível, mas os custos, não apenas económicos, são muito elevados.

O que acontecerá com o Dólar?

Até aqui o Euro. Mas do outro lado do Atlântico?

A Zona Euro é pequena, mas não muito pequena.

Naturalmente, a Zona Euro é menor do que a área do Dólar, mas não de muito:o PIB do Velho Continente (só Zona Euro) em 2009 foi de 11 trilhões de Dólares, cerca de 78% do PIB dos Estados Unidos.

Por isso, é evidente que qualquer grande mudança sobre o Euro teria um enorme impacto no resto da economia mundial, incluindo os Estados Unidos e o Dólar.

Então, se ocorrer (no caso pior) um colapso completo do Euro, ou (na melhor das hipóteses) a expulsão das economias fracas da Eurozona, os grandes vencedores serão os metais preciosos, os produtos (industriais, agrícolas, petróleo), o Franco Suíço Libra Britânica, os Títulos do governo britânico, o Dólar e os Títulos do Tesouro dos EUA. Nessa ordem.

Os Europeus têm uma história atrás: sabem que em tempos difíceis, os metais preciosos são o porto mais seguro. Além disso, muitos deles (e com razão) não confiam nos bobos que gerem a Federal Reserve e acreditam que repetidos quantitative easing são loucuras.

Por isso, iriam fugir do Euro para os metais preciosos. E também os produtos irão aumentariam pelo mesmo motivo.

O Dólar iria subir também com a queda do Euro; mas não pelo facto de ser tão tão atraente, pois não é. Tal como afirmado, os Europeus não confiam nos loucos da FED, mas ao abandonar o Euro, uma parte deles acabará, inevitavelmente, no Dólar, mesmo que apenas como forma de protecção contra os movimentos bruscos do Franco e da Libra.

O mesmo aplica-se aos Títulos do Tesouro dos EUA. Os rendimentos absurdos ficariam ainda mais absurdos, mas os Títulos dos Estados Unidos seriam uma classe de activos de última instância para o capital europeu.

Portanto, independentemente da forma como o Euro irá acabar, com um colapso da moeda ou um êxodo dos membros fracos e insolventes, o Dólar sairá fortalecido de alguma forma, embora não numa medida comparável com a Libra inglesa ou o Franco suíço. 

Os Estados Unidos vêm com bons olhos o fim do Euro?
Não é assim simples.

O Dólar iria enfraquecer contra os metais preciosos e os produtos de todas as classes, uma vez acabado o Euro.

Um colapso total ou parcial da moeda única europeia iria acelerar a chegada da hiperinflação do Dólar.

A razão é que mesmo com o Dólar fortalecido perante as maioria das outras moedas, cairia contra os metais preciosos e os produtos, inclusive o petróleo. O aumento dos preços de todos os produtos iria colocar pressão sobre a moeda americana, empurrando a economia dos EUA ainda mais no sentido que já está a acontecendo.

Assim, um colapso do Euro não é uma boa notícia para o Dólar, pelo contrário: irá acelerar a queda da moeda americana.

Por isso: Euro desaparecido, Dólar em queda livre após um efémero fortalecimento, salvação do Franco Suíço e da Lira Esterlina. Isso é, das duas principais moedas europeias que não são parte do Euro.

É este um cenário verosímil? Sim, é possível. Não certo, mas possível.

E a tudo isso podemos acrescentar um bloco eurasiático que fica à janela, observa, e torna-se o novo centro geopolítico e económico do planeta.

A bem ver, não é uma grande surpresa

Ipse dixit.

Fonte: Gonzalo Lira

2 Replies to “A morte do Euro, o coma do Dólar – Parte II”

  1. Olá Max!
    O que eu consigo observar, com meus olhos de cidadão comum, sem grandes entendimentos de economia, é que se um País sair da zona do euro, poderia ser até pior do que ficar, devido as restrições econômicas que este poderá sofrer. Pois acredito, que a UE não veria com bons olhos, neste momento, a saída de um país-membro. E retomar todo o sistema antigo, também seria uma grande "mão-de-obra".
    Para variar, mais um grande artigo postado!
    Abraços,
    Bruno

  2. Olá Bruno,
    e obrigado, em primeiro lugar.

    Saída da Zona Euro. Um assunto muuuuuito complicado, sem dúvida.

    Sinceramente: não sei quantas pessoas têm a capacidade para descrever um cenário assim sem dizer disparates.

    Eu não tenho, e ao longo destas semanas tentei encontrar um bom artigo, mas bom mesmo, que pudesse dar algumas indicações de confiança acerca duma eventualidade como esta. Mas não encontrei.

    Há sim artigos que defendem a permanência no Euro, mas escritos na maioria por pessoas que defendem também o operado de Bruxelas. Que, quanto a mim, não tem defesa.

    Há depois artigos que defendem a ideia contrária: tudo na UE é mau, até o mesmo conceito de União.
    Não concordo, aliás, acho que o futuro terá que passar por um amplo entendimento entre os Países do Velho Continente. Mas não o actual entendimento.

    Resumo: ainda não encontrei nada de qualidade, um artigo, uma opinião não suspeita, alguns dados, e por isso nada postei acerca do assunto.

    Mas faz falta. Porque esta Europa não funciona e não seria mal começar a pensar numa possível alternativa.

    Prometo continuar a procura.

    Abraço!

Obrigado por participar na discussão!

This site uses User Verification plugin to reduce spam. See how your comment data is processed.

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

%d bloggers like this: