O fio da navalha – Parte I

Nafeez Mosaddeq Ahmed tem um nome muçulmano; provavelmente isso é devido ao facto dele ser muçulmano.
Mas não é isso que interessa.

O que interessa é que Ahmed ensina Relações Internacionais na University of Sussex, Brighton (Reino Unido).
E ainda mais interessante é o facto dele ter publicado um artigo em Ceasefire Magazine, sitio inglês que, obviamente, é interessante também.

Para os mais interessados, posso acrescentar que Informação Incorrecta já publicou algo acerca de Ahmed, acerca do seu último livro.

O quê? O artigo é comprido?
Verdade: vamos dividi-lo em duas partes.
Boa ideia. Aliás, interessante.

A próxima crise vai matar todos

Nafeez Mosaddeq Ahmed

2008 foi o ano da convergência das crises. Os aumentos nos preços do petróleo como nos principais alimentos, ambos produzidos pela combinação de problemas na produção e na oferta, pela demanda que subiu e pelo consequente aumento do comércio no mercado dos futures. Então os bancos entraram em colapso e foram salvos pelos governos, com intervenções para apoiar um sistema financeiro que estava a ruir.

Esta convergência de crise alimentar, energética e de custo não foi um acidente, mas o resultado inevitável dum modelo de negócio adoptado por um sistema político-económico mundial que agora atingiu os próprios limites internos, além de ter ultrapassados os do meio ambiente.

Apesar das garantias oficiais do que o pior já passou e que as economias estão em recuperação e voltaram a crescer, a tendência actual indica que o pior ainda está por vir, e que os políticos não têm ideia de quais possam ser as causas estruturais da convergência dessas crises.

O problema fundamental é que os economistas ortodoxos neoliberais não conseguem entender uma verdade óbvia, isso é, o entrelaçamento da economia com o ambiente natural. O crescimento económico exige uma oferta crescente de energia, obtida a partir da exploração dos recursos naturais, neste momento principalmente a partir de combustíveis fósseis, como petróleo, gás e carvão.

Em teoria, os economistas ortodoxos argumentam que o capitalismo pode resolver o problema da dependência ao maximizar a eficiência, maior será o desenvolvimento económico, maior será o aumento da utilização optimizada dos recursos e, portanto, menor a quantidade de energia necessária. Esse tipo de raciocínio implica o apoio do governo perante uma sociedade high growt – low carbon (alto crescimento – baixo uso de carvão). Como acontece muitas vezes com a teoria económica neoliberal, os dados empíricos geram algumas perguntas sérias sobre este tema. Como mostrado inequivocamente por Tim Jackson em Prosperity Without Growt (Prosperidade Sem Crescimento, pp. 74-76), a tendência global das emissões de carvão e dos combustíveis fósseis, bem como a extracção de metais e minerais não-metálicos, aumentou dramaticamente nas últimas duas décadas . Em muitos casos, como Jackson afirma:

A intensidade energética mundial (o rácio entre a utilização dos recursos e o PIB) tem crescido significativamente para minerais não-combustíveis. A eficiência dos recursos tem tomado uma direcção errada. (p. 75)

Entre 2005 e 2008, a produção convencional de petróleo tem lutado com uma estabilidade ondulante sem precedentes na história da produção mundial de petróleo, e é provável que aumente significativamente acima dos níveis alcançados em 2008. Como observado pelo Dr. James Schlesinger , antigo Secretário de Energia dos Estados Unidos (1977-79) e director da CIA, dadas as projectadas curvas em flexão entre 4 e 6 por cento, e o previsto aumento da demanda durante o próximo quarto de século, teremos necessidade do equivalente de cinco vezes a capacidade da Arábia Saudita.
Schlesinger observa:

Além das incertezas acerca das profundezas dos oceanos e das reservas não convencionais, em geral teremos de avançar sem a nossa fonte de energia fundamental na expansão da economia mundial por mais de meio século.

Enquanto os níveis de oferta parecem flutuar, o aumento da demanda devido a uma frágil recuperação indica a possibilidade de um pico a curto prazo nos preços do petróleo, uma vez que a crescente demanda encontra uma capacidade de produção baixa. Grande parte do aumento da demanda por petróleo não vem do Ocidente, mas das economias emergentes como a China, e levou algumas instituições financeiras como JP Morgan a prever um aumento iminente do preço do petróleo até US $ 100 o barril.

Ao mesmo tempo, com o novo aumento dos preços do petróleo, estamos a ver subir os preços da carne, açúcar, arroz, trigo e milho. Como perito financeiro, Addison Wiggin alerta em Forbes, no final de Outubro passado, que

podemos estar a um passo da explosão de uma crise alimentar, parece que o preço máximo alcançado em 2008 será uma lembrança feliz. 

Wiggin afirma que a crise alimentar de 2008 nunca terminou, uma vez que os preços dos produtos agrícolas importantes, embora não atingindo níveis de 2008, no entanto têm atingido níveis mais elevados do que os anteriores a 2008:

Trigo: até 63%
Trigo: até 84%
Soja: até 24%
Açúcar: até 55%

No entanto, o Departamento da Agricultura dos EUA alertou que haverá uma queda na produção de trigo no próximo ano, principalmente devido à seca na Rússia, e destacou a queda significativa na produção deste ano, aparentemente a mais importante ocorrida até hoje.

A segunda parte do artigo neste link.

Fonte: Ceasefire Magazine
Tradução: Informação Incorrecta

2 Replies to “O fio da navalha – Parte I”

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