A cura milagrosa do Banco Central Europeu

O Banco Central Europeu pensa em nós. E isso é motivo de forte preocupação.

No seu último boletim, o BCE analisa as causas e os efeitos da recessão económica no emprego dos Países da Zona Euro. Até aqui tudo bem, um pouco de análise nunca matou ninguém.
O problema surge na altura em que o Banco Central propõe soluções.

Porque é verdade que os cortes nos serviços do Estado, o desemprego, o problema das reformas, uma economia que não funciona, tudo isso já pesa no nosso quotidiano. Não é fácil, mas podemos aturar. Mas se a tudo isso juntarmos as sugestões do BCE, a situação chega a ser dramática.

O que diz o BCE? Diz que a Eurozona perdeu 3,9 milhões de trabalhos devido à crise económica. É muito, sem dúvida, mas sempre menos dos 8 milhões de desempregados que circulam nos Estados Unidos.

Mesma crise mas menos desemprego? Porquê?

Porque, explica o Banco, as restrições legislativas que salvaguardam a ocupação conseguiram limitar os danos: por isso, menor perda de postos de trabalho.

E é mesmo aqui que o BCE extrai o coelho da cartola: como enfrentar a crise agora? Simples: removendo estas restrições legislativas.
Mas como? Acabaram de dizer que as leis do trabalho salvaram milhões de postos e agora querem alterar estas mesmas leis?

Calma, há alterações e alterações.
Explicam as mentes pensantes da economia europeia:

Um abrandamento das restrições na legislação para a protecção do emprego em muitos Países poderia contribuir em parte para aliviar o actual dualismo do mercado de trabalho e facilitar o reinício.

A lógica é inatacável.
Há muitos desempregados? Facilitamos os despedimentos. Desta forma quem está desempregado terá mais oportunidade de encontrar um novo trabalho. Quem pode contestar este ponto de vista?
E quem já tem um trabalho? Simples: fica desempregado. Mas terá mais oportunidades de encontrar uma nova ocupação pois o ex-desempregado que agora ocupa o seu lugar poderá ser despedido com mais facilidade.
Um raciocínio inoxidável.

Mas as empresas que ganham com tudo isso?
É o mesmo BCE que ajuda a perceber este plano genial:

Esforços para aumentar a flexibilidade dos salários, permitindo uma diferenciação suficiente para reflectir as condições locais do mercado de trabalho, a posição competitiva das empresas e dos níveis de produtividade, favoreceria a resolução dos desequilíbrios remanescentes e estimularia a procura de trabalho.

Vítor Constâncio

Flexibilidade dos salários…esta expressão tem algo de sinistro. Que tipo de “flexibilidade” será? Afinal pode ser uma flexibilidade “para cima” ou “para baixo”. Não podemos ser sempre pessimistas. Por isso deixamos que seja o leitor a adivinhar.

Resumindo: segundo este plano inovador, que podemos baptizar “Corta & Corta”, quem agora tem emprego poderia perde-lo para facilitar a reinserção dos desempregados. Os quais teriam novos salários “flexibilizados”.

E isso para solucionar o “dualismo” do mercado do trabalho, melhorar a “posição competitiva das empresas” e “resolver assim os desequilíbrios remanescentes”.

Doutro lado, quem é o vice-presidente do BCE? O português Vítor Constâncio.
E qual é o credo económico do Constâncio?
Como já tivemos ocasião de referir: estagnação dos salários ou aumentos abaixo da inflação, para permitir o crescimento económico (Wikipedia, versão inglesa mas não portuguesa…).

Admitimos: pelo menos nisso, a cura milagrosa proposta pelo Banco Central Europeus demonstra coerência.
E os trabalhadores gostam da coerência.

Ipse dixit.

Fonte: Asca, Wikipedia

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